Bolieiro insiste num “tratamento diferenciado” para os Açores no combate à pandemia

O presidente do governo dos Açores pediu ao Governo da República para revitalizar a noção de ultraperiferia, que tem estado “adormecida” a nível nacional e europeu, a propósito da vacinação contra a covid-19.

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José Manuel Bolieiro EDUARDO COSTA

No primeiro Dia dos Açores da actual legislatura, José Manuel Bolieiro, presidente do governo regional, reclamou uma “atenção especial” para o arquipélago na resposta à pandemia da covid-19 e pediu ao Governo da República para revitalizar o conceito de ultraperiferia, que, disse, está “adormecido” em Portugal e na Europa.

“Temos de insistir mais e melhor na concretização do conceito europeu de ultraperiferia. Conceito aparentemente adormecido e que deve ser revitalizado no quadro político da União Europeia, mas também nacional”, afirmou Bolieiro nesta segunda-feira, depois de ter lembrado as especificidades da insularidade do arquipélago. Uma realidade em que só existe um hospital em três das nove ilhas, um dos argumentos para que seja dada uma “atenção especial e um tratamento diferenciado” aos Açores no combate à pandemia.

“Portugal, enquanto Estado-membro e agora a presidir à União Europeia, tem a sua oportunidade de ouro para liderar este entendimento e capacidade concretizadora”, disse o presidente do governo regional, referindo-se ao pedido de discriminação positiva das regiões ultraperiféricas no processo de vacinação.

O pedido de Bolieiro surge na sequência de várias iniciativas do executivo açoriano para arranjar mais vacinas contra a covid-19. Em Março, o próprio Bolieiro escreveu à Comissão Europeia a pedir para que fosse dada primazia às regiões ultraperiféricas na vacinação.

Depois disso, e após vários pedidos, em Abril, o vice-presidente do governo açoriano, Artur Lima, assumiu ao PÚBLICO que a região iria “procurar por outros meios o fornecimento de vacinas”, a começar pelos Estados Unidos. Uma procura que ainda não teve resultados práticos conhecidos.

“A ultraperiferia reforça o que a autonomia tem por certo. Somos diferentes e como tal devemos ser reconhecidos e considerados”, reforçou Bolieiro, no seu primeiro discurso no Dia dos Açores. 

Ao longo de 20 minutos, José Manuel Bolieiro começou por enaltecer a autonomia da região, conseguida com o advento da democracia, por contraste aos tempos em que os Açores estiveram “esquecidos” pelo regime salazarista. “Éramos as ilhas adjacentes”, lembrou.

Salientando que “não são os governos, nem os ciclos políticos” que “fundamentam” a “identidade” açoriana, o líder regional fez a defesa dos sistemas autonómicos. “A autonomia é a resposta definitiva para os açorianos. A autonomia pode ter avanços, não pode é ter recuos”.

Depois, o social-democrata puxou dos galões para lembrar algumas das medidas já implementadas pelo actual governo regional, que tomou posse em Novembro de 2020. Entre elas, a diminuição de impostos até ao mínimo permitido por lei e a criação de um tecto máximo de 60 euros para viagens inter-ilhas para residentes em vigor a partir de Junho.

Houve também um apelo à união, numa altura em que se fala do aumento das rivalidades entre as ilhas açorianas, sobretudo devido à distribuição das vacinas: “os bairrismos não são a resposta a nenhum problema, os bairrismos são um problema”.

A pobreza que envergonha

O Dia dos Açores, feriado regional, é comemorado na segunda-feira do Espírito Santo, as maiores festividades populares e religiosas do arquipélago, realizadas em honra da terceira figura da Santíssima Trindade. Desde 1980 a data passou a ser utilizada para celebrar a autonomia dos Açores.

Tradicionalmente, as celebrações decorrem numa das ilhas, com a atribuição de um rol de condecorações, mas este ano realizaram-se na sede da Assembleia Regional, na Horta, numa cerimónia mais restrita, devido à pandemia. Contudo, pela primeira vez, este ano todas as forças políticas representadas no parlamento açoriano tiveram direito a discurso.

Todos os partidos deixaram a intervenção a cargo dos respectivos líderes parlamentares, à excepção do PS-Açores, que foi representado pela deputada Mariana Matos, enquanto Vasco Cordeiro, antigo presidente do governo regional e líder parlamentar, assistiu da bancada. Nos discursos, todos enalteceram a autonomia regional. Os partidos que integram o executivo açoriano (PSD, CDS, PPM) louvaram o tempo novo da política açoriana com a constituição do XIII governo, enquanto os restantes alertaram para o que ainda falta fazer na região.

Também o presidente da Assembleia Regional, Luís Garcia, depois de apelar à “união e à solidariedade”, fez questão de realçar o “calcanhar de Aquiles do desenvolvimento” dos Açores: a pobreza. “Um em cada três açorianos é pobre. Dito assim parece tão absurdo que nos envergonha”, atirou o social-democrata.

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