Um compromisso pela resposta à crise climática - um desafio aos candidatos autárquicos

É fundamental um compromisso formal, à escala local, onde as mudanças se poderão materializar, nomeadamente as relacionadas com a mobilidade, o consumo e a alimentação.

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neg nelson garrido

O recente relatório do IPCC para as Nações Unidas confirma o cenário preocupante para o clima do planeta -  o aumento de 1,5 graus na temperatura média global poderá chegar já em 2040. A confirmar-se, espera-se um “aumento dos períodos de seca e ondas de calor, períodos de chuva menos frequentes mas mais intensos, e uma linha de costa ameaçada pela subida do nível médio do mar” sintetizava há dias Patricia Carvalho no PÚBLICO. No mesmo artigo, Filipe Duarte Santos, professor  da FCUL  e uma das referências científicas nesta matéria, considera a região do Mediterrâneo como “um hot spot das alterações climáticas” com aumento da temperatura média acima da média global, “na ordem de 1,5 graus Celsius, quando a nível global rondará os 1,09, 1,1 graus”.

Portugal está pois na linha de risco. Rui Perdigão, professor catedrático em Física de Sistemas Complexos e Dinâmica do Clima, alerta: “a chuva de um ano pode cair numa semana” e deixa um aviso: “as autarquias (…) têm de redimensionar as perspectivas de adaptação e mitigação. As estruturas têm de ser dimensionadas para extremos em que a magnitude e frequência não se coadunam mais com o que foi desenhado.”

A grande maioria dos municípios portugueses concluiu já os seus Planos Locais de Adaptação às Alterações Climáticas mas é importante que as metas, objetivos e propostas definidas não fiquem no papel e se materializem em ações concretas no curto prazo, prevenindo os riscos que se avizinham. Para que tal aconteça, talvez seja necessário encontrar a forma ideal de colocar o assunto na agenda, sobretudo da nova geração de autarcas que será eleita em setembro, e mudar a forma como se comunicam os fenómenos climáticos. 

Num artigo publicado no site  The Conversation, Kamyar Razavi refere que tem havido uma comunicação preocupada  em assustar as pessoas,  mostrando imagens da destruição provocada pelos fenómenos climáticos e induzindo, com isso, uma noção de culpa ou incúria coletiva perante o problema. Alerta que isto pode gerar um sentido de impotência para agir e criar uma certa anestesia perante os fenómenos anormais. Recomenda, por isso, mudar a forma como se mobilizam as comunidades e os responsáveis para agir.

Por esse mundo fora há bons exemplos desse esforço de consciencialização. A Bloomberg Philanthropies lançou, há uns anos, o “American Cities Climate Challenge” um concurso que premeia as cidades com ajuda, incluindo apoio técnico especializado e uma rede de suporte para o lançamento de campanhas de comunicação, divulgação e educação. Numa escala global, a rede C40 Cities criou um Knowledge Hub com recursos de conhecimento úteis para a resposta aos desafios das alterações climáticas.

Inspirado nestes exemplos, talvez esteja na altura de Portugal alinhar os amplos recursos financeiros e de conhecimento disponíveis e mobilizar os principais atores - governo, municípios, sociedade civil e agentes económicos - para criar uma plataforma de ação que inspire e apoie a mitigação e a adaptação às alterações climáticas. 

Mas é preciso mais, é fundamental um compromisso formal, à escala local, onde as mudanças se poderão materializar, nomeadamente as relacionadas com a mobilidade, o consumo e a alimentação. Deste modo, torna-se imperativo que todos os candidatos autárquicos identifiquem as principais medidas de mitigação e adaptação às alterações climáticas que se comprometem a concretizar caso sejam eleitos. Caberá aos eleitores votar em conformidade e zelar depois pelo cumprimento das promessas. 

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

 

 
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