Presidente do México pede desculpa ao povo maia

López Obrador é acusado de oportunismo pela declaração inédita para um chefe de Estado, um dos vários actos e pedidos de perdão organizados nos 200 anos da independência mexicana.

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López Obrador visitou ainda as ruínas maias de Chicanná para “supervisionar a construção do Comboio Maia" Jose Mendez/EPA

O Presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, foi à província do Iucatão fazer um pedido de desculpas inédito aos maias pelos abusos sofridos durante a história, algo que até agora nenhum outro dirigente máximo do país tinha feito.

“Aqui, por um imperativo de ética de Governo, mas também por convicção própria, pedimos as mais sinceras desculpas ao povo maia”, disse López Obrador no seu discurso, mencionando “os abusos terríveis cometidos por particulares e autoridades nacionais e estrangeiras na conquista durante os três séculos de domínio colonial, e nos dois séculos do México independente”.

Como se previa, López Obrador focou-se na Guerra das Castas, entre 1847 e 1901, numa altura em que o México já era independente e em que governos tanto conservadores como liberais massacraram povos indígenas. Neste período, os maias dividiram-se e estiveram de ambos os lados da barricada, diz o diário espanhol El País.

O Presidente mexicano citou mesmo editorais antigos do jornal El Universal (que critica com frequência nas suas conferências de imprensa) onde se falava da escravatura como “um mal necessário, pois é uma forma de progresso económico”.

O principal destaque, contudo, foi dado à violência cometida às ordens de Porfirio Díaz, o general que governou o país durante três décadas, entre finais do século XIX e inícios do XX, inimigo de López Obrador da história política do México.

“Como durante o recente período neoliberal, durante o porfiriato, aprovaram-se as piores leis da colonização e ocorreram os piores massacres”, afirmou. Era, acima de tudo, por Porfirio Díaz que o actual chefe de Estado queria pedir perdão.

Por comparação, sublinhou López Obrador, “agora há liberdades” e “há sobretudo toda uma nova vontade de fazer justiça para o povo, como nos tempos da revolução mexicana”, justificando assim a sua presença no Museu da Guerra das Castas.

O discurso bilingue – com tradução para maia – não chegou para abafar o som dos protestos que se realizaram no exterior do museu. “Se estivesse vivo, [o líder rebelde maia] Jacinto Pat teria vergonha de todo este acto!”, gritou um jovem manifestante, denunciando, como outros, mais um gesto de oportunismo político do que um pedido sincero de desculpas. “Porque não se está a pedir perdão aos maias nem aos jovens que foram abandonados.”

Muitos maias notam que este pedido de desculpa – pelos erros de outros – acontece ao mesmo tempo que López Obrador não abandona o seu megaprojecto Comboio Maia, contra a vontade de muitas comunidades indígenas e dos ambientalistas. Aliás, presentes na cerimónia estiveram os governadores dos cinco estados do Sul, incluindo o Iucatão, por onde passa o projecto que visa atrair o turismo.

Horas antes, López Obrador visitara as ruínas maias de Chicanná para “supervisionar a construção do Comboio Maia, 1500 quilómetros de vias-férreas”.

Este foi um dos 15 eventos planeados para assinar os 500 anos na queda de Tenochtitlán, capital do império asteca e hoje Cidade do México, e os 200 da independência, e o primeiro dos três destinados a pedir perdão a diferentes comunidades.

Com Maria João Guimarães

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