A covid cansa toda a gente

Interromper o plano de desconfinamento será sempre uma frustração. O Presidente da República e o primeiro-ministro sabem-no bem.

Há mais de três meses que não eram registados tantos novos casos de covid-19 em Portugal. Mais de 60% destas infecções situam-se na região de Lisboa e Vale do Tejo (a cidade tem uma incidência superior ao resto do país desde Março). A faixa etária dos 20 aos 29 anos, aquela que será vacinada mais tarde, é maioritária. Lisboa tem uma taxa de incidência superior a 240 casos por 100 mil habitantes, o dobro do índice de referência, e, se a mesma não baixar no final da próxima semana, a capital vai ter de retroceder no plano de desconfinamento.

Para agravar o cenário, Portugal poderá tornar-se um dos países da União Europeia com maior incidência de casos de covid-19, por causa do rápido efeito da variante Delta, após um pico da transmissão em Lisboa a 12 de Maio. O que temos pela frente é a necessidade de acertar a estratégia em função do impacto da variante Delta, que levou Londres a recuar na abertura do país, e aprender com os erros deste último mês. Também nós iremos regredir?

Já temos algum treino na mudança de papel entre o bom e o mau aluno. O problema agora é que estávamos todos convencidos, fruto, sobretudo, do aceleramento do processo de vacinação, da redução do número de mortos e de internamentos que nos livraríamos do pesadelo a curto prazo. O relaxamento do último mês teria consequências, como é óbvio. Neste momento, essas consequências não são comparáveis com o cenário drástico de Janeiro e Fevereiro deste ano, com 70% da população vacinada em meados de Agosto.

Seja como for, interromper o plano de desconfinamento será sempre uma frustração. O Presidente da República e o primeiro-ministro sabem-no bem. O primeiro sentiu a necessidade de relembrar ao segundo que “quem nomeia o primeiro-ministro é o Presidente”, depois de António Costa ter admitido a hipótese de reversão do desconfinamento. Curiosamente, o que é raro, a troca de declarações entre Marcelo e Costa teve lugar com um em Budapeste e o outro em Bruxelas.

Quem quis o primeiro estado de emergência foi Marcelo; Costa não estava convencido. Os papéis parecem agora invertidos. O caso está encerrado, mas o nosso Verão está em aberto. Qualquer decisão sobre o avanço ou o recuo das medidas de confinamento será sempre uma decisão política — a urgência sanitária não é a mesma do início do ano, a não ser que as novas estirpes o agravem por completo. Mas o dilema mantém-se: como equilibrar saúde pública, o impacto económico e a fadiga, esse mal de que padecemos todos, incluindo o Presidente e o primeiro-ministro?

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