Moratórias: Deco pede medidas “extraordinárias”, bancos dizem que situação está “sob controlo”

Associação Portuguesa de Bancos e organização de defesa dos consumidores com diagnósticos muito diferentes sobre o impacto e respostas ao fim moratórias de crédito para as famílias.

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LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

Ouvidas no Parlamento no âmbito de um projecto de lei do PCP que pretende o prolongamento das moratórias de crédito, a Associação Portuguesa de Bancos (APB) e a organização de defesa dos consumidores Deco estiveram de acordo sobre a eventual dificuldade em conseguir-se que a Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês) venha a autorizar a extensão das medidas que permitiram a famílias e empresas suspender o pagamento de empréstimos.

Mas além desta questão, que o economista da Deco Vinay Prangivan defende que Portugal deve continuar a reivindicar, o diagnóstico sobre o impacto do fim das moratórias, algumas das quais já terminaram, bem como a resposta que está a ser dada por parte das instituições de crédito, foi muito diferente.

Aos deputados, o presidente da APB, Fernando Faria de Oliveira, disse que “os bancos consideram que a situação está sob controlo” e que nas moratórias privadas que já venceram (crédito ao consumo e crédito à habitação) “o incumprimento é muito baixo, dentro do que estava previsto pelos bancos”.

Já a responsável pelo Gabinete de Apoio Financeiro da Deco, Natália Nunes, refere, sem contabilizar, que “há muitas famílias a contactar a associação dizendo que não têm condições de pagar os seus empréstimos”, porque não recuperam os rendimentos perdidos.

A maior divergência verifica-se, no entanto, na resposta que as instituições financeiras estão a dar às famílias em dificuldades financeiras para retomar os pagamentos, embora o universo de instituições possa ser diferente. A Deco refere que, desde Setembro, quando venceram as primeiras moratórias de crédito ao consumo - contratado sobretudo com instituições de crédito especializadas e em pontos de venda -, tem recebido “muitas” queixas de inflexibilidade para encontrar soluções adequadas à situação das famílias. E a APB garante que os bancos estão muito proactivos na avaliação e na apresentação de soluções de pagamento, cumprindo o regime legal do Plano de Acção para o Risco de Incumprimento (PARI). Este plano visa identificar situações de risco de incumprimento das famílias.

Salvaguardando que a maioria das moratórias de crédito à habitação está na solução pública, que vence em Setembro, Faria de Oliveira garantiu que os bancos têm realizado “questionários directos aos clientes” para avaliação de eventuais dificuldades, e proposto soluções, como a reestruturação de créditos ou a criação de períodos de carência de capital e juros, entre outras, que são, na prática, “moratórias individuais”.

Faria de Oliveira admitiu, no entanto, que a situação de algumas famílias terá de ser resolvida através de “apoios sociais”.

Já a responsável da Deco defende que é urgente criar medidas para responder ao fim das moratórias, considerando que até já há trabalho feito, na medida em que se podem recuperar medidas extraordinárias, como a linha de crédito extraordinária criada pelo Decreto-Lei n.º 103/2009, para permitir melhores condições para pagamento do crédito à habitação, ou ainda o regime especial de protecção para famílias sobreendividadas, criado em 2012.

Para a Deco, também é preciso reforçar e fiscalizar o cumprimento do PARI por parte das instituições financeiras.

Em relação ao fim das moratórias das empresas, o presidente da APB defendeu a necessidade de “uma acção musculada por parte do Estado” para apoiar “selectivamente” empresas e sectores mais afectados pela crise.

O Projecto de Lei 717/XIV/2, do PCP, em discussão na comissão de Orçamento e Finanças, pretende que “as moratórias cujo período de carência termine no primeiro semestre de 2021 possam ser prorrogadas, nas mesmas condições, por mais seis meses, se assim for requerido pelo beneficiário”.

Também visa garantir as mesmas condições para os beneficiários das moratórias privadas, lançadas pela Associação Portuguesa de Bancos (APB), e as moratórias públicas, ou seja, prolongar ambas, e alargar o actual regime a todas as empresas que, já beneficiando das moratórias, não se encontravam abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de Março, na sua redacção actual, que cria um quadro especial para os sectores de actividade mais afectados pela crise pandémica.

E quer ainda criar novas moratórias, para incluir os novos empréstimos contratados depois de Março de 2020, que ficaram excluídos do regime.

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