Adesão tímida a boicote, mas muitos protestos contra a taxa extra nas venda de jornais

Distribuidora de publicações quer aplicar taxa extra. Proprietários de quiosque dizem não conseguir aguentar esse pagamento face ao volume de negócio diário.

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Filipa Fernandez

No Porto, no Fundão e em Faro, a agência Lusa encontrou neste sábado jornais à venda nos quiosques que visitou, mas também ouviu críticas à taxa extra que a Vasp - Distribuidora de Publicações SA quer aplicar aos pontos de venda.

“Já alguém fez a conta ao número de jornais que vou ter de vender por dia só para pagar essa taxa. São pelo menos uns oito. Há dias em que, se calhar, nem isso se vende. E depois o que é que fica para comermos?”, questionou Margarida Vitória, proprietária das Lotaria Vitória no Fundão.

Por “mero desconhecimento”, este espaço não aderiu ao boicote de venda de todos os periódicos que foi agendado para dois dias e que termina neste sábado.

Anunciada pela Associação Nacional de Vendedores de Imprensa (ANVI), a acção visava protestar contra a taxa extra que a Vasp pretende começar a cobrar aos pontos de venda a partir de 4 de Julho, num valor de 1,50 euros de segunda-feira a sábado e de 1,00 euro aos domingos, acrescido de IVA.

Quando viu os valores, Margarida Vitória nem queria acreditar que lhe iam “cortar mais um bocadinho” aos cerca de 20 cêntimos que consegue receber por cada jornal vendido.

“Aos poucos ficamos sem nada. Primeiro foi a Internet, depois a pandemia, agora uma taxa. Assim não há negócio que aguente”, aponta, defendendo que a Vasp devia tentar encontrar uma solução com as editoras dos jornais.

Na papelaria do Vale, também no Fundão, a adesão ao protesto nem esteve em cima da mesa porque Ana Calvário não teve conhecimento do boicote. Mas, quanto à taxa, a proprietária já fez as contas: “São quase 50 euros por mês e 600 por ano. É um valor demasiado alto”, aponta. Esta proprietária já reclamou, mas não acredita que a posição da distribuidora mude.

“Eles têm a faca e o queijo na mão”, lamenta, apontando a posição dominante da empresa. A frase será repetida minutos depois por Ana Costa, proprietária do Quiosque Avenida, localizado na principal artéria do Fundão.

Ali, a notícia do boicote nacional também só chegou pela agência Lusa, mas Ana Costa não mostra esperança de que possa dar resultado. Ainda assim, apela aos responsáveis da distribuidora para que não avancem com o que classifica como um “verdadeiro absurdo” e uma “injustiça que não tem cabimento nenhum”.

No Porto, o mesmo cenário de venda de jornais e a mesma indignação: “Isto não tem jeito nenhum. Já chega a garantia bancária que uma pessoa tem de pagar de três em três meses. E, se falharmos uma semana, cortam logo o serviço”, exalta-se Paula Ribeiro, corresponsável do Quiosque da Lapa, junto à Praça da República, na zona central do Porto. A Vasp, sentencia, “deveria reverter a sua decisão”.

"Não aderimos ao protesto"

O Quiosque da Lapa, vende semanalmente publicações no valor global de 1.151 euros, o que pode representar sensivelmente até 15% do negócio global. Além de venda directa ao cliente, faz também revenda para outros clientes.

“Não aderimos ao protesto, não por discordarmos, pelo contrário, mas porque não houve entendimento para uma posição comum com outros postos de venda da zona”, declara Paula Ribeiro.

Também no Porto, mas na zona da Constituição, o responsável pelo pequeno quiosque Triangular, Armando Barros, tinha este sábado, como sempre, jornais para os clientes habituais, mas mantém uma escusa, já com algum tempo, de trabalhar directamente com a Vasp, preferindo obter as publicações através de um colega de ofício.

“Já não trabalho directamente com eles. Mas isso não me coíbe de dizer o que penso: uma taxa fixa tanto para quem vende 500 jornais como para quem vende 50 não tem nexo”, observa.

Por Faro, nos três quiosques que a Lusa visitou era quase total o desconhecimento da açcão de boicote à venda de periódicos.

Nuno Candeias, proprietário de um espaço no cento da cidade, assume desconhecer por completo a acção, mas referia não fazer parte da ANVI.

O empresário queixa-se, no entanto, de que os vendedores estão de “pés e mãos atados”, já que a Vasp “domina o mercado”. “Se isto vai para frente, é um problema. Agora é 1,5 euros, depois passa para dois ou para três euros”, lamenta.

Nos quiosques do Mercado Municipal de Faro a situação é semelhante, com as funcionárias a desconhecerem a acção e os jornais a continuarem expostos no balcão. Apenas uma reconhece ter lido “alguma coisa” sobre o boicote.

O protesto foi anunciado pela Associação Nacional de Vendedores de Imprensa (ANVI), uma estrutura que foi criada recentemente e que exortou os postos de venda de jornais a fazerem um boicote.

Esta associação diz que “as novas condições impostas pela Vasp são insuportáveis para os postos de venda, os quais --- com dificuldade --- fazem face às despesas fixas com os valores variáveis auferidos”.

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