Agente que matou Daunte Wright acusada de homicídio por negligência

Família do jovem afro-americano exigia uma acusação mais pesada, por acreditar que Kimberley Potter teve intenção de matar. Demissões na polícia e acusação não travam onda de protestos.

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Centenas de pessoas protestaram em Brooklyn Center pela quarta noite consecutiva Reuters/NICHOLAS PFOSI

Kimberly Potter, a agente da polícia do estado norte-americano do Minnesota que matou o jovem negro Daunte Wright, no domingo, na sequência de uma operação de trânsito, foi acusada de homicídio por negligência.

No Minnesota, uma acusação de homicídio por negligência (second degree manslaughter, no original) implica uma pena máxima de dez anos de prisão, ou o pagamento de uma multa de até 20 mil dólares (17 mil euros).

No caso da morte de Daunte Wright, a acusação de homicídio por negligência indica que os procuradores do Ministério Público concordam com a tese avançada pelo chefe da polícia de Brooklyn Center, segundo a qual a agente Potter sacou da pistola por engano quando a sua intenção era usar o Taser para imobilizar o jovem.

"Justiça máxima"

A notícia de que os procuradores optaram pela acusação de homicídio por negligência foi mal recebida pelos advogados da família de Wright, e não deverá ser suficiente para acalmar os protestos nas ruas de Brooklyn Center, que prosseguiram na quarta-feira pela quarta noite consecutiva.

A agente Potter e o chefe da polícia de Brooklyn Center, Tim Gannon, apresentaram a demissão na terça-feira, sob pressão do conselho municipal da cidade e do presidente da câmara local, Mike Elliott.

“Apesar de reconhecermos que o procurador está a tentar obter justiça para o Daunte, nenhuma condenação poderá devolver à família Wright o seu ente querido”, disse um dos advogados da família, Ben Crump. “Isto não foi um acidente. Foi um exemplo de uso de força intencional, deliberado e ilegal.”

Na terça-feira, quando o procurador do condado de Washington, no Minnesota, ainda não tinha anunciado a sua decisão, a família de Daunte Wright exigiu uma acusação mais pesada para a agente Potter.

“Acusem-na como se nos estivessem a acusar a nós”, disse a tia de Daunte Wright, Nyesha Wright. “Queremos justiça máxima.”

Taser em vez de pistola?

Daunte Wright, de 20 anos, foi mandado parar numa operação de trânsito na cidade de Brooklyn Center, no domingo, por circular com um objecto pendurado no espelho retrovisor e por conduzir com um seguro de automóvel fora do prazo, segundo a polícia.

Depois de uma pesquisa, os agentes descobriram que havia um mandado de captura em nome de Daunte Wright, por falta de comparência a uma audiência em tribunal. Segundo os registos públicos, Wright respondia por dois delitos menos graves, segundo a lei do Minnesota – porte de arma sem licença e fuga a agentes da polícia, em Mineápolis, em Junho de 2020.

No Verão do ano passado, Mineápolis era uma cidade mergulhada em protestos na sequência da morte de George Floyd, o afro-americano que foi sufocado pelo agente Derek Chauvin, em Maio de 2020, e cuja morte deu origem à maior onda de protestos anti-racismo e contra a violência policial nos EUA desde a década de 1960. 

Brooklyn Center é uma pequena cidade do Minnesota, com 30 mil habitantes, situada a apenas 15 quilómetros de Mineápolis, onde está a decorrer o julgamento da morte de George Floyd.

Durante o encontro com a polícia, no domingo, Daunte Wright libertou-se do agente que lhe deu ordem de detenção e regressou ao carro, indicando que se preparava para fugir do local. No vídeo captado pelas câmaras dos agentes, ouve-se uma voz a gritar três vezes a palavra “Taser” e, segundos depois, a agente Potter dispara contra o peito de Wright e exclama: “Merda, dei-lhe um tiro!”

Segundo o procurador responsável pela acusação, Peter J. Orput, a agente Potter – uma veterana de 48 anos de idade, há 26 anos na polícia de Brooklyn Center – tinha o Taser colocado no lado esquerdo da cintura, para ter de usar a mão esquerda no caso de querer sacar da arma menos letal. No domingo, Potter usou a mão direita para reagir à situação.

Condenação difícil

Derek Chauvin, o agente que está a ser julgado pelo homicídio de George Floyd, também enfrenta uma acusação de homicídio por negligência. Mas os dois casos são diferentes – Chauvin responde também por duas outras formas de homicídio que implicam uma pena máxima de 40 anos de prisão.

No caso de Kimberley Potter, os especialistas dizem que o Ministério Público vai ter muita dificuldade para conseguir uma condenação.

No Minnesota, uma condenação por second degree murder exige a prova de que a agente tinha consciência de que corria o risco de “causar a morte ou grande dano físico” a Daunte Wright, disse Richard Fraser, um professor de Direito Penal na Universidade do Minnesota, em declarações ao The New York Times.

“Ela pensava que estava a usar o Taser”, disse Richard Fraser. “Como é que podemos provar, para além de qualquer dúvida razoável, que ela aceitou correr o risco, de forma consciente, de matar ou de provocar um grande dano físico?”

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