Pichardo, o pai: “18,40? Sim, sim. E mais. O plano para hoje era 18,60.”

Jorge Pichardo, pai e treinador do novo campeão olímpico do triplo salto, fala da conquista em Tóquio e dos problemas que enfrentou em Cuba.

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Jorge Pichardo PÚBLICO

Pouco depois de garantir o título olímpico e antes de receber a medalha de ouro, Pedro Pablo Pichardo ainda não tinha falado com Jorge, o seu pai e treinador. “Não sei se já tomou os comprimidos, que ele tem problemas de tensão. Calmo? Ele gosta de mostrar que está tudo controlado, mas por dentro não está.” Já com a medalha ao pescoço do filho, Jorge Pichardo parecia bem-disposto, sem qualquer problema aparente de tensão, mas não estava totalmente satisfeito: queria mais, muito mais.

Queria um recorde, fosse o olímpico de Kenny Harrison em 1996 (18,09m) ou o mundial de Jonathan Edwards em 1995 (18,29m). Era o que estava planeado e parecia que Pedro Pablo tinha um salto dessa grandeza guardado nas pernas para esta final. “A estratégia que tínhamos era essa, quebrar o recorde olímpico, mas ele tinha uma pequena lesão. Está com 18,40? Sim, sim, 18,40. E mais! Sim, o plano que tínhamos era de apontar aos 18,60, era o plano que havia para hoje e foi por isso que ele saltou a 17,71 na qualificação”, revelou Pichardo sénior.

O recorde pode aparecer em breve, acrescentou o treinador cubano, que, tal como o filho, diz que é um tipo pouco emotivo. Mas quando houver o tal recorde, aí é que vão ver o que é emoção. “Não sou uma pessoa muito emotiva, quando ele saltar o recorde é que vão ver o que é emoção. Desde 2019 que estamos a trabalhar para bater o recorde. Ainda não saiu, espero que seja ainda esta temporada. Quanto mais rápido melhor.”

Foi por causa dele que Pedro Pablo teve de sair de Cuba. Os responsáveis pelo desporto cubano não queriam que ele fosse o treinador – até o mandaram treinar basebol – e os resultados não foram os melhores. O pai foi trabalhar para a Suécia e juntos trabalharam num plano de fuga que seria concretizado durante um estágio na Alemanha. Da Alemanha, vieram para Portugal – para representar o Benfica, que, na altura, tinha perdido Nelson Évora para o Sporting - e ficaram até hoje, sem arrependimentos e com o melhor dos resultados.

“Portugal foi o país que escolhemos para competir, mas tínhamos propostas de vários países. Quando chegámos a Portugal, receberam-nos bem, deram-nos os recursos, os meios, toda a dedicação e estão aí os resultados. Escolhemos Portugal por causa do clima, que no Verão é parecido com Cuba, e pela tranquilidade. E escolhemos bem, não? Hoje vemos que tem condições, recursos, muito mais do que em Cuba. Se em Cuba vão falar disto? Estão a falar, a minha esposa comentou isso comigo quando falámos. Não quis perguntar o que estão a falar porque em 2014 é que tinham de falar, não agora. Quem perdeu foram eles, não fomos nós”, comentou.

Se Pedro Pablo é cidadão português, e canta o hino com sotaque cubano, Jorge mantém o seu castelhano cubano e não quer perder a cidadania do seu país de origem. “Não quero naturalizar-me porque se troco de nacionalidade perco os direitos às duas propriedades que tenho lá, duas vivendas”, referiu Jorge, que pode ir a Cuba quando quiser, ao contrário do filho, que está banido por mais quatro anos.

Pichardo, o pai, contou ainda que foi um atleta de méritos até ao escalão júnior e até se mostrou orgulhoso das marcas que tinha quando era jovem - 2,10m na altura, 7,39m no comprimento e 14,79m no triplo. O filho estava ao lado e só se ria. “Ele tem 28 anos e eu tinha 16. O mau era ele ou eu?”, questionou o patriarca. E o filho voltava a dar troco: “Ele acha que só ele é que era bom.”

Nunca saberemos se Pichardo pai teria sido o grande adversário de Javier Sottomayor no salto em altura ou de Ivan Pedroso no comprimento. Mas sabemos que treina um campeão olímpico que está na iminência de bater um recorde do mundo com 28 anos.

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