Parece que vamos para casa

Quem resida no Reino Unido e já tenha as duas doses da vacina contra o coronavírus pode, a partir de 19 de Julho, viajar para países na lista amarela de destinos sem a necessidade de efectuar quarentena no regresso.

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Reuters/KEVIN COOMBS

A notícia é tão simples quanto isto: quem resida no Reino Unido e já tenha as duas doses da vacina contra o coronavírus pode, a partir de 19 de Julho, viajar para países na lista amarela de destinos sem a necessidade de efectuar quarentena no regresso

Quer isto dizer que, e um ano depois, sim, um ano depois, um Natal depois, uma Páscoa depois, um Verão que nem Verão foi depois, sem amigos, sem abraços, sem beijos, sem lágrimas mas com lágrimas entre a quarentena à chegada mais a quarentena no regresso e uma mão cheia de dias para não conseguir dizer o quanto sentimos a vossa falta, sim, um ano depois e dois anos depois do último Verão das nossas vidas, vamos, finalmente e na verdadeira acepção da palavra, voltar a casa.

Sim, os testes à partida e os testes à chegada não são apenas obrigatórios, são a vitória do bom senso e a responsabilização de quem há muito pede por responsabilidade e crença, mas também justiça e liberdade.

Porque a pandemia ainda está longe do fim, a certeza da não-transmissão da parte de quem já está vacinado é ainda uma incógnita, o uso de máscara é um dever, lavar as mãos é um dever, o distanciamento social e os locais arejados também e nem por sombras ir ao Bairro Alto, nem por sombras entrar num bar ou discoteca, e cafés e restaurantes só em take away.

Se a isto juntarmos os encontros com amigos em praias onde a nortada é o verbo entre cumprimentos de cotovelo e toalhas espaçadas, aqui deixamos por escrito o nosso compromisso, o compromisso há muito pensado e aqui assinado por baixo de quem tem e mais não pede senão poder ver os pais que um dia nos deram vida, os irmãos que um dia nos deram amor, os amigos que um dia foram a nossa família, a terra que um dia foi a nossa, o sol que um dia nos fez sorrir. 

Digam-me, por favor e enquanto faço as malas, de que cor é o mar? Sim, o mar, de que cor é o mar que já não me lembro, já não respiro, custa-me o asfalto sem fim, o betão a perder de vista, o horizonte de tão estreito. Já não me lembro do cheiro a sal em plena pista no aeroporto, os olhos fechados e a face na direcção do mar: é para ali, e partir a pé, sozinho com os braços abertos, em paz, finalmente em paz.

Aqui, em casa, nada de mal nos pode acontecer. 

E o mar, ainda está no mesmo lugar? No mesmo lugar, sim, se por acaso o mar não fugiu de tanta tristeza e solidão à procura de um simples abraço na noite mais escura das nossas vidas?

A noite que agora chega ao fim? Talvez sim, ao longe já se ouvem os trinados dos primeiros pássaros da manhã enquanto dois vultos rompem a madrugada, um é o teu pai, o outro a tua mãe, nós estamos mais magros e eles mais velhos, mas juntos, e nós só estamos juntos quando a noite chega ao fim. 

Mãe, parece que vamos para casa.  

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