Do armário para as ruas: o que foi feito e o que falta fazer?

Dia 19 de Junho saímos mais uma vez à rua, após um ano que não nos permitiu fazê-lo, e gritamos por todos e todas aquelas que, infelizmente, já cá não estão para o fazer ao nosso lado. A luta da comunidade LGBTQI+ tem alcançado objectivos que anteriormente nos pareciam impossíveis de alcançar, mas ainda há muito a fazer. O acesso ao trabalho, à educação e à saúde devem ser iguais e marcharemos até que atinjamos a igualdade perante a lei e a sociedade.

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Reuters/Francis Mascarenhas

Em Junho assinala-se o Mês do Orgulho, no qual celebramos os feitos da luta da comunidade LGBTQ+, recordamos quem já cá não está e no qual marchamos pelo que ainda há por fazer. Mas porque ainda marchamos?

A 28 de Junho de 1969 deu-se início aos Stonewall Riots, manifestações levadas a cabo por membros da comunidade LGBTQ+, de onde se destacam os nomes de Marsha P. Johnson, Zazu Nova e Craig Rodwell, contra uma invasão ao bar Stonewall Inn por parte da polícia de Nova Iorque. Estes protestos foram considerados como os eventos que deram origem ao movimento moderno de libertação LGBTQ+, pelos direitos da comunidade e contra a discriminação e opressão.

Em Portugal, a comunidade LGBTQ+ lutou e resistiu durante longos anos até que se começassem a sentir mudanças de pensamento e de visão acerca do que é ser queer. Em 1982, só oito anos depois do 25 de Abril, foi descriminalizada a homossexualidade; em 1999 já eram permitidas uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo; o primeiro Arraial Pride português realizou-se a 28 de Junho de 1997 e três anos depois marchou-se pelo Orgulho LGBT pela primeira vez; o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo (actualmente reconhecido por apenas 24 países) passou a ser permitido em 2010, a adopção (permitida em 28 países) seis anos depois, e desde 2018 é possível exercer o direito à autodeterminação da identidade e da expressão de género.

Apesar destas conquistas, ainda há muito por que marchar. Recentemente, vimos serem apresentadas propostas à Assembleia da República no sentido de acabar e criminalizar as terapias de conversão, algo que ainda é praticado e legal no nosso país e em muitos outros, nomeadamente em Espanha, em vários estados dos Estados Unidos e em vários países dos continentes sul-americano e africano. Ainda há partidos com assento parlamentar que votam contra ou se abstêm em votações que podem melhorar as nossas vidas e dar-nos mais liberdades e garantias de igualdade.

É urgente implementar políticas anti-discriminação nos locais de trabalho e nas instituições de ensino; é necessária uma educação sexual não normativa nas escolas que não exclua as crianças queer e deve também ser implementada uma estratégia de saúde pública adequada às pessoas LGBTQ+.

Em 2019, o Observatório da Discriminação Contra Pessoas LGBTI recebeu 171 queixas de crimes de ódio contra pessoas LGBTQ+. Ainda são frequentes os relatos de crimes violentos e homicídios motivados por “LGBTQfobia” e hoje grande parte das pessoas tem pelo menos um amigo ou amiga que já foi vítima dessa discriminação.

Actualmente, a homossexualidade é considerada crime em 17 países e seis países condenam a homossexualidade com pena de morte. São cada vez mais frequentes e normalizadas as LGBT free zones — na Polónia existem cerca de 100 dessas zonas — e há países onde ainda vigoram leis anti-propaganda LGBT, como na Rússia, onde são frequentemente presos e presas activistas LGBTQ+.

O Mês do Orgulho não nasceu da necessidade de celebrar ser-se queer, mas sim para que tivéssemos direito a existir. Queremos que parem de nos discriminar, que parem de nos matar e que as nossas vidas sejam tão válidas como as das pessoas cis e heterossexuais. Dia 19 de Junho saímos mais uma vez à rua, após um ano que não nos permitiu fazê-lo, e gritamos por todos e todas aquelas que, infelizmente, já cá não estão para o fazer ao nosso lado. A luta da comunidade LGBTQI+ tem alcançado objectivos que anteriormente nos pareciam impossíveis de alcançar, mas ainda há muito a fazer. O acesso ao trabalho, à educação e à saúde devem ser iguais e marcharemos até que atinjamos a igualdade perante a lei e a sociedade.

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