Recontagem anula maioria feminina no Parlamento da Islândia

Em poucas horas, a maioria de 33 lugares ocupados por mulheres no Althing, em 63 possíveis, desceu para uma minoria de 30. Ainda assim, o parlamento islandês é, de longe, o parlamento nacional na Europa com a maior percentagem de mulheres eleitas.

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Katrín Jakobsdóttir, do Movimento Esquerda-Verdes, deve manter-se no cargo de primeira-ministra Reuters/NTB SCANPIX

A notícia de que a Islândia tinha sido o primeiro o país europeu a eleger mais mulheres do que homens para um parlamento nacional, na sequência das eleições legislativas de sábado, foi desmentida na noite de domingo após uma recontagem dos votos na região Oeste do país.

Na contagem inicial, 33 mulheres tinham sido eleitas para o Althing — o parlamento islandês, com 63 lugares. Mas, após a recontagem, o número de mulheres eleitas ficou em 30.

Uma das três mulheres que acabaram por não ser eleitas foi a estudante de Direito Lenya Rún Karim, de 21 anos, filha de imigrantes curdos e candidata pelo Partido Pirata.

Ao fim da manhã de domingo, Karim mostrou-se surpreendida com a notícia da sua eleição, que deduziu a partir da quantidade de mensagens que tinha no telefone.

“Não acordei há muito tempo, não vou mentir sobre isso. Tirei o telefone do modo de avião e estava tudo a explodir”, disse aos jornalistas. “Cheio, cheio, cheio de mensagens, e eu consegui reparar numa que dizia ‘Parabéns’. E então presumi que tinha sido eleita.”

Horas mais tarde, a felicidade dava lugar à resignação: “Foram umas boas nove horas”, disse Karim aos jornalistas.

Ainda assim, o parlamento islandês terá 30 lugares ocupados por mulheres – uma repetição do que aconteceu nas eleições de 2016 e que mantém a Islândia no topo dos países europeus com mais mulheres num parlamento nacional.

“A vitória das mulheres continua a ser a notícia mais importante destas eleições”, disse Olafur Hardarson, um professor de Ciência Polícia na Universidade da Islândia, em declarações ao canal RÚV.

"Avanços lentos"

Segundo a União Interparlamentar, apenas dois países têm mais mulheres do que homens nos seus parlamentos nacionais: Ruanda (61,3%) e Cuba (53,4%). Os Emirados Árabes Unidos têm o mesmo número de homens e mulheres no seu parlamento.

Portugal surge num segundo grupo de 23 países onde as mulheres ocupam pelo menos 40% dos lugares no parlamento. Neste grupo, apenas quatro fazem parte da União Europeia: Portugal (40%), Bélgica (42%), Espanha (44%) e Suécia (47%).

Num relatório publicado em Janeiro, a União Interparlamentar indica que houve “avanços lentos” no reforço da participação das mulheres nos parlamentos nacionais, de 24,9% em 2019 para 25,5% em 2020.

E o avanço foi também lento nos lugares de topo, com um aumento de 20 para 22 no número de países onde a chefe de Estado ou de Governo é uma mulher — 5,9% (nove em 152) são chefes de Estado e 6,7% (13 em 193) são chefes de Governo.

Neste capítulo é a Europa que lidera, com cinco das nove chefes de Estado em todo o mundo e sete das 13 chefes de Governo. A maioria dos países nórdicos — Dinamarca, Finlândia, Islândia e Noruega — têm actualmente mulheres no cargo de primeira-ministra.

“Nenhum país prospera sem o envolvimento das mulheres. Precisamos de uma representação feminina que reflicta as mulheres e as raparigas em toda a sua diversidade e capacidade, e em todas as situações culturais, sociais, políticas e económicas”, disse Phumzile Mlambo-Ngcuka, a directora executiva da ONU Mulheres.

“O mapa deste ano mostra-nos que continuamos a precisar de medidas corajosas em todo o mundo, para trazermos as mulheres, em grande número, para o centro dos espaços de decisão. Não há dúvidas de que isso pode ser feito. E tem de ser feito agora.”

O secretário-geral da União Interparlamentar, Martin Chugong, recordou que 70% da força de trabalho durante o ano de pandemia, nos serviços e no sector da saúde, tem sido prestada por mulheres.

“Cabe-nos a todos, tanto aos homens como às mulheres, continuarmos a fazer pressão para que haja uma maior representação de mulheres na política. Temos as ferramentas para que isso aconteça. O que precisamos é de vontade política.”

Coligação renovada

No final da contagem na Islândia, o partido da primeira-ministra Katrín Jakobsdóttir — o Movimento Esquerda-Verde — perdeu três lugares, de 11 em 2017 para oito nas eleições de sábado. Mas o cenário mais provável é que Jakobsdóttir continue a liderar o Governo graças a uma renovação da coligação com o Partido da Independência (que manteve os seus 16 lugares) e o Partido Progressista (que ganhou cinco, de oito para 13).

Os partidos do centro foram os mais beneficiados com as eleições de sábado, em particular os independentes e os progressistas (ambos do centro-direita). Os apelos à aprovação de metas mais ambiciosas no combate às alterações climáticas, após um Verão marcado por temperaturas historicamente elevadas na Islândia, não se traduziram num maior apoio eleitoral aos partidos da esquerda.

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