A indústria do algodão não está preparada para as alterações climáticas

Até 2040, 40% das regiões produtoras de algodão deverão ver os seus campos de cultivo encolher devido ao calor. A seca poderá atingir metade da colheita global.

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AMBER MARTIN/UNSPLASH

Os cientistas voltam a alertar para o impacto das alterações climáticas. Desta vez, o foco recai sobre a produção de algodão. Segundo um estudo publicado nesta quarta-feira pela Cotton 2040 (uma iniciativa que visa tornar a indústria de algodão mais sustentável e resistente ao clima), as alterações climáticas, desde as temperaturas mais quentes ao aumento das secas e inundações, ameaçam grande parte da produção mundial de algodão, arriscando-se a agravar a escassez, preços mais altos e preocupações financeiras para os cultivadores.

Até 2040, alertam os especialistas, 40% das regiões produtoras de algodão deverão ver os campos de cultivo encolher devido à subida das temperaturas, enquanto a seca poderá atingir metade da colheita global. Assim, a protecção deste mercado de 12 mil milhões de dólares (cerca de dez mil milhões de euros), em países como a Índia, os Estados Unidos, o Brasil e a China, exigirá tanto a redução das emissões para limitar o aquecimento do planeta como a intensificação dos esforços dos agricultores para se adaptarem aos novos tempos.

Porém, se os esforços para reduzir as emissões falharem e o aquecimento global aumentar, de acordo com as projecções científicas mais duras, a cultura do algodão poderá ser drasticamente reduzida, deixando a indústria “uma sombra do que é hoje”, prevê Sally Uren, directora do Forum for the Future, uma organização internacional sem fins lucrativos que apoia a Cotton 2040. Ainda assim, mesmo se o aquecimento não for tão rigoroso, é provável que ocorram perdas de colheitas, apesar do incremento da procura global de algodão, devido ao aumento da população e a uma classe média em expansão em alguns países em desenvolvimento.

Enquanto os produtores estão a tomar consciência dos crescentes riscos climáticos, poucas empresas que dependem do algodão conhecem esta ameaça, o mesmo acontece com os consumidores, alerta Uren. Assim, sublinha, estes novos dados devem servir como “um alerta para a indústria do algodão” no seu todo.

De acordo com o relatório, as áreas de cultivo de algodão que enfrentam alguns dos maiores riscos climáticos extremos incluem o norte do Sudão, Senegal e sul do Mali, em África, bem como partes do Iraque, Irão, Afeganistão e Paquistão. Aliás, em algumas destas regiões, o clima extremo já levou a uma volatilidade crescente nos preços deste produto. As grandes inundações no Paquistão em 2010, por exemplo, fizeram com que os preços globais desta cultura subissem de cerca de 0,70 dólares (0,59 euros), em 2009, para 2,50 dólares (2,10 euros).

Actualmente, as perdas de colheitas estão a revelar-se particularmente duras para milhões de produtores de algodão do mundo em desenvolvimento, que constituem cerca de 90% dos produtores mundiais. Entre os produtores mais pobres este fenómeno poderá significar um corte nos seus rendimentos por não se poderem dar ao luxo de se adaptar às mudanças ou de fazer a transição para colheitas mais inteligentes em termos climáticos, refere Uren. Na Índia, onde os agricultores já se debatem com graves secas e falta de água, alguns produtores de algodão viram-se sem dinheiro para reiniciar a produção depois de terem perdido as suas colheitas.

Os esforços de adaptação à mudança das condições através da alteração dos tempos de plantação, do aumento da irrigação e da previsão do clima por parte dos agricultores poderiam ajudar alguns a lidar melhor com esta situação, mas a menos que as emissões sejam reduzidas, no futuro, algumas áreas de cultivo de algodão tornar-se-ão impróprias para a cultura, explicou a directora do Forum for the Future, acrescentando que nessas regiões, os governos deveriam assegurar uma “transição justa” para os agricultores, ajudando-os, por exemplo, a adoptar novas culturas ou fornecendo redes de segurança social.

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