BE junta-se à direita no protesto da Assembleia Municipal contra envio de dados pessoais à Rússia

Parceiros de governação de Medina foram a única força política de esquerda a apoiar um voto conjunto de PSD, CDS, MPT e PPM. Socialistas voltaram a dizer que se tratou de “um erro administrativo”.

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Nuno Ferreira Santos

O BE juntou-se esta terça-feira à direita na Assembleia Municipal de Lisboa para protestar contra o envio dos dados pessoais de manifestantes anti-Putin à embaixada da Rússia por parte da Câmara de Lisboa. PSD, CDS, MPT e PPM apresentaram um voto conjunto de condenação, mas este acabou chumbado com os votos contra de PS, PCP e independentes.

Os bloquistas, parceiros de coligação de Fernando Medina na câmara, foram assim a única força política de esquerda a associar-se ao voto de protesto, uma vez que Os Verdes se abstiveram.

“É inadmissível que a mesma câmara que faz propaganda na defesa dos direitos, que se vangloria do mural no Largo de S. Domingos, seja a mesma que denuncia os activistas que lutam pelos direitos humanos, colocando os mesmos numa situação de possível risco”, lê-se no voto.

Durante a discussão, os proponentes disseram que este caso mina a confiança dos cidadãos na autarquia, enquanto os socialistas insistiram que se tratou de “um erro administrativo” e acusaram a direita de “eleitoralismo”.

“A câmara abusou da lei, não a cumpriu, e o seu máximo responsável acha que não tem nada a ver com o assunto e recusa-se a tirar consequências políticas”, afirmou Diogo Moura, do CDS, de quem partiu a iniciativa do voto conjunto. O centrista acusou a câmara de “delação” e de violar a Constituição, a Convenção de Genebra e tratados europeus e internacionais.

Argumentando que Fernando Medina deu “atabalhoadas desculpas” e associou a divulgação do caso às autárquicas que se avizinham, Diogo Moura disse que “não basta ganhar eleições, é preciso exercer o cargo democraticamente, dentro da legalidade e em defesa dos seus cidadãos”.

Pelo PSD, Luís Newton afirmou que esta situação “mandou por água abaixo” o trabalho e o investimento camarário na implementação do Regulamento Geral de Protecção de Dados, que entrou em vigor em Maio de 2018. “Depois de cerca de 100 mil euros alocados a uma consultora especializada, depois da criação de uma task force com 12 funcionários, depois de acções de sensibilização e planos de implementação, os resultados estão à vista.”

“O que discutimos não é culpa de Passos Coelho, nem do fim dos governos civis, ou um mero lapso burocrático dos serviços, ou mesmo culpa da senhora do balcão administrativo”, disse ainda Luís Newton, aludindo a uma frase usada por António Costa para comentar o caso. “Fica claro que se trata de um procedimento adoptado e validado pelo gabinete do presidente da câmara.”

José Inácio Faria, do MPT, considerou este um “caso com contornos particularmente graves” por se tratar de dados enviados a “um regime totalitário”. Já Aline de Beuvink, do PPM, questionou “que cidadão se sente seguro e com a certeza que pode confiar no seu presidente da câmara” e “quem pode confiar numa câmara que faz isto desde 2011”. “Não venham com o discurso de que ninguém vos dá lições de democracia, porque é óbvio que o presidente da câmara precisa delas”, concluiu.

Na resposta, o socialista André Couto disse que se tratou de “um erro administrativo” e que Fernando Medina tem “um longo historial de defesa da liberdade”, acusando a oposição de usar esta situação para “puro eleitoralismo”.

“Digam-nos um político, digam-nos um só político do vosso quadrante que tenha atacado tanto a Rússia como o presidente. Os senhores são os últimos a levantar a voz pelos direitos humanos e pelos mais fracos e oprimidos”, afirmou, levando a protestos nas bancadas. “Este foi um erro de rotina burocrática, não foi mais do que isso. O presidente lidou de forma exemplar com este processo. Nenhum dos senhores teria feito mais do que isto e a maioria não teria feito metade”, disse ainda André Couto.

À esquerda, Tiago Ivo Cruz (do BE) disse que “é preciso garantir que ninguém foi prejudicado por esta prática” e o independente Paulo Muacho propôs a criação de uma provedoria municipal dos direitos humanos.

O vereador das Finanças, João Paulo Saraiva, que tem o pelouro da protecção de dados, acusou “a direita que se organizou em coligação” de “atacar a honorabilidade de um conjunto de pessoas de forma inadmissível”. “Utilizar a palavra delação e querer insinuar e até afirmar que o sr. Fernando Medina e a sua equipa estão ao serviço de qualquer regime… só por anedota”, afirmou.

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