O vírus é quem mais ordena

Não é possível, num mundo globalizado, impedir que uma qualquer variante emerja e circule rapidamente entre continentes, tornando-se dominante por “mérito” próprio. O que reforça a necessidade de uma cobertura global da vacinação.

Estudos epidemiológicos indicam que os países ibéricos terão sido a porta de entrada da variante Delta na Europa. Quando, por cá, o cidadão comum só identificava por Delta uma marca de café, já a Grã-Bretanha nos exigia quarentena para impedir a entrada da estirpe indiana na velha Albion. Sem sucesso, o que não surpreende dado o elevado fluxo migratório entre países da Commonwealth.

Mesmo sabendo-se que o surto delta entre nós veio de Sul para Norte, tal não obstou ouvirmos uma valente reprimenda de Angela Merkel por termos consentido na realização da final de futebol da Champions entre duas equipes inglesas. Azar dos azares, o encontro ocorreu no Porto! Espera-se bem que as palavras do primeiro-ministro, sabe-se lá em que língua, tenham sido claras na explicação do paradoxo à congénere alemã.

Pesem todos os cuidados e advertências, a variante Delta é hoje dominante nos países europeus, GB incluída, estando a caminho de o ser também nos EUA. Tal facto mostra bem não ser possível, num mundo globalizado, impedir que uma qualquer variante emerja e circule rapidamente entre continentes, tornando-se dominante por “mérito” próprio. O que reforça a necessidade de uma cobertura global da vacinação.

Não parece, porém, ser este o caminho por onde vamos. Apesar dos apelos da OMS à maior produção e partilha mundial de vacinas, o que assistimos é a uma política de redoma dos países com maior poder económico. Depois do ranking das vacinas, com as de tecnologia ARN a subirem ao pódio, a da Astra Zeneca no papel de patinho feio, a Sputnik em banho-maria e a Sinovac excluída por falta de comparência, passámos agora à necessidade de uma terceira dose alegadamente por perda de eficácia das vacinas face às novas estirpes. Entretanto, segundo notícia do Finantial Times, o preço das vacinas ARN dispara!

A confirmarem-se os últimos dados do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, com o grau de contagiosidade da variante Delta a ser idêntico ao da varicela (cada infetado transmite a 8 pessoas), quando temos um R (t) entre nós em valore inferior a 1, estamos provavelmente a falar de uma nova variante.

Se assim for, todos os cuidados são poucos e do uso de máscara não nos livramos tão cedo, particularmente os idosos e outros grupos de risco mesmo que vacinados. Mais um revés, quando fruto de uma vacinação em massa na Europa se começava a ver a luz ao fundo do túnel, o vírus continua a ir evoluindo a seu bel-prazer mostrando que, num mundo dividido, é ele quem mais ordena.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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