Contactos virtuais deixam idosos mais sozinhos que ausência de contacto total, indica estudo

Análise baseia-se em mais de 6500 inquéritos feitos a pessoas com mais de 60 anos nos EUA e no Reino Unido. O objectivo era perceber o impacto das comunicações digitas no bem-estar dos mais velhos.

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O estudo baseia-se em respostas recolhidas antes e depois da pandemia JOSÉ COELHO/LUSA

Contactos virtuais de amigos e família durante a pandemia deixaram muitos idosos mais solitários do que a ausência total de comunicação. A conclusão é de um estudo publicado a semana passada na revista académica Frontiers in Sociology, com base em inquéritos a mais de 6500 pessoas com mais de 60 anos nos EUA e no Reino Unido. O objectivo era perceber o impacto das comunicações digitais no bem-estar dos mais velhos desde o começo da pandemia de covid-19.

Independentemente do país, os sentimentos de solidão durante a pandemia eram mais frequentes nas pessoas que recorriam mais a formas de contacto virtual. Isto inclui comentários nas redes sociais, plataformas de mensagens (como o Facebook e o Skype) e telefonemas. O contacto virtual apenas contribuía para o bem-estar mental quando era usado como um suplemento a conversas cara a cara. Nos EUA, a saúde mental dos idosos privados de todos os tipos de contactos (presenciais e virtuais) durante a pandemia era melhor do que a saúde mental das pessoas que recorreriam apenas a formas de contacto virtual.

As respostas surpreenderam os investigadores da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, e da Universidade de British Columbia, no Canadá. Há várias causas possíveis. “Tem que ver com um conjunto complexo de factores como o acesso ao digital, o preço dos dispositivos, o know-how tecnológico e o potencial stress digital entre a população a envelhecer”, sugeriu a doutora Yang Hu, do departamento de sociologia da Universidade de Lancaster, na apresentação do estudo. 

Aquilo a que os investigadores chamam de “stress digital” refere-se a stress causado por interacções negativas com emails e redes sociais, particularmente entre pessoas mais velhas ou com pouco conhecimento tecnológico. O facto de nos EUA a ausência total de contacto ser melhor do que contacto digital pode estar relacionado com os conhecimentos dos inquiridos: enquanto nos EUA os inquéritos foram preenchidos por correio, no Reino Unido os inquéritos foram preenchidos online.

Virtual não causa solidão

A equipa ressalva que o estudo não diz que o contacto virtual causa solidão — apenas indica uma correlação. “Por exemplo, é possível que as pessoas que se sentiam mais isoladas e sozinhas tendessem a estabelecer contactos virtuais mais frequentemente”, lê-se na secção do estudo dedicada às limitações. 

Os inquéritos também não permitiram comparar diferentes formas de contacto virtual (por exemplo, a diferença de recorrer às redes sociais ou ao telefone). A equipa acredita que é preciso realizar entrevistas mais a fundo para chegar a conclusões mais exactas.

O estudo actual baseia-se em respostas recolhidas antes e depois da pandemia. Os dados dos EUA (5148 respostas) vêm do Health and Retirement Study (HRs), um estudo nacional sobre a reforma no país, enquanto os dados do Reino Unido (1391) vêm do Understanding Society (USOC), um inquérito nacional sobre os estilos de vida no país. 

Os investigadores esperam que o trabalho sirva de base para criar políticas de apoio aos idosos com benefícios concretos. Por exemplo, medidas que privilegiem interacções presenciais durante futuras crises. “Os resultados mostram claramente que as interacções virtuais podem complementar, mas não podem substituir o apoio presencial no apoio à saúde mental de pessoas mais velhas”, lê-se nas conclusões.

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