Marcelo acha “muito estranho” que Espanha exija teste negativo na fronteira terrestre

Governo foi apanhado de surpresa. Autoridades espanholas exigem a todos os viajantes teste negativo, certificado de vacinação ou uma prova de que estão recuperados da covid-19.

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LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Marcelo Rebelo de Sousa disse achar “muito estranho” que Espanha passe a exigir um teste negativo à covid-19 a quem viajar de Portugal por via terrestre sem ter informado o governo português.

“Naturalmente, tendo vindo de Espanha há dois dias, acho que é muito estranho que isso tenha ocorrido sem uma palavra ao Governo português. No passado, houve sempre a preocupação de ajustar entre os dois países as medidas adoptadas, foi sempre acordo. Eu acompanho o governo, obviamente, naquilo que é a estranheza por, de repente, haver um dos países que adopta uma posição unilateral”.

Marcelo Rebelo de Sousa falou à chegada à Madeira, onde ficará até quinta-feira, 10 de Junho, para comemorar o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

“Percebemos que em tempos de pandemia, cada um cuida de si e Deus cuida de todos, isto aplica-se a quem é crente, mas há limites para este entendimento. Nós compreendemos que cada país pensa, à saída de uma crise económica e social, que o melhor é que os turistas fiquem dentro e gastem dentro, e não fora. Mas isso é pensar, não é o comportamento no espaço europeu”, disse ainda o Presidente da República.

Para o Governo português, não há outra hipótese: “Só pode ser um erro.” As palavras são do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, a propósito da exigência por parte de Espanha de um teste negativo à covid-19 a quem quiser atravessar a fronteira terrestre a partir de Portugal. “Pedimos esclarecimentos sobre esta questão às autoridades espanholas, aguardamos que sejam prestados o mais rapidamente possível, porque, senão, teríamos de adoptar, da nossa parte, medidas de reciprocidade equivalentes, tendo em conta que a situação epidemiológica de Espanha é, desde logo, pior do que a vivida em Portugal”, afirmou.

“Esperemos que se trate de um equívoco da DGS de Espanha, que esse erro, esse equívoco, seja corrigido rapidamente, sob pena de termos de tomar medidas de reciprocidade”, insistiu, em declarações à Lusa, o chefe da diplomacia, reiterando que a regra da Direcção-Geral da Saúde espanhola que entrou em vigor esta segunda-feira “viola” as boas práticas na coordenação da gestão comum da fronteira terrestre.

Desde esta segunda-feira que quem viajar de Portugal para Espanha por via terrestre tem de apresentar um teste negativo à covid-19, o certificado de vacinação ou uma prova de que está recuperado da doença, algo que até agora só era exigido a quem chegasse via marítima ou aérea.

Anunciada no domingo, em comunicado, pelo Consulado Geral de Espanha em Portugal, a regra entrou em vigor horas depois. Segundo o comunicado, Portugal passou a integrar a “lista de países ou áreas de risco” do Governo espanhol, daí a mudança. Se a situação portuguesa se alterar, a lista será actualizada, é ainda referido.

Apanhado de surpresa

Na prática, quem cruzar a fronteira tem de apresentar um dos “certificados de saúde” que já eram pedidos a outros passageiros. “A partir de 7 de Junho, todas as pessoas com seis anos ou mais que cruzarem a fronteira terrestre de Portugal para a Espanha devem ter um dos certificados de saúde exigidos para passageiros que entram em Espanha por via aérea ou marítima”, lê-se no comunicado.

Santos Silva explicou que Espanha “tinha comunicado que ia facilitar a circulação das pessoas, a entrada de estrangeiros, passando a permitir que quem já esteja vacinado não tivesse de apresentar um teste negativo à covid-19”. E acrescentou: “Não estávamos à espera daquilo que é manifestamente um erro, que é essas medidas se aplicarem também à fronteira terrestre. A fronteira entre Portugal e Espanha tem sido sempre gerida conjuntamente.”

De acordo com o Consulado de Espanha em Portugal, os viajantes poderão apresentar o resultado de um teste PCR ou de um teste de antigénio que esteja incluído na lista aprovada pela Comissão Europeia. “Os certificados de recuperação emitidos pela autoridade competente ou por um serviço médico serão aceites como válidos pelo menos 11 dias após a realização do primeiro teste diagnóstico com resultado positivo. A validade do certificado terminará 180 dias a partir da data de colecta da amostra. O certificado deve incluir, pelo menos, as seguintes informações: nome e apelido do proprietário, data e tipo do primeiro teste realizado e país emissor”, explicita-se.

Nenhuma medida deste tipo se aplica a viajantes que entrem em Portugal vindos de Espanha por via terrestre. O PÚBLICO contactou os ministérios da Administração Interna e dos Negócios Estrangeiros mas até à hora de fecho desta edição não obteve qualquer comentário.

Fonte da embaixada de Portugal em Madrid fez saber à Lusa que os executivos dos dois países estão em contacto “permanente”.

No documento oficial espanhol, publicado no Boletín Oficial del Estado (equivalente ao Diário da República em Portugal), esclarece-se que todos os certificados terão de estar redigidos em espanhol, inglês, francês ou alemão. “No caso de não ser possível obtê-lo nestes idiomas, o documento deverá ser acompanhado por uma tradução em espanhol realizada por um organismo oficial.” As regras aplicam-se também a viajantes de França para Espanha.

Certificado em sete países

Depois de vários meses de controlo temporário devido à pandemia de covid-19, a fronteira entre Portugal e Espanha reabriu a 1 de Maio. Ontem, Espanha abriu as fronteiras a todos os viajantes vacinados contra a covid-19 na esperança de relançar o turismo, um sector-chave para a economia do país. O objectivo é, no essencial, o mesmo do Certificado Digital Covid-19, que também pretende facilitar as viagens dentro do espaço europeu e que deverá começar a ser emitido em Portugal “até ao dia 1 de Julho”, data em que entra em vigor o regulamento europeu que enquadra esta questão, confirmou ao PÚBLICO fonte dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS).

Também a ministra da Saúde, Marta Temido, disse ontem, à margem de uma visita à Unidade de Cuidados Continuados Integrados da Irmandade da Santa Casa da Misericórdia da Batalha, que espera ter avanços já na segunda quinzena deste mês. “Têm estado a ser feitos testes, contamos ter os testes concluídos esta semana e estar em condições de começar a fazer alguns avanços, independentemente daquilo que seja a entrada em vigor no mês de Julho.”

Segundo a informação prestada pelos SPMS, o certificado “ficará acessível através de diversos sistemas” e, neste momento, já foram realizados, “com sucesso, testes de conectividade entre os sistemas portugueses e os de outros países da UE”. A decorrer está ainda “o desenvolvimento dos sistemas necessários à leitura dos certificados”.

No site da UE dedicada a este documento, e que está em permanente actualização, Portugal aparece na lista dos países que já estão “tecnicamente prontos” para avançar com a emissão de certificados, mas não no grupo restrito dos que já estão “efectivamente ligados [ao sistema europeu] e a emitir e/ou a verificar” o certificado previsto no portal europeu — para confirmar que a pessoa já teve a doença, para provar que aquele viajante já foi vacinado ou para certificar a existência de um teste negativo à covid-19 dentro dos prazos previstos.

O pequeno grupo que já está na última fase do processo, com tudo a funcionar, ainda de forma experimental, é composto por sete países: Alemanha, Bulgária, Croácia, Dinamarca, Grécia, Polónia e República Checa. Contudo, esta deve ser ainda considerada uma fase de testes, já que o sistema funciona apenas entre estes países — uma vez que os outros nem têm certificados emitidos nem sistema de leitura a funcionar.

No outro extremo, os que se encontram ainda em fase de testes do processo, estão a Finlândia, Hungria, Eslováquia e Eslovénia. No espaço europeu, mas fora da UE, também a Islândia, o Liechtenstein e a Noruega estão em fase de testes, enquanto a Suíça está, como Portugal, tecnicamente pronta para avançar com o processo, sem o ter ainda implementado. com Lusa

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