Quase 100% dos vídeos no TikTok sobre álcool elogiam o consumo

Trabalho publicado na revista Journal of Studies on Alcohol and Drugs analisou vídeos publicados com a “hastag” álcool que tiveram quase 300 milhões de visualizações em 2020.

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“Perguntaria aos pais se querem que o TikTok seja o local onde os seus filhos obtêm informações de saúde sobre tópicos como o consumo de álcool” Nelson Garrido

A esmagadora maioria (98%) dos vídeos publicados na plataforma TikTok com a “hastag” álcool apresentam um retrato positivo deste consumo e ignorando as suas consequências negativas, conclui um estudo publicado esta quarta-feira na revista Journal of Studies on Alcohol and Drugs. Os investigadores analisaram os 100 vídeos mais populares de 2020 que somaram quase 300 milhões de visualizações na página sobre o tema do álcool que até ao ano passado contava, no total, com 1,7 mil milhões de visualizações. 

“As plataformas de comunicação social, tais como a TikTok, podem influenciar o comportamento na saúde”, constata Alex Russell, Ph.D., professor assistente de saúde pública na Universidade do Arkansas e um dos principais autores do trabalho, citado num comunicado de imprensa. O especialista lembra que já foi demonstrado que a exposição dos jovens ao marketing do álcool nos meios de comunicação social está ligada a uma iniciação mais precoce ao consumo e a níveis mais elevados de consumo global de álcool. “Mais de um terço dos utilizadores de TikTok são menores de idade, pelo que considerámos importante caracterizar o conteúdo e temas presentes nos vídeos que apresentam o álcool nesta plataforma popular”, justifica.

A equipa de investigadores analisou os 100 vídeos mais populares na página #alcohol do TikTok, que até 2020 tinha já um total de 1,7 mil milhões de visualizações. Os dados mostram que 41% dos vídeos tinham conteúdos com sugestões, dando receitas para várias bebidas. A maioria (72%) incluía bebidas espirituosas, 23% incluía bebidas aromatizadas de malte, 16% incluía cerveja e 10% incluía vinho.

Além dos ingredientes, o estudo também olhou para o tipo de conteúdos e “aconselhamento” de vários tipos de consumo e conclui que “61% dos vídeos eram sobre o consumo rápido de várias bebidas, tais como beber bebidas espirituosas, e depois beber da garrafa”. “Também promovem a ideia de que o consumo de álcool está associado à amizade, familiaridade e camaradagem. Os poucos que mencionaram associações negativas — tais como ressacas ou lesões físicas — fizeram-no de uma forma humorística, não educativa”, adianta a nota de imprensa.

Os autores do estudo reconhecem que as regras da comunidade TikTok proíbem conteúdos que representem o consumo de álcool, drogas ou tabaco por menores. Porém, concluem, “não é claro quão eficazmente esta política é aplicada”. Ou, dito de outra forma, parece ser bastante claro que essa política não é, de facto, aplicada.

Além disso, argumentam os investigadores, “estes vídeos eram facilmente acessíveis através de uma simples pesquisa na Internet e podiam ser vistos sem que se encontrasse qualquer tipo de processo de verificação da idade”. “Qualquer pessoa não registada pode interagir plenamente com vídeos sobre álcool no TikTok, independentemente da idade”.

Três avisos

Em jeito de conclusão, Alex Russell apresenta três leituras principais destes dados. A primeira é dirigida aos pais. “Perguntaria aos pais se querem que o TikTok seja o local onde os seus filhos obtêm informações de saúde sobre tópicos como o consumo de álcool”, diz o investigador, encorajando os pais a fazer uma “pesquisa simples na Internet de “#alcohol TikTok” e ver se se sentem confortáveis com o conteúdo e as mensagens a que os seus filhos estão expostos”.

A segunda leitura dos dados é um aviso dirigido às autoridades. Os profissionais de saúde pública e investigadores têm de estar conscientes que o TikTok e outras plataformas de comunicação social estão aqui para ficar. Assim, na lógica de “não podes vencê-los, junta-te a eles, mas por bons motivos”, o cientista aconselha os profissionais de saúde pública a utilizar estas mesmas plataformas para “divulgar a ciência sobre as realidades sanitárias do consumo de álcool e para encorajar a avaliação crítica das mensagens relacionadas com o álcool nas redes sociais”.

Por fim, resta deixar uma palavra aos decisores políticos. Alex Russell constata que a “facilidade de acesso a conteúdos relacionados com o álcool no TikTok destaca a necessidade de algum mecanismo (como a verificação da idade) para minimizar a exposição dos jovens a conteúdos relacionados com o álcool em plataformas de redes sociais”. É preciso que alguém se importe com este tipo de regulamentação e que defina algumas regras que podem controlar este meio de comunicação tão popular entre os mais novos e influenciáveis.

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