110 Histórias, 110 Objectos: o barómetro de Torricelli

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.

No podcast 110 Histórias, 110 Objectos, um dos parceiros da Rede PÚBLICO, percorremos os 110 anos de história do Instituto Superior Técnico (IST) através dos seus objectos do passado, do presente e do futuro. No oitavo episódio do podcast, falamos de um objecto do qual se sabe que terá sido construído no século XVIII segundo a técnica de Torricelli, que hoje está no IST e... pouco mais.

É um barómetro com cerca de 250 anos que resistiu a revoluções, guerras, à degradação natural do tempo e se mantém, hoje, quase milagrosamente intacto. Foi resgatado de um monte de instrumentos antigos prontos a ir para o lixo, no IST, há alguns anos por Rui Dilão, professor de física-matemática e de sistemas dinâmicos no IST, e continua a medir a pressão com eficácia. “Foi um dia incrível quando começamos a ver que estava a funcionar. Analisámos com detalhe. Dizia no topo “Segundo Torricelli” e ficámos… é um milagre! Bastava ele ter estado deitado no chão, ou inclinado, para estar inoperacional, porque o mercúrio fugia”.

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O barómetro do IST “segundo Torricelli” está aparafusado a uma parede do gabinete do professor Rui Dilão, no pavilhão de física Débora Rodrigues

Como assim o mercúrio? A resposta está na descrição do instrumento: um objecto de madeira, com 1,20 metros de altura, que suporta um tubo cheio de mercúrio, com uma ponta fechada e outra aberta. O tubo está mergulhado numa trina de mercúrio. “O que vai acontecer é que o mercúrio que está no interior do tubo sobe ou desce conforme equilibra a pressão que se exerce sobre a superfície do mercúrio que está livre. Essa pressão é compensada pela pressão do ar”. É assim, de acordo com a invenção de Evangelista Torricelli (1608-1647), que usamos o barómetro para medir a pressão atmosférica.

“Com as medições do barómetro conseguimos prever se vai chover, se vai haver nuvens, se vai estar bom tempo. A maior parte das previsões atmosféricas podem ser feitas com um barómetro”, explica Rui Dilão. Por ser aberto em cima, o barómetro tem que estar sempre na posição vertical, de modo a que o mercúrio não se derrame.

“O mercúrio não evapora, praticamente. O mesmo mercúrio está ali desde o século XVIII. Este objecto chegou a Portugal provavelmente um bocadinho antes da Revolução Francesa, chegou cá impecável e nunca teve uma fuga. É um milagre ter um objecto destes neste estado de conservação”, acrescenta. Para além disso, o tubo suporta também uma camada de ar – “provavelmente tem restos do ar que se respirava no século XVIII”.

“Vivemos submersos num oceano de ar”. A frase de Torricelli, dita de cor por Rui Dilão, sintetiza o pensamento daquele que foi um dos grandes físicos europeus e que se tornou célebre pela invenção do barómetro. O instrumento com método de mercúrio apenas chegou depois de uma primeira tentativa um pouco mais aparatosa: “Era um barómetro de água, com 10 metros de altura – tinha que subir ao telhado da casa para ver a altura da água. Por ter um tubo com água ao lado de sua casa, foi imediatamente acusado de heresia. Talvez para fugir a isso, reduziu de dez metros para um metro e passou a ter um barómetro dentro de casa”, conta Rui Dilão.

Torricelli foi também discípulo de Galileu Galilei, em particular nos três meses que este viveu após ter saído da prisão da Inquisição. “Quando [Galileu] saiu da prisão estava cego e não conseguia fazer experiências nem escrever. Um jovem chamado Torricelli foi o seu secretário, técnico de laboratório e vivia em sua casa. Depois da sua morte, continuou a trabalhar, começou a produzir lentes, começou a trabalhar sobre a ciclóide, uma das coisas que o Galileu fez no fim de vida e foi muito importante para o desenvolvimento do relógio. É o que sabemos do Torricelli, além do barómetro. Na altura nem se sabia muito bem o que era a pressão, cuja ideia só aparece muitos anos mais tarde”, explica Rui Dilão.

E quanto ao futuro do barómetro do IST “segundo Torricelli”? “Está em pé há 250 anos, pelo menos, o que é uma coisa incrível. E eu mantenho-o em pé, aparafusado à parede [do seu gabinete, no pavilhão de física], para estar seguro. Tenho medo que alguém lhe dê um encontrão”, brinca. “Irá sair para um sítio que tenha as condições apropriadas, um museu do IST ou de ciência e tecnologia, por exemplo”.

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.

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