Carlos Vaz Marques, aprenda a amar o capitalismo!

Para bem navegar o capitalismo, devemos proceder desta forma: querer ser capitalista; andar junto do capital; dizer bem dos capitalistas e do capitalismo. Não se garante o sucesso pessoal, mas fica-se muito mais perto.

O refrão “aprende a nadar, companheiro; que a maré se vai levantar; que a liberdade está a passar por aqui” de Sérgio Godinho, está desactualizado. Aquilo que hoje temos que fazer é o que João Miguel Tavares confessa no seu artigo Será possível odiar o racismo e amar o capitalismo?: amar o capitalismo.

Aliás, João Miguel Tavares já o disse por mais do que uma vez: o capitalismo é o melhor sistema do mundo, o único que proporciona bem-estar, liberdade e prosperidade.

De facto, se atentarmos ao exemplo deste jornalista, ficamos muito optimistas face às qualidades do capitalismo. Afinal, um miúdo de Portalegre, não nascido nas elites económicas, políticas ou culturais de Lisboa, conseguiu ascender a um lugar de destaque no país: é cronista fixo do PÚBLICO, opinador da TV e da rádio, tem a sua própria editora, já fez o discurso do dia 10 de Junho a convite do Presidente da República, escreve livros de crónicas e infantis (um até apresentado por um ministro das Finanças), é elogiado por António José Saraiva e José Miguel Júdice como o mais arguto e acutilante comentador português, tem quatro filhos, algo só possível para as classes altas portuguesas (ou para as muito pobres por falta de planeamento familiar) e vive em Lisboa (o sítio onde se tem que viver para se ter destaque em Portugal).

Como não amar o capitalismo?

E é aqui que entra o seu companheiro de programa, Carlos Vaz Marques. Este, saiu da rádio TSF após mais de 30 anos de emprego nesse órgão de comunicação social.

No Facebook, Carlos Vaz Marques publicou um post em que, por um lado, agradece todo o percurso feito e as oportunidades que teve. Por outro, denuncia aquilo que considera ser um assédio laboral perpetrado pelo Global Media Group, que passou pela exigência da redução do seu salário para metade, pelo fim de programas seus de longa data ou pela desqualificação laboral, pondo-o a fazer pouco ou nada durante o horário de trabalho (uma das mais violentas formas de assédio laboral).

Carlos Vaz Marques irá para os tribunais resolver essa questão.

Entretanto, o programa que junta João Miguel Tavares e Carlos Vaz Marques, o Governo Sombra, que foi criado na TSF, deixará essa rádio, mas continuará na TV: só que terá que ter outro nome, porque, à revelia dos autores do programa, o nome foi registado pelo Global Media Group que, agora, os impede de continuar com essa chancela.

Então, Carlos, como não amar o capitalismo?

O que João Miguel Tavares faz é seguir à risca aquilo que eu considero serem as regras fundamentais do enriquecimento: 1.  Querer ser rico; 2. Andar junto do dinheiro; 3. Dizer bem de quem tem dinheiro e fazer a apologia da riqueza (todas as excepções do tipo José Saramago, que dizia mal do sistema, mas que teve sucesso financeiro graça ao prémio Nobel, não desmentem a regra).

Para bem navegar o capitalismo, devemos proceder dessa forma: querer ser capitalista; andar junto do capital; dizer bem dos capitalistas e do capitalismo. Não se garante o sucesso pessoal, mas fica-se muito mais perto. A outra alternativa é ter-se um talento enorme, bem apreciado (como é o caso do Ricardo Araújo Pereira no que ao fazer rir diz respeito), situação na qual se está mais liberto dessas regras.

Incumprir estas regras põe as pessoas a jeito de serem discriminadas, despedidas ou, muito importante, não serem convidadas.

Aquilo que Carlos Vaz Marques tem que fazer é deixar os tribunais e lançar-se no empreendedorismo comunicacional. Há tanto mercado: a publicidade, fazer documentários e biografias dos capitalistas portugueses, um programa sobre o empreendedorismo na juventude e nas universidades, reportagens live via Instagram da Websummit, dedicar-se ao lifestyle e ao influencing ou ainda dizer bem da direita e mal da esquerda!

Tem é de deixar essa coisa dos livros e da cultura, que não interessa nem ao menino Jesus (já dizia o Pessoa que não constava que Cristo tivesse biblioteca) e entender que isso de estar 30 anos no mesmo sítio é um anacronismo nada saudável. Tem que ficar contente pela oportunidade que o Global Media Group lhe estar a dar para se reinventar e ser muito mais produtivo, e deixar-se de pieguices. Aliás, o sistema é tão bom que até o seu “programa cujo nome estamos legalmente impedidos de dizer” vai continuar.

PS: outra aprendizagem, registar sempre os nomezinhos, ok?

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