BE propõe criminalização de terapias de reconversão sexual

O Bloco de Esquerda condena a existência destas “terapias” e lembra que o Parlamento Europeu já pediu aos Estados-membros que avancem sobre estas matérias. Malta e Alemanha já o fizeram.

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O Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia celebra-se a 17 de Maio Reuters/LUCY NICHOLSON

No dia em que se assinalam 31 anos desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da lista de “doenças e problemas relacionados com a saúde” (e que hoje é celebrado como Dia Internacional Contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia), o Bloco de Esquerda lembra o caminho que ainda está por cumprir e propõe a criminalização das “terapias de reconversão sexual” bem como a criminalização das intervenções cirúrgicas em crianças intersexo, vincando que são “práticas perigosas para a saúde física e mental dos cidadãos” e que não se coadunam com a defesa e garantia dos direitos humanos.

Apresentadas como “terapias de conversão”, as intervenções visam forçar uma “alteração” da orientação sexual, da identidade de género e expressão de género. “É absurdo e abusivo descrever estas práticas com ‘terapêuticas’, pois, além de não existir nada para ‘curar', não correspondem a processos mediados por um profissional de saúde, baseados em conhecimento científico, e que tenham como objectivo melhorar o estado de saúde de uma pessoa”, assinala o diploma.

As terapias sujeitam os indivíduos a “dor e sofrimento severo e resultam em danos físicos e psicológicos duradouros”, nomeadamente “perdas significativas de auto-estima, ansiedade, depressão, isolamento social, dificuldade de intimidade, ódio a si próprio, vergonha e culpa, disfunção sexual, ideias ou tentativas de suicídio e sintomas de stress pós-traumático”, argumenta o Bloco, citando o relatório de Victor Madrigal-Borloz ao Conselho de Direitos Humanos da ONU.

"Este tipo de práticas é absurdoNada tem de terapêutico. A orientação sexual e a identidade de género são componentes da identidade, da integração social das pessoas. Qualquer tentativa de as eliminar ou alterar pode contribuir para a alteração da saúde e bem-estar das pessoas. É tão ridículo pretender alterar um grupo sanguíneo de alguém como alterar a orientação sexual”, exemplifica a bloquista Fabíola Cardoso, autora do projecto de lei.

À escala europeia, o Bloco destaca os “dois bons exemplos” dos avanços legislativos em Malta e na Alemanha, onde os esforços de mudança de orientação sexual são expressamente proibidos. 

Na proposta apresentada pelo BE, os autores da intervenção ficam proibidos de exercer profissão, emprego, funções ou actividades, públicas ou privadas, durante um período fixado entre dois e 20 anos, quando nesse exercício existe contacto regular com menores, mas a vítima não for menor. Já nos casos em que a vítima é menor, a proibição de exercício de funções sobe para um mínimo de cinco anos. O documento propõe ainda o agravamento da pena no caso de o crime ser praticado “conjuntamente” por duas ou mais pessoas.

Além da proibição do exercício de funções, o BE sugere pena de prisão até três anos ou com pena de multa para “quem publicitar, facilitar, promover ou praticar esforços continuados, medidas ou procedimentos que visem alterar a orientação sexual de outra pessoa, a sua identidade de género ou expressão de género”.

Quando as alterações incluem intervenções e tratamentos médico-cirúrgicos (o que viola o artigo 5.º da Lei n.º 38/2018, de 7 de Agosto), então o BE sugere que passe a existir uma punição de pena de prisão de dois a dez anos.

Em declarações ao PÚBLICO, a deputada bloquista defende que as iniciativas internacionais e os apelos da Organização das Nações Unidas e da OMS criaram condições sociais para que o diploma possa avançar no Parlamento. Além disso, o partido quer aproveitar a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia para recordar que o Parlamento Europeu já solicitou aos Estados-membros que criminalizassem as denominadas as “terapias de conversão”.

Além da proposta do Bloco, também a deputada não inscrita Cristina Rodrigues entregou no Parlamento uma proposta semelhante, que propõe a alteração à Lei n.º 38. E é aqui que as duas propostas divergem. “Achamos que a Lei n.º 38 tem uma série de debilidades, mas como é bastante recente e causou polémicas, não a queremos fragilizar, mas reforçar e criminalizar o que a lei já diz que é proibido”, explicou Fabíola Cardoso, distinguindo as duas propostas.

O próximo passo é aproveitar a discussão internacional em torno do tema, para garantir que a mudança não acontece apenas na lei. “Interessa-nos também que exista uma discussão ampla que seja o mais participada possível para que as mudanças legislativas correspondam a mudanças reais na sociedade portuguesa”, afirmou, notando que mais de cinco mil pessoas assinaram já a petição pela ilegalização das terapias de conversão.

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