Rio critica estratégia de “ostracizar” extrema-direita e prefere traçar “linhas vermelhas”

Líder do PSD avisa que “quem faz batota e não cumpre regras” éticas só leva vantagem no curto prazo e deixa sete regras éticas aos jovens sociais-democratas de Lamego.

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Rio admitiu estar prestes bater ou até já ter batido o recorde de “presidente do PSD que esteve mais tempo como líder da oposição” LUSA/TIAGO PETINGA

O presidente do PSD, Rui Rio, criticou nesta segunda-feira a estratégia que considera estar a ser seguida na Europa de “ostracizar” a extrema-direita, admitindo ser preferível aceitar o apoio desses partidos, mas sem “nunca permitir que passem linhas vermelhas”.

Numa iniciativa online organizada pela JSD de Lamego sobre “Importância da ética na política e no exercício da vida pública”, Rio foi questionado directamente por um dos jovens, Pedro Miguel, sobre “onde encontra ética” no acordo com o Chega nos Açores ou na candidatura autárquica de Suzana Garcia à Amadora.

Sobre o Chega, Rio reiterou que o acordo que permitiu o apoio ao Governo Regional por dois deputados do partido liderado por André Ventura foi feito pelo PSD/Açores, com a concordância da direcção nacional, e que considera em nada ter “ferido os princípios éticos ou até políticos” do partido.

Perante a insistência do jovem, que questionou Rio se o PSD aceita o apoio desse partido desde que mantenha as suas “ideias reprimidas”, Rio desenvolveu qual entende ser a melhor estratégia para lidar com a extrema-direita.

“A extrema-direita vai a eleições e há quem vote nela, um voto de um português no Chega - tal como de um francês na Le Pen, ou no Vox em Espanha - é um voto igual ao dos outros, quando chega ao fim tem um resultado que espelha a vontade do povo”, afirmou, defendendo não ser correcto “do ponto de vista democrático e até de estratégia política ignorar a vontade do povo”.

Para Rui Rio, “ignorar a vontade do povo será dar força” aos que se quer “hostilizar”. “Nos parâmetros da democracia, cabe aceitar esses votos e, por interposta pessoa, aceitar os votos desses deputados, desde que tudo aquilo que possam querer fazer não fira o que são as linhas vermelhas que cada partido tem”, frisou.

Retomando uma ideia que já defendeu no seu discurso do 25 de Abril, o presidente do PSD defendeu que “não é com cordões sanitários nem com artigos de opinião radicais” que se trava o crescimento da extrema-direita, apontando que essa estratégia está a ser seguida na Alemanha, onde partidos desse espectro já atingem os 25% dos votos, ou em França, mas sem sucesso.

“É um drama (…) Não me parece que seja uma coisa muito boa para a Europa ter uma extrema-direita cada vez com mais força e continuar com essa estratégia. Coisa diferente é não ostracizar, mas nunca permitir que passe a linha vermelha. O partido extremista até está integrado, mas apenas no que é aceitável em democracia”, defendeu, considerando esta a “postura mais correcta”, “quer do ponto de vista democrático, quer do ponto de vista estratégico”.

Quanto à candidata apoiada pelo PSD à Câmara da Amadora, Rio salientou que Suzana Garcia tinha sido convidada anteriormente pelo Chega e recusara. “Como podemos dizer que é do Chega ou que tem simpatias pelo chega, quando ao Chega disse não e ao PSD disse que sim?”, afirmou.

Rio admitiu que “algum excesso verbal” da advogada nos seus comentários televisivos “pode não ser coincidente com a forma clássica de um militante do PSD se exprimir”, mas considerou que, em artigos escritos no Observador, nada viu que “fira os princípios do PSD”.

“Num contexto de candidatura é bom que não tenha linguagem parecida, porque são contextos completamente diferentes. Mas, para lá do estilo, não vejo que ela tenha afinidade directa com o Chega”, afirmou.

Sete princípios

O presidente do PSD, Rui Rio, defendeu nesta segunda-feira que “quem faz batota e não cumpre as regras éticas” só leva vantagem no curto prazo, considerando que “o tempo é um aliado” de quem é eticamente correcto. Rio elencou sete princípios éticos que considera deverem nortear não só a política, como a vida, e admitiu ser difícil “resistir na vida pública” quando se tenta seguir estes princípios.

“É obviamente muito, muito difícil resistir na vida pública, quando em cada canto, em cada esquina, estamos confrontados com violações de ordem ética, seja dentro do partido, seja fora do partido, seja até por instituições. É preciso ter uma capacidade de resistência muito grande - eu essa capacidade tenho, sempre tive ao longo da vida”, disse.

No entanto, Rio acrescentou que a pergunta é, muitas vezes, se “vale a pena resistir quando a maior probabilidade é não vencer”, salvaguardando não estar a referir-se a eleições, e deu a resposta. “A probabilidade de sucesso é menor, mas não é zero (...) Resistir na política perante estas circunstâncias é ir buscar o combustível, acreditando que, chegando ao poder, consegue-se melhorar muita coisa e influenciar através do exemplo”, disse, mas acrescentando que “está tudo montado para que todas as árvores sejam iguais no comum da floresta”.

Para o líder do PSD, a resposta pode estar na persistência: “Quem faz batota e não cumpre as regras leva sempre vantagem, seja na vida política, seja num jogo. Mas leva vantagem no curto prazo, leva desvantagem no longo prazo”, defendeu.

“O tempo é um aliado do ser humano que é eticamente correcto”, considerou.

Rio admitiu estar prestes bater ou até já ter batido o recorde de “presidente do PSD que esteve mais tempo como líder da oposição”. “E mesmo no PS não sei se houve alguém que esteve tanto tempo à espera. Mas há um recorde que não vou ter: mesmo que chegue a primeiro-ministro, dificilmente baterei o recorde do professor Cavaco Silva que esteve dez anos, hoje é muito difícil ser primeiro-ministro durante dez anos. Por isso é que o dr. António Costa já está meio de saída, ao fim de seis ou sete”, disse, em tom bem-disposto.

Aos jovens da JSD de Lamego, Rio deixou sete regras éticas que devem estar presentes na “sã convivência” com os outros e que podem gerar “uma sociedade mais propiciadora da felicidade”.

“A primeira é ser verdadeiro, respeitar sempre a verdade e não mentir. Por exemplo, vamos ter autárquicas: quando faço um programa, não posso prometer aquilo que sei de antemão que não posso cumprir”, exemplificou.

Ser coerente e agir sempre em função das suas convicções - mesmo que possam evoluir ao longo dos anos -, ser leal, ser grato, ser correcto com os adversários ("não atropelar para conseguir chegar onde quero, não deturpar o que o outro disse"), ser sério e rejeitar a hipocrisia e, finalmente, “cumprir a palavra dada” foram as restantes linhas éticas recomendadas por Rui Rio.

“Alguém que fizesse sempre tudo isto era bastante irrepreensível e quase que não era humano, uma falha aqui ou acolá temos de aceitar a toda a gente porque somos todos humanos, coisa diferente é não cumprir de todo estas regras ou nem ter a preocupação de as cumprir”, defendeu.

Questionado por um dos jovens, numa iniciativa que se estendeu por cerca de hora e meia, se a política era incompatível com a ética, Rio respondeu negativamente, embora admitindo que possa ser um campo onde é “mais difícil” não pisar a linha. “Na política, há sempre uma permanente competição, seja com os nossos adversários de outros partidos, seja dentro do partido. Como estamos sempre em dificuldades, tendemos muitas vezes em pisar linhas, a política não é incompatível com a ética, mas põe-nos mais à prova do que outros sectores da vida em comum”, afirmou, dizendo que é nesses momentos difíceis que se vê “a fibra de cada um”.

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