Biden tira Gronelândia da lista de compras de Trump

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, garantiu que o país não está interessado em comprar a Gronelândia à Dinamarca, uma ideia sugerida por Donald Trump em 2019. Avanços e recuos beneficiam o movimento pela independência do território.

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Blinken visitou a Gronelândia com o primeiro-ministro do território, Múte Egede (à esq.) e com a cientista Mie Wingding Reuters/POOL

A ameaça de um conflito diplomático entre os Estados Unidos e a Dinamarca, que se seguiu à proposta de compra da Gronelândia pelo ex-Presidente dos EUA Donald Trump, em 2019, foi definitivamente enterrada com a garantia da Administração Biden de que o país não está interessado em comprar a gigantesca ilha do Árctico.

“Confirmo que isso é verdade”, disse o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, durante uma passagem pela Gronelândia, na quinta-feira, em resposta a um jornalista que o desafiou a declarar que os Estados Unidos não querem comprar a Gronelândia.

Blinken visitou o território autónomo da Dinamarca na companhia de representantes do Governo dinamarquês e do primeiro-ministro da Gronelândia, Múte Egede – líder do partido de centro-esquerda Inuit Ataqatigiit (Partido da Comunidade) e um apoiante da independência do território.

Durante a visita, o responsável pelos negócios estrangeiros dos EUA encontrou-se em privado com Egede para discutir as questões do investimento norte-americano e das relações comerciais entre os dois lados.

Interesse antigo

A notícia de que Trump pediu aos seus conselheiros que explorassem a possibilidade da compra da Gronelândia, em 2019, foi recebida como uma piada um pouco por todo o mundo e como uma afronta na Dinamarca, onde a questão é vista como uma causa de orgulho nacional. 

Quando os jornais Wall Street Journal e Washington Post fizeram referência à intenção de Trump, em Agosto de 2019, a primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen, disse que a proposta é “absurda”; e a ministra dos Negócios Estrangeiros da Gronelândia, Ane Lone Bagger, afirrmou que o território “não está à venda”.

Poucos dias depois, o então Presidente dos EUA cancelou uma visita à Dinamarca, dando como explicação “a falta de interesse [da Dinamarca] em discutir a compra da Gronelândia” – uma transacção que via como “um grande negócio imobiliário”.

Há mais de 150 anos que os EUA discutem a possibilidade de comprar a Gronelândia, ou de reforçar a sua ligação ao território  seja com uma maior presença militar e económica, seja através de uma possível integração do território com um estatuto semelhante ao de Porto Rico.

Numa primeira fase, na segunda metade do século XIX, o interesse foi tornado público ao mesmo tempo que os EUA finalizavam o acordo para a compra do Alasca ao Império Russo. A proposta seria recuperada em 1910, na altura em que os EUA negociaram com a Dinamarca a compra das actuais Ilhas Virgens dos Estados Unidos, nas Caraíbas.

A primeira proposta concreta foi feita após a II Guerra Mundial, em 1946: 100 milhões de dólares em barras de ouro, numa época em que o interesse estratégico na Gronelândia como defesa de primeira linha do território dos EUA, nos tempos da Guerra Fria, era visto como prioritário em termos de política externa.

A recusa da Dinamarca acabou por reforçar a presença norte-americana no território, sendo vista como um compromisso entre a ameaça da Rússia e a falta de condições financeiras do reino dinamarquês para garantir todas as suas obrigações. E viria também a revelar-se um mau negócio em termos económicos para a Dinamarca: em 1967, os EUA descobriram na região de Barrow, no extremo norte do Alasca, a sua maior reserva de petróleo até hoje – um território que estava incluído como troca com a Dinamarca na proposta de compra da Gronelândia 20 anos antes.

O interesse histórico dos EUA – reforçado pela batalha em curso pelo domínio no Árctico com a China e a Rússiareforça o movimento pela independência da Gronelândia, que tem crescido à medida que a Dinamarca se recusa a vender sem poder compensar os habitantes. Os defensores da independência acreditam que podem usar o interesse dos EUA como um meio de pressão para reforçar ainda mais a sua autonomia em relação à Dinamarca, ao mesmo tempo que negoceia compensações mais generosas por parte dos EUA.

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