De volta à rotina de trabalho

Grande parte dos seres humanos vive rotinas de trabalho absurdas e doentias e não gostam do que fazem. Não é de admirar que deprimam ao regressar ao calvário.

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Nelson Garrido

De volta ao trabalho, muitos são confrontados com sintomas depressivos: falta de energia, desânimo, dificuldades de concentração, tristeza, irritabilidade e por aí vai. Porquê? Bom, sobretudo porque grande parte dos seres humanos vive rotinas de trabalho absurdas e doentias e não gostam do que fazem. Não é de admirar que deprimam ao regressar ao calvário. No entanto, mesmo aqueles que estão satisfeitos com o seu trabalho podem não estar imunes a este estado de humor. Porquê?

Nós, seres humanos, não fomos projectados para viver desta forma: num ritmo frenético, nutrição pobre com abundância de alimentos processados, sedentários, com luz artificial e socialmente desconectados. Há cerca de 20.000 anos, os nossos antepassados viviam daquilo que caçavam e colhiam, começavam os seus dias “fora de portas” logo que o sol se levantava e deitavam-se ao sol-pôr, caminhavam muito, cerca de 15 quilómetros por dia, e comiam pouco porque os alimentos eram escassos. Viviam em pequenos grupos altamente coesos que cooperavam entre si e não sob stress crónico, com horários de trabalho exageradamente longos, sem tempo sequer para respirar. Tinham vidas duras, certo. No entanto, os desafios eram muito diferentes e, de certa forma, mais adaptados ao nosso “ corpo/cérebro/mente”.

Ora, embora nas férias acabemos, muitas vezes, por cometer excessos com a comida e o sono não seja o mais exemplar, a verdade é que o resto acaba por compensar: passeamos, fazemos piqueniques, brincamos, descansamos, estamos em contacto com a natureza e com aqueles que amamos e o nosso tempo não é tão controlado pelos “devo” e “tenho de…”. Para além disso, muitas das actividades a que nos dedicamos são “simulações” daquilo que foi o nosso “estado selvagem”: caçar, pescar, escalar, acampar, cooperar… Saímos da rotina e esperam-nos novidades ao virar da esquina, algo de que o nosso cérebro necessita para nos deixar animados, entusiasmados e alegres. Quem faz isto fora da época das férias?

Então, como podemos minimizar o mal-estar no nosso regresso ao trabalho?

Primeiro, perceber que o humor deprimido, sobretudo se leve ou moderado, não é necessariamente mau. É uma mensagem, um convite para nos ouvirmos e aprendermos a decifrar. Nós temos esta cultura do pensamento positivo a todo o custo e pagamos caro por isso. O mesmo estado de humor significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Para umas, pode ter a ver com um trabalho pouco gratificante, mal pago, onde se perdeu o sentido daquilo que se faz; para outras, pode ter mais a ver com o negligenciar de coisas fundamentais para a nossa homeostasia enquanto seres humanos: tempo para descansar, estar perto da natureza, com luz solar, alimentos variados e ricos em vitaminas e sais minerais, mais tempo para socializar e novidade. Ou pode ser uma mistura dos dois na mesma pessoa.

Depois, ter clareza de valores é fundamental. Saber aquilo que nos motiva e inspira naquilo que fazemos; que tipo de trabalhador, colega, chefe (se for caso disso) queremos ser; as competências que queremos desenvolver, como podemos fazer a diferença e assim por diante. Estas questões ajudam-nos a dar sentido àquilo que fazemos e, desta forma, a motivar-nos para regressar. Não há nada que os seres humanos mais apreciem do que ter um propósito para os seus sacrifícios.

É necessário não nos esquecermos das nossas raízes ancestrais nem das necessidades que temos enquanto tal e procurar manter, o melhor que pudermos, o ano inteiro, atitudes e actividades que nos inspirem e dão a energia e motivação para continuar.

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