Militares birmaneses acusados de destruir uma aldeia inteira

Dois idosos não conseguiram fugir e morreram queimados. Incêndios ocorreram durante perseguição a opositores da junta militar no poder.

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Imagens televisivas mostram aldeia reduzida a cinzas Reuters/OBTAINED BY REUTERS

Uma aldeia foi destruída pelo Exército birmanês depois de confrontos entre os militares e opositores da junta ditatorial que está no poder. Pelo menos duas pessoas morreram e duas centenas de casas foram reduzidas a cinzas, de acordo com testemunhas citadas pela Reuters.

O incidente ocorreu na aldeia de Kin Ma, na região de Magway, no centro do país, na terça-feira à tarde. Os habitantes dizem que os militares que perseguiam membros de grupos opositores à junta que governa a Birmânia incendiaram várias casas na aldeia. Mais de mil pessoas ficaram desalojadas e encontraram refúgio na floresta ou nas localidades mais próximas, mas dois idosos não conseguiram fugir e morreram queimados, segundo testemunhas citadas pelo jornal Irrawaddy.

O Exército, porém, responsabiliza os dissidentes pelo incêndio. O canal estatal de televisão, MRTV, controlado pelo governo, culpou um grupo de 40 “terroristas” e disse que os relatos contrários têm o objectivo de “desacreditar o Exército”.

As chamas alastraram a uma área tão extensa que foram detectadas pelo sistema de monitorização de incêndios da NASA, diz a Reuters.

“Os relatos de que a junta incendiou uma aldeia inteira em Magway, matando habitantes idosos, mostram uma vez mais que o Exército continua a cometer crimes terríveis e não tem consideração pelo povo da Birmânia”, afirmou o embaixador britânico no país, Dan Chugg.

O incêndio da aldeia é reminiscente da actuação do Exército durante a ofensiva contra a minoria rohingya, em 2017, durante a qual 700 mil pessoas foram obrigadas a fugir do país. Também nessa altura foram divulgados relatos de destruição de centenas de aldeias no estado de Rakhine pelos militares, entre acusações de genocídio e de crimes contra a humanidade.

A destruição da aldeia é mais um capítulo sangrento na luta de grande parte da sociedade birmanesa contra a junta militar que governa o país há quatro meses, depois do derrube do Governo democraticamente eleito da Liga Nacional para a Democracia (NLD). Desde Fevereiro que quase diariamente são organizadas manifestações contra o regresso dos militares ao poder, contestado pela generalidade da população, desde sindicatos, empresários, instituições de ensino, organizações religiosas, e também pela comunidade internacional.

Os protestos têm sido reprimidos violentamente pelas forças de segurança e organizações de defesa dos direitos humanos calculam que em quatro meses tenham morrido mais de 800 civis em confrontos em todo o país.

Os militares alegaram a existência de uma fraude eleitoral nas eleições legislativas do ano passado, ganhas de forma contundente pela NLD. Foram detidos os principais líderes governamentais, incluindo Aung San Suu Kyi, a chefe de facto do Governo birmanês.

Esta semana, Suu Kyi, de 75 anos, começou a ser julgada por vários crimes desde corrupção a violação de leis sanitárias durante a campanha eleitoral e até a posse ilegal de walkie-talkies.

A Birmânia viveu sob o jugo dos militares durante quase meio século, um período em que Suu Kyi, vencedora do Prémio Nobel da Paz em 1991, permaneceu vários anos presa pela sua luta contra a ditadura. A partir de 2011, os militares no poder concordaram com a entrada progressiva de civis na vida política birmanesa, autorizando a realização de eleições livres, ganhas pela NLD. Porém, a experiência democrática terminou abruptamente em Fevereiro deste ano.

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