O surf pode ajudar a mudar o mundo? Há três mulheres que acreditam que sim

O Pro Surf São Tomé é o primeiro campeonato organizado apenas por mulheres e é também a primeira vez que participam atletas do sexo feminino.

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Parte das receitas do Pro Surf São Tomé destina-se a apoiar a organização Surfistas Orgulhosas na Mulher D’África ,Parte das receitas do Pro Surf São Tomé destina-se a apoiar a organização Surfistas Orgulhosas na Mulher D’África Soma Surf/Instagram

Um campeonato de surf pode não ser suficiente para mudar o mundo, mas pode ser um impulsionador de desenvolvimento para a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). Pelo menos, é nisso que acreditam Francisca Sequeira, Maria Magalhães e Veridiana Bressane, as três mulheres responsáveis pela organização do Pro Surf São Tomé, que arranca nesta quarta-feira, 1 de Setembro. É o primeiro campeonato nacional de São Tomé e Príncipe organizado apenas por mulheres e também a primeira vez que participam atletas do sexo feminino.

Até ao ano passado, a ilha de São Tomé não tinha mulheres surfistas. Hoje são nove atletas, graças a Francisca Sequeira que fundou a organização Surfistas Orgulhosas na Mulher D’África (SOMA). Por culpa da pandemia, a assistente de bordo viu-se sem trabalho e encontrou no surf uma forma de ajudar a comunidade da ilha. “Já tinha vindo muitas vezes a São Tomé e tinha a perspectiva que as raparigas estavam ainda muito na sombra, que esperava pouco delas”, recorda ao PÚBLICO. “Por experiência própria senti o poder que o surf teve na minha vida e achei que fazia todo o sentido passar esta experiência e esta terapia às raparigas em São Tomé”, acrescenta.

Pouco depois desafiou as duas amigas Maria Magalhães e Veridiana Bressane, também praticantes de surf, a fundarem a Start Zero Zero, responsável pela organização do Pro Surf São Tomé, um campeonato que decorre de 1 a 8 de Setembro e conta com a participação de 27 atletas. O evento divide-se por três praias de São Tomé — Portalegre, Santana e Sete Ondas — e inclui também a Omali Surf Week, uma viagem exclusiva de sete dias, em São Tomé, destinada a surfistas, amantes e simpatizantes deste desporto e da sua cultura, activistas, empreendedores, organizações, marcas que procuram um propósito, e a todos os que se identifiquem com os valores do evento.

Ou seja, durante esta semana, São Tomé recebe vários convidados ligados ao surf, à arte e à sustentabilidade para assistirem ao campeonato e conhecerem a ilha, explica Veridiana Bressane, brasileira a viver em Portugal. O objectivo é que o surf seja um motor de desenvolvimento em todos os sentidos. “O surf movimenta sete mil milhões de dólares por ano (cerca de 5,9 milhões de euros). É uma indústria que tem esse poder transformador”, completa Maria Magalhães.

A iniciativa conta com o apoio da Federação Portuguesa de Surf, do Comité Olímpico de São Tomé e Príncipe e do Turismo daquele país que reconhece, em declarações à Lusa, que o campeonato será uma “mais-valia”, principalmente, destaca a técnica Gisela Bouças, nesta altura de pandemia de covid-19, quando o “país teve uma baixa no fluxo de entrada de turistas”.

Unir a CPLP através do surf

Ao mesmo tempo, as três mulheres “querem criar novas oportunidades de desenvolvimento pessoal e profissional para a comunidade surfista local” e não só. Por exemplo, conseguiram levar Internet para uma vila da ilha, onde até agora não estava disponível. O campeonato de surf vai terminar, mas a Internet vai ficar disponível naquela escola. O evento também irá ser transmitido para todo o mundo, com o apoio de uma televisão independente de São Tomé, a ZuntaTV, que recebeu formação para conseguir fazê-lo. 

“A nossa preocupação é ser uma acção sustentável, fazer com que o desenvolvimento da indústria do surf nestes países seja algo que envolva a comunidade local”, sublinha Maria Magalhães. E por falar em sustentabilidade, essa vertente está presente no evento a todos os níveis e os participantes farão também várias limpezas às praias. “A questão ambiental é algo que está na génese do surfista porque o mar é a nossa segunda casa”, acrescenta a co-fundadora do projecto.

Até 8 de Setembro, São Tomé será a casa do Pro Surf, mas Francisca Sequeira, Maria Magalhães e Veridiana Bressane já têm planos para o próximo ano. “Estamos em contacto com Moçambique e Cabo Verde. Para o ano já gostaríamos de levar o conceito para esses dois países”, avança Maria Magalhães. O arquipélago será a base do projecto, que as três prometem repetir na ilha anualmente. “Queremos unir estes países da CPLP através do surf”, prometem.

Mas sem nunca esquecer o empoderamento feminino. Aliás, parte das receitas deste campeonato revertem a favor da SOMA, para promover a igualdade de género, combater a gravidez precoce e o abandono escolar. No fundo, resumem as fundadoras do projecto, “permitir a estas raparigas encontrar um novo caminho, mais oportunidades na vida”. A partir deste mês, Francisca Sequeira recebe 30 novas participantes no projecto, com idades entre os 7 e aos 19 anos.

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