A empatia

O que mudou no dia-a-dia dos professores? O que continua a ser absolutamente necessário e o que não vale a pena revisitar?

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Rui Gaudencio

Ao longo destes dois últimos anos, mudamos o jeito de trabalhar. De presencial para online, para modelos híbridos, isenção de horários, extinção de lugar de trabalho pessoal, entre outras possíveis variações. Aos poucos fomos percebendo que o trabalho também mudou. Não mudou apenas a forma como trabalhamos, mas o trabalho, o que são as tarefas que compõem o nosso dia-a-dia, também mudaram. O que mudou no dia-a-dia dos professores? O que continua a ser absolutamente necessário e o que não vale a pena revisitar?

Tanto se falou em desenvolver a resiliência durante estes tempos que, inevitavelmente, percebemos que o regresso ao normal, significa o regresso a um futuro que parece ser conhecido, o tal novo normal. O exemplo da resiliência como sendo o elástico que estica e volta à sua forma inicial, não é mais válido. Percebemos que depois de tanto esticar é impossível voltar ao que era.

Ninguém volta ao que era depois de ter experimentado mudanças que o fizeram girar 360 graus. Os líderes estão cansados, esgotados e a sua resiliência leva-os, por vezes a uma necessidade de afastamento, para se protegerem daquilo que agora é o regresso ao presencial, seja em que formato for.

Os líderes educativos não são excepção. A sua capacidade de holding, de segurar a pressão e a necessidade da velocidade da decisão, foi posta ao extremo e mais do que nunca, precisam de olhar para eles mesmos e cuidarem de si próprios. Empatia, precisa-se! Se durante os tempos de confinamento estes mesmos líderes souberam cuidar das suas comunidades, gerar planos de bem-estar, ser exigentes com o que era importante na altura, terão de volta o cuidado das suas comunidades para com eles.

A estima, o cuidado de uns para com os outros e o desenvolvimento autónomo das tarefas habituais, estarão asseguradas, pois o sentido de pertença e de cuidado mútuo em tempos de crise fortaleceu laços capazes de trazer ao de cima a empatia necessária nesta altura.

Mas nem todos conseguiram passar pela tempestade de forma coesa. É necessário desenvolver a empatia, mais do que nunca, com as famílias e com os colegas docentes e não docentes. Voltar a cruzar o olhar, e perceber o que há de novo; escutar ‘bom dia’ e perceber que o tom de voz é diferente do habitual; ver uma mãe acelerada ao deixar o filho de manhã e perguntar ‘posso ajudar em alguma coisa?’, são apenas alguns exemplos do que já estão alguns profissionais da educação a viver e que tem de voltar a integrar ou conquistar pela primeira vez no seu trabalho.

A empatia é o primeiro passo para o estabelecimento de laços. E não podemos esquecer que a relação pedagógica é, antes de mais, uma relação de empatia. Em qualquer actividade profissional se a empatia, o acolhimento, a compreensão, a promoção do bem-estar, for uma prioridade, não só trabalhamos todos melhor, sentimos o apoio dos outros, para além da exigência e do compromisso, como o sentido de acolhimento e de pertença é fortalecido. Trabalhamos todos melhor quando nos aceitamos e nos compreendemos. Só depois deste passo estamos em condições de exigir o que quer que seja, de clientes ou de colaboradores; das famílias e dos professores e auxiliares.

Qual é o caminho para iniciar este ano lectivo? Voltar a exercer livremente a empatia e a promoção de bem-estar, para depois conseguir proporcionar aprendizagem e potenciar a performance de docentes e alunos? Ou iniciar desde já planos de recuperação das aprendizagens?

Os confinamentos mostraram que quase tudo se consegue fazer através do computador, mas que ficou a faltar os olhos nos olhos, a palavra sozinha, o frente a frente, o desabafo em privado, aquilo que se sente e que não se consegue traduzir em palavras, mas apenas pela presença. E tudo isto se consegue fazer online, mas falta o toque, a presença, o olhar certo. A educação tem destas coisas para fazer crescer, aprender e evoluir. O estabelecimento de relações presenciais promove o desenvolvimento e o compromisso, que são essenciais na educação para que a aprendizagem aconteça, com o estabelecimento de figuras relevantes e marcantes, sobretudo para os alunos.

Neste momento, em que o início do ano lectivo está no centro das tarefas, o activar dos mecanismos da empatia e revisitar laços antigos serão certamente âncoras de um porto seguro, tão necessário para o desenrolar de boas e frutíferas relações pedagógicas e aprendizagens significativas.

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