Alterações climáticas e as pontes: adaptar antes de amanhã

Devido ao longo período de vida útil e ao seu grande valor económico, tornar as pontes resilientes às alterações climáticas é um desafio importante. Uma ação de adaptação precoce bem planeada pode economizar dinheiro e, sobretudo, vidas humanas.

“A vila de Müsch perdeu energia, abastecimento de água e cobertura de redes móveis. Depois perdeu a sua ponte.” “As cheias e os danos nas estradas e pontes dificultaram os esforços de resgate.” Estes são alguns títulos noticiosos do New York Times relativamente às cheias da semana passada na Alemanha, que mostraram mais uma vez a importância e a vulnerabilidade das infraestruturas (e das pontes em particular) a acontecimentos naturais extremos. Serão estas cheias o resultado de uma ação contemplada no dimensionamento para um período de retorno excecional ou resultado direto das alterações climáticas? Estes acontecimentos são excecionais ou são já o resultado da nova normalidade imposta pelas ações climáticas?

De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) das Nações Unidas, a influência humana no sistema climático é clara e as recentes emissões antropogénicas de gases de efeito estufa são as mais altas da história. O IPCC (5AR, 2014) prevê, até ao ano 2100, alterações em certas variáveis climáticas: o aumento das temperaturas entre 0,3 e 4,8ºC em relação aos níveis de 1995; a elevação do nível da água do mar de 26 a 82 cm; o aumento da precipitação em latitudes mais elevadas e a sua diminuição no sul da Europa; maior frequência de temperaturas mais quentes e menos extremos de temperatura fria na maioria das áreas terrestres.

Tendo em conta as indicações científicas, os efeitos catastróficos inesperados não estão necessariamente relacionados com o valor médio das variáveis climáticas. Não são as mudanças médias no clima que geralmente são percetíveis, mas os extremos (inundações, tempestades, ondas de calor) que causam o maior impacto na condição das pontes.

O passado recente mostra que a maior parte dos colapsos de pontes ocorre após ou durante um acontecimento climático atípico. Foi assim em Portugal com a queda da ponte de Entre-os-Rios (2001), em Itália com o viaduto de Génova (2018) e em Taiwan com a ponte Nanfang'ao (2019). Poderão, por isso, as alterações climáticas aumentar o risco de ocorrência de maior número de colapsos de pontes?

Embora haja muita incerteza na quantificação das alterações climáticas, devemos, então, “esperar para ver” até entender tudo sobre o assunto? Essa é uma opção científica inaceitável e politicamente perigosa. As tendências já sugerem que as mesmas deverão ter impactos generalizados nos sistemas humanos e naturais.

Há atualmente dois verbos de ação no combate às alterações climáticas: mitigar e adaptar. Mitigar implica reduções substanciais e sustentadas nas emissões de gases de efeito estufa – processo em curso, onde no seio do qual se destaca, entre outras, a medida proposta pela União Europeia em proibir a venda de automóveis a combustão a partir de 2035. No entanto, os efeitos desta redução não serão imediatos em virtude da inércia climática existente. Por outro lado, adaptar implica intervir nas estruturas existentes, ou no meio envolvente, para aumentar a resistência das mesmas contra tais impactos.

Ainda não existe um entendimento abrangente sobre a real influência das alterações climáticas na integridade das pontes, nem quando as autoridades devem adaptá-las levando em consideração possíveis cenários climáticos.

As ações atuais de dimensionamento de estruturas são baseadas em dados históricos e processos estacionários. O que acontecerá se e quando a base mudar? Para as novas pontes podemos atualizar os regulamentos. E para as pontes existentes? Quais são as mais afetadas? Quais são as medidas de adaptação necessárias? Quanto custa a adaptação em relação ao custo de não adaptar as nossas pontes?

Incorporar projeções futuras no planeamento pode ajudar as autoridades a prepararem-se para um futuro diferente. Uma via será integrar a preparação das pontes ao novo clima em mecanismos de planeamento existentes, não tratando o problema como algo novo. Alguns exemplos que estão a ser estudados pela comunidade científica para acomodar os efeitos das alterações climáticas: revisão dos regulamentos para as novas pontes; reforma dos manuais de manutenção e inspeção para as pontes existentes; e desenvolvimento de uma lista tão completa quanto possível dos impactos/riscos potenciais.

A mudança climática é atualmente uma das maiores ameaças para a integridade das pontes existentes. Embora a magnitude dessas mudanças esteja envolvida em grande incerteza, o facto de que o nosso clima está a mudar é inequívoco. Devido ao longo período de vida útil e ao grande valor económico, tornar as pontes resilientes às alterações climáticas é um desafio importante. Uma ação de adaptação precoce bem planeada pode economizar dinheiro e, sobretudo, vidas humanas.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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