Fotografia

As salinas da Figueira da Foz lutam contra o esquecimento

©Maria Oliveira
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©Maria Oliveira

"O sal é uma espécie de memória do mar ausente", cogita a fotógrafa Maria Oliveira, em entrevista ao P3. "É algo que se materializa pela ausência de outro elemento. E por isso, quando caminhamos sobre o sal que se formou nas salinas, sentimos profundamente essa presença nas conchas, nas algas que secam entre os cristais e que formam como que uma segunda camada no solo." É um lugar poderoso, garante. Nas salinas da Figueira da Foz, "as mulheres já não carregam 30 quilos de sal à cabeça", como faziam outrora, mas, para além disso, pouco mudou no processo de produção de sal desde a fundação das salinas, no século XII, no lugar onde as águas do Mondego encontram o Atlântico. 

A série de fotografias De Vagar o Mar, que integra uma exposição colectiva patente na Cooperativa Árvore ao abrigo da Bienal'21 Fotografia do Porto, nasceu entre Julho e Setembro de 2020, fruto de uma residência artística sobre o tema da sustentabilidade, proporcionada pela plataforma Ci.CLO, que organiza a bienal​. "É nesse período que se dá a produção de sal", explica Maria. No resto do ano, as salinas ficam como que adormecidas, à espera do regresso do sol. A fotógrafa pouco sabia sobre o tema, confessa. "É um processo muito bonito – tão bonito como próprio o local onde tudo decorre." Foi difícil, para Maria, não cair na mera tentação de retratar apenas um lugar bonito. "Mas também foi importante não negar essa beleza, já que faz parte do lugar."

O sol intenso, o branco reflector, as texturas dos elementos naturais do local são omnipresentes nas 22 imagens de De Vagar o Mar. Mas a presença humana é, entre elas, pungente – afinal, este é um projecto sobre sustentabilidade. O contacto com os marnotos foi uma experiência importante para a fotógrafa. "A actividade é extenuante, fisicamente", descreve. "Quem continua a trabalhar nas salinas fá-lo por paixão." Gilda Saraiva, uma das jovens marnoteiras que conheceu, quis recuperar a ligação que a sua família teve, no passado, com a produção de sal e, hoje, trabalha para o Núcleo Museológico do Sal, em Lavos. Cumpre a missão de não deixar perecer a tradição. "Há salinas ao abandono, mas também há a força de novas pessoas que querem manter as salinas vivas e dar-lhes outra utilidade ou força", explica a fotógrafa, natural de Ponte de Lima. "Há jovens com vontade de aprender a actividade, que é complexa."

Para haver sal, tem de haver sol. "O sal, para cristalizar, depende estritamente das condições meteorológicas", explica. "A Figueira da Foz, como dizem por lá, 'tem tudo para não produzir sal'. É uma zona muito ventosa e a água utilizada, devido à proximidade do rio, não tem tanta concentração de sal." Se não for por uma questão de viabilidade financeira, por uma questão de preservação histórica e cultural Gilda e os marnoteiros irão continuar a lutar pela sobrevivência da tradição. "O futuro olha-se daqui", conclui.

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