Tentativa de tornar aplicação StayAway Covid obrigatória foi um dos seus “fracassos”

Dos oito factores assinalados para o “fracasso” da aplicação, a Associação D3 destaca que a tentativa “do Governo de tornar a app obrigatória teve um efeito claríssimo no declínio da adopção da aplicação”.

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A aplicação móvel foi lançada no dia 1 de Setembro de 2020 MIGUEL MANSO

A Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais afirmou esta quarta-feira, em que se assinala um ano do lançamento da aplicação StayAway Covid, que a tentativa do Governo de a tornar obrigatória foi um dos factores que originaram o “fracasso”.

Em comunicado, a Associação D3 refere que, para assinalar o lançamento da aplicação, divulga esta quarta-feira uma “análise extensa de todo o ciclo de vida da app”, intitulada Relatório Público StayAway, abordando o que “correu mal” e pode ser feito “melhor” numa próxima vez.

A aplicação móvel, lançada a 28 de Agosto de 2020, permite rastrear de forma rápida e anónima, as redes de contágio por covid-19, informando os utilizadores que estiveram nos últimos 14 dias no mesmo espaço de alguém infectado com o novo coronavírus.

Citado no comunicado, o vice-presidente da Associação D3, Ricardo Lafuente, salienta que “quando alguns ainda insistem em abanar o cadáver e alegar que está de boa saúde, sentimos que é bem altura de realizar a autópsia”.

“Como ninguém o fez ainda, metemos mãos à obra. Este documento é resultado de mais de um ano de trabalho a reunir estudos, dados e notas de imprensa, analisá-los e tirar conclusões de toda esta experiência”, refere.

Dos oito factores assinalados para o “fracasso” da aplicação, a Associação D3 destaca que a tentativa “do Governo de tornar a app obrigatória teve um efeito claríssimo no declínio da adopção da aplicação”.

“No entanto, os proponentes da app insistiram em culpar os médicos, uma classe profissional profundamente agastada pela crise pandémica e, concluímos, sem qualquer responsabilidade no fracasso da aplicação”, defende.

Considerando que a aplicação “não funcionava e as pessoas perceberam-no”, a associação critica a falta de “admissão de falhas” e a substituição das operadoras Google e Apple ao Estado na “definição da arquitectura de uma medida de saúde pública”.

“Este é um precedente preocupante na medida em que constitui uma efectiva privatização de uma parte importante dos esforços de combate à pandemia”, alerta a associação, acrescentando ter existido uma “falha de segurança grave nos dispositivos Android que permitia acesso indevido a dados pessoais dos utilizadores”.

A Associação D3 afirma ainda que a Google tinha conhecimento dessa falha “meses antes da sua descoberta por parte de investigadores independentes” e que não houve indícios de “qualquer auditoria ou investigação por parte do Governo ou outra autoridade”.

Para a associação, a alteração legislativa que visava facilitar algumas funcionalidades da aplicação “veio tardíssimo”, considerando que se perdeu “a oportunidade de fazer a diferença em tempo útil”.

“Mesmo quando a app já estava moribunda, a passarem vários dias sem um único código introduzido na aplicação, os seus proponentes e o Governo insistiam na sua promoção junto dos meios de comunicação”, critica a associação, defendendo que os proponentes da aplicação “falharam na sua responsabilidade científica e democrática de divulgar as conclusões desta experiência”.

Ricardo Lafuente diz ainda ser “fundamental debater o que se passou”, defendendo que a “experiência StayAway foi um fracasso total da abordagem tecno-deslumbrada que exalta as “apps” e as soluções inovadoras, desprezando as pessoas, a legislação e qualquer contributo por parte de outra área que não a técnica, como as ciências sociais”.

Considerando “urgente elevar o debate sobre o digital” para evitar “ingenuidades que motivaram boa parte dos erros identificados em todos este processo”, a Associação D3 exige “mais do que silêncio irresponsável de quem prometeu tudo e não tem nada para mostrar”.

“Esta experiência falhou e a fantasia tecno-deslumbrada que a alimentou não pode ter mais lugar na definição de políticas de saúde pública”, conclui o relatório.

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