De Minsk a Istambul a Riade e a Bruxelas

A política externa e de defesa dos direitos humanos da UE é como uma linha dentro de um bolso, não tem princípios, ou, dito de outro modo, atiça-se contra uns e é serventuária em relação aos do big money. Felizmente podemos exigir a libertação de Roman Protasevich, mas a de Khashoggi já não podemos.

O que aconteceu ao avião da Ryanair desviado para Minsk quando sobrevoava a Bielorrússia é um ato de pirataria cometido por um Estado. 

A captura de Roman Protasevich, jornalista da oposição ao regime, obrigando o avião a aterrar, ficará para a história das repressões não só na Bielorrússia, mas em todo o mundo. Puro terrorismo de Estado, colocando toda a aviação comercial em risco de segurança.

As reações da União Europeia não se fizeram esperar e ao que parece seguir-se-ão sanções, e desde logo a proibição dos aviões daquele país aterrarem nos 27 países da UE.

O que espanta é a desproporção na condenação entre a prisão de Roman Protasevich e o assassinato de J. Khashoggi, no consulado saudita em Istambul.

J. Khashoggi também era jornalista e oposicionista do regime saudita e foi friamente esquartejado no consulado às ordens de MSB, o príncipe herdeiro. Nessa altura a condenação não implicou a menor sanção contra a Arábia Saudita.

O primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sánchez, não foi capaz de cancelar o contrato de compra de barcos de guerra, nem a chanceler Merkel os chorudos negócios. O nosso Dr. Santos Silva não chamou o embaixador de Riade, nem o nosso em Riade.

Todos deixaram o tempo passar e o esquecimento tomar conta do horrível assassinato do jornalista do Washington Post.

Quem seguiu minimamente o caso aceitará que a repercussão na UE não se compara com a de este jornalista capturado do avião e conduzido selvaticamente à prisão e obrigado a vir às televisões dizer que está bem, pois se o não fizesse não conhecemos as ameaças. Obrigar um preso a fazer aquela declaração lembra a velha prática da Inquisição. Ninguém de motu proprio se presta àquela encenação.

A política externa e de defesa dos direitos humanos da UE é como uma linha dentro de um bolso, não tem princípios, ou, dito de outro modo, atiça-se contra uns e é serventuária em relação aos do big money.

Em causa não está a firme condenação do ato de pirataria da Bielorrússia; mas sim uma justiça com dois pesos e duas medidas, o que faz perder credibilidade quando o mundo precisa tanto de justiça.

A defesa dos direitos humanos, para ter o significado que a comunidade internacional necessita, tem de ser coerente e firme.

O regime da Arábia Saudita é muito mais totalitário, violento e retrógrado que o de Lukashenko, o que não serve para absolver este último, apenas para demonstrar as diferenças de conduta.

Felizmente podemos exigir a libertação de Roman Protasevich, mas a de Khashoggi já não podemos.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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