A voz por detrás da máscara

Em tempo de pandemia, a voz humana precisa de ser redescoberta como um meio de equilíbrio emocional, papel que raramente lhe é atribuído.

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Clem Onojeghuo/Unsplash

Abril é mês propício para se falar de liberdade ou da falta dela.

Este texto poderia ser um grito revolucionário ou contestatário e, de algum modo, também o é. A importância da voz é tão mais evidente quanto mais silenciada vai sendo. Em tempo de pandemia, a voz humana precisa de ser redescoberta como um meio de equilíbrio emocional, papel que raramente lhe é atribuído.

Tradicionalmente, o Dia Mundial da Voz, celebrado a 16 de abril, desde 2003, tem por principal objetivo promover a saúde do aparelho vocal e prevenir doenças da laringe. É também disto que trata este texto. Contudo, no atual contexto pandémico, permitam-me usar a voz como meio para falar de outras “maleitas”: as do isolamento, as da falta de conforto e calor humano e as da falta de expressão. Por outras palavras, deixem que fale da voz ao serviço do bem-estar emocional.

Há demasiado tempo que a voz se esconde na surdina de uma máscara. Damos por nós a repetir múltiplas vezes a mesma frase sem que tenhamos a certeza de sermos compreendidos. Além do insucesso na comunicação, importa refletir sobre as consequências fisiológicas duma incorreta utilização da voz, sobretudo no que respeita a pessoas que dependem dela para trabalhar, por exemplo professores, radialistas, vendedores, cantores, atores e sacerdotes.

A voz tem o potencial de compensar emocionalmente o isolamento. A reflexão que proponho é sobre o quanto acumulamos dentro de nós, da nossa mente e das nossas emoções, que poderia facilmente ser tratado ou libertado com uma boa conversa. Se as técnicas de respiração podem fazer milagres, imaginem o que teríamos a ganhar com uma correta vocalização ou recorrendo ao canto. Os benefícios da voz cantada são múltiplos: melhora a saúde mental, pela libertação das chamadas “hormonas da felicidade”, estimula o sistema imunitário, ajuda a recuperar a memória, promove o sentido de pertença, ajuda no funcionamento pulmonar, ameniza a dor, alivia o stress e ajuda a lidar com a dor física e emocional.

A voz acompanha-nos, desde o momento em que nascemos até ao último sopro, permitindo comunicar, desvelar emoções, aliviar a dor e ser um instrumento musical absolutamente único. Seja pela verbalização do que sentimos através de palavras, seja pelo canto, a voz pode constituir-se como um excelente mecanismo de equilíbrio, podendo ser um instrumento de cura, de combate ao isolamento, de auto-compreensão, de desenvolvimento, de expressão e de terapia: “Quem canta seus males espanta!”, diz, e bem, o nosso povo.

Se mais não podermos ser do que seres isolados, permitamo-nos ser “grito” através da libertação individual da nossa voz!


A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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