Os Jogos Olímpicos têm “pista trampolim” e “sapatos mágicos”

Há quem fale em “super sapatos” e “super pista” e quem contraponha com “super talento”. Provavelmente, todos terão razão.

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Warholm incrédulo com o recorde do mundo Reuters/PHIL NOBLE

Há atletas que apresentam laivos de super-heróis, ora porque esmagam a concorrência, ora porque prosperam em modalidades de esforço sobre-humano. Há ainda outros: os que pulverizam recordes. É destes que se fala aqui.

Há dois dias, Karsten Warholm encarou a final dos 400 metros barreiras como claro favorito ao ouro e, quem sabe, ao recorde do mundo – que já era seu, depois de bater uma marca com quase 30 anos. Tudo isso se confirmou em Tóquio, mas o que se passou não foi apenas um ouro olímpico e um recorde.

Quando Warholm cruzou a meta, o relógio ainda marcava 45 segundos. Houve estupefacção no local e, um pouco por todo o mundo, o atleta norueguês passou a ser o autor daquele que, pela diferença relativamente ao anterior registo, acabava de se tornar o recorde mais marcante em Tóquio e, para muitos, da história do atletismo.

O velocista tinha apontado que um ouro olímpico seria alcançado num tempo a rondar os 46,5 segundos, mas Warholm correu em 45,94s, tornando-se o primeiro ser humano a cumprir esta prova em menos de 46 segundos  a famosa barreira mental numa prova de barreiras físicas.

“Se alguém me dissesse que correria em 46,1 e não ganharia o ouro, provavelmente ter-lhe-ia batido”, apontou, incrédulo, o atleta americano Rai Benjamin, que ficou com a prata, graças a uma marca que também teria sido recorde do mundo.

No dia anterior, já a americana Sydney McLaughlin tinha corrido a mesma prova, tirando 0,44 segundos ao antigo recorde do mundo – uma marca que, até 1970, seria melhor do que os 400 metros… sem barreiras.

De onde vem tudo isto? Do talento, claro, mas não só. Há uma “pista trampolim” e há “sapatos mágicos”.

"Pista devolve energia"

Estas inovações tecnológicas são a versão 2021 da “piscina amiga” que em 2016, no Rio de Janeiro, terá facilitado alguns recordes na natação.

No que diz respeito à pista, existem pequenas bolsas de ar na camada inferior do piso, que oferecem maior absorção do choque e maior energia de retorno, criando uma espécie de “efeito trampolim” nos pés dos atletas – Andrea Vallauri, criador da pista, apontou ao Guardian um a dois por cento de melhoria na performance.

McLaughlin confirmou que sente esses efeitos. “Dá para sentir. É uma pista que te devolve energia e empurra-te para a frente”, apontou.

Depois, temos os “sapatos mágicos”. Muitos atletas correm com calçado que tem uma camada de fibra de carbono que melhora a transferência de energia. No caso de Warholm, foi desenvolvido pela Puma com ajuda de técnicas aplicadas nos Mercedes de Fórmula 1.

Mas há mais. Na versão da Nike, os sapatos apresentam, além da placa de carbono, uma camada de espuma que, tal como a pista, proporciona o “efeito trampolim”. Aplicando a versão norueguesa do “diz o roto ao nu”, Warholm apontou que os rivais usam coisas que não deveriam.

“Acho que é horrível que ponham trampolins nos sapatos. Tira credibilidade ao nosso desporto e não entendo por que motivo alguém põe esses componentes num sapato de corrida. Eles têm essas coisas que eu odeio”, criticou Warholm, referindo-se ao calçado usado por Rai Benjamin.

Sebastian Coe, presidente da Federação Internacional de Atletismo, não está, para já, preocupado com o chamado “doping tecnológico” em sapatos de corrida. “O meu instinto natural é não tentar limitar a inovação. Temos de garantir que não permitimos que os materiais transformem o desporto em algo que não reconhecemos, mas não penso que estejamos nessa fase. Penso que estamos no sítio certo em termos de equilíbrio e que estamos a ver atletas realmente talentosos”, apontou, citado pela BBC.

Há quem fale do efeito dos “super-sapatos” e da “superpista” e quem contraponha com a força do “super-talento”. Provavelmente, todos terão razão.

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