Criadores de garranos com dificuldades para aceder a indemnizações por ataques de lobos

As duas espécies são inter-dependentes. Investigador defende apoios em função do risco de predação, que no caso deste cavalo selvagem é muito elevado.

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Onde co-existem com o lobo, garranos são a sua presa favorita PP PAULO PIMENTA

Da mesma forma que associa os bigodes pronunciados do garrano à sua dieta que inclui plantas que picam, como o tojo, o investigador galego Filipe Bárcena considera que as populações de lobo ibérico do noroeste peninsular que se cruzam com estes cavalos selvagens podem dever ao facto de deles se alimentarem o crânio mais largo, e mandíbulas adaptadas a estas presas de grandes dimensões. Uma coisa é certa, 80% da dieta dos lobos da região é carne destes equídeos, e os cientistas já perceberam que há um grande sincronismo nas épocas reprodutivas das duas espécies.

Se isto é bom para os lobos, que onde há garranos e vacas até preferem os primeiros, já para os garranos e respectivos criadores, esta relação é um problema. Combatido há séculos, tolerado, embora nem sempre, em tempos mais recentes, dada a necessidade de preservar também as alcateias, o lobo continua a ser visto como a personagem má desta história. A questão, explica o investigador português Francisco Álvares, do CIBIO-Universidade do Porto, é que se já não era fácil, antes, aceder às indemnizações que o Estado paga para compensar a morte de animais de criação por parte dos lobos, a tarefa tornou-se ainda mais complicada a partir de 2017. 

No Minho “há taxas de predação estimadas de 13 cavalos mortos por cada lobo, num ano. Durante a apresentação das Actas dos seminários do Projecto Percursos do Homem e do Garrano, Álvares explicou que a legislação, alterada em 2017, não teve em conta as especificidades do regime em que estes equídeos são criados. Para se poder eventualmente obter uma indemnização, explicou, é preciso provar que se tentou proteger a manada, com cães de guarda, e que os recém-nascidos são mantidos em estábulos ou em cercados. Regras claramente feitas a pensar noutras espécies de gado bovino, ovino ou caprino, e não num animal criado em regime selvagem.

Valorizar os serviços de ecossistemas

Numa altura em que tanto se fala na necessidade de valorizar, economicamente, os serviços de ecossistemas prestados pela natureza (seja ela mais ou menos humanizada), Francisco Álvares considera que seria importante encontrar formas de compensação que se guiem, por exemplo, pelo risco de predação, algo que, no caso da Serra d’Arga é ainda mais evidente, dado que por aqui o garrano (e em boa parte das vezes, as suas crias) representa 90% da dieta do Lobo. Apesar dos comportamentos anti-predatórios dos garanhões, que protegem a manada, e a põe a correr, a ausência de outras espécies-presa silvestres.

Certo é que, continuando a ser difícil obter compensações, a actividade de criação desta espécie estará, como o próprio garrano, em risco, e o Lobo sofrerá também com isso, tendo em conta que, no território da Serra d’Arga o pastoreio é já pouco significativo. É “necessário e urgente desenvolver uma abordagem integrada que envolva vários grupos de interesse (como investigadores, municípios, proprietários pecuários), com o objectivo de assegurar que as montanhas do Minho continuem a ser um cenário de coexistência entre um predador ameaçado e uma espécie pecuária autóctone, ambos com elevado valor ecológico e cultural”, alerta este investigador.

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