O espectáculo tem de continuar: a Broadway está de regresso com novos investidores e planos ambiciosos

As salas do mítico quarteirão nova-iorquino vão reabrir a 100% para a rentrée. Apesar das perdas acumuladas de milhões de dólares, há optimismo entre os produtores e dinheiro novo a entrar, favorecendo um repertório mais diversificado e as vozes negras em particular.

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O musical Wicked é um dos regressos mais aguardados da rentrée CARLO ALLEGRI/Reuters
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A assistência aplaudiu de pé no final da primeira antestreia de Pass Over, uma reinvenção do À Espera de Godot de Samuel Beckett CAITLIN OCHS/Reuters
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Espectadores festejam a reabertura das salas do mítico quarteirão nova-iorquino dedicado ao entretenimento CAITLIN OCHS/Reuters

A Broadway pode ter visto o mais longo encerramento da sua história, mas angariou entretanto novos investidores e fez planos ambiciosos para a sua reabertura em grande, determinada a provar que não há negócio como o negócio do entretenimento. 

Há um enorme optimismo quanto ao regresso dos musicais e das produções teatrais em Setembro, encabeçado pelos sucessos Hamilton, O Rei Leão e Wicked.

As salas poderão funcionar a 100%, sem restrições de lotação, mas os espectadores, os elencos e as equipas de bastidores terão de fazer prova de vacinação.

Historicamente disponíveis para correr riscos, os produtores da Broadway voltaram a financiar novos projectos, apesar de perdas de milhões de dólares com a quebra das vendas de bilhetes. Os três grandes musicais acima referidos estavam a fazer cerca de um milhão de dólares (cerca de 853 mil euros) por semana antes do encerramento de 18 meses que teve início em Março de 2020. 

“Os produtores investem naquilo por que se apaixonam. Não há nada de seguro nem de garantido naquilo que fazemos. Se quiséssemos segurança, estaríamos na banca de investimento, ou seríamos contabilistas e advogados”, disse à Reuters Ken Davenport, produtor dos premiados musicais Kinky Boots e Once on This Island.

“Este negócio favorece os corajosos... Acredito que estamos prestes a assistir a um renascimento do teatro que se estenderá pelos próximos cinco anos”, acrescentou Davenport, que tem seis novos espectáculos em desenvolvimento.

Montar um musical da Broadway requer um investimento inicial de cerca de 10 a 15 milhões de dólares (cerca de 8,5 a 12,8 milhões de euros), incluindo os salários do elenco e da equipa e os custos com caracterização, cenários e publicidade. As peças de teatro custam geralmente menos de metade desse montante.

O optimismo da Broadway não parece para já assombrado pela ausência do influente produtor Scott Rudin, que anunciou em Abril a sua retirada, após múltiplas alegações de que exercia bullying sobre a sua equipa. O produtor pediu desculpas pelo seu comportamento.

Pelo contrário, a sua retirada terá aberto caminho a novos investidores, sem atrasar projectos de grande orçamento como o primeiro revival na Broadway do musical Funny Girl e os planos de um revival de Dreamgirls.

“[A saída de Rubin] Não deixou um vazio”, disse Gordon Cox, editor de teatro da revista Variety. “Há grupos inteiros de pessoas que nunca tinham sido convidadas a investir num espectáculo da Broadway, ou que subitamente perceberam que era uma área em que podiam envolver-se. Agora que sentem que podem, parece que se tornou cool.”

Investidores negros

Mas nem tudo é cor-de-rosa no rescaldo do penoso encerramento provocado pela pandemia.

Frozen, o musical da Disney, não irá regressar, tal como o revival de West Side Story que Rubin produziu em 2020. A peça de Harry Potter que até aqui tinha duas partes está a ser condensada em apenas uma e ainda não há novidades sobre os planos pré-pandemia que previam revivals de clássicos como A Morte de um Caixeiro Viajante ou A Nossa Cidade.

A Broadway League [associação comercial que representa os interesses da indústria da Broadway] anunciou que nos próximos meses não irá divulgar resultados de bilheteira oficiais, e as vendas de bilhetes para espectáculos anteriormente muito procurados, como Wicked ou Mataram a Cotovia, têm-se mostrado muito lentas, segundo as plataformas on-line de vendas.

No entanto, foram anunciadas sete novas produções teatrais para este Outono, todas de dramaturgos negros. Algumas estão a ser financiadas por investidores que se estreiam na Broadway, incluindo a co-fundadora da estação televisiva Black Entertainment Television (BET), Sheila Johnson, que pôs dinheiro na peça Thoughts of a Colored Man. Johnson e a célebre chef Carla Hall também estão a investir num novo musical chamado Grace, sobre a história culinária negra.

O actor Blair Underwood e a ex-basquetebolista Renee Montgomery estão por sua vez a investir na peça Pass Over, uma revisão moderna de À Espera de Godot.

“Há dinheiro novo muito diversificado a chegar à Broadway, e esse dinheiro é extraordinariamente útil. O facto de ser dinheiro diversificado também é muito interessante, e inédito”, disse Brian Moreland, produtor de Thoughts of a Colored Man, que se estreia em Outubro.

Davenport sublinha que os riscos sempre farão parte do ADN da Broadway.

“Algumas das obras mais entusiasmantes e mais bem-sucedidas [dos últimos tempos na Broadway], como Hamilton, Fun Home, Spring Awakening, Hadestown ou Dear Evan Hansen, são espectáculos que, vistos no papel, nos suscitariam dúvidas sobre a existência de público interessado em vê-los”, acrescenta.

“Estamos a assistir a escolhas corajosas e excitantes para esta próxima temporada, é com esse espírito que estão os produtores. Estão a dizer: ‘Adoro esta peça, adoro a sua mensagem. Vou fazê-la, e que se lixe a pandemia, porque merece estar na Broadway.”

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