Tratamento com electrochoques ainda é subutilizado, apesar de seguro e eficaz

Terapia é indicada para tratar casos de depressão que não respondem à medicação, entre outras situações muito graves. O tratamento com electrochoques consiste em alterações na actividade eléctrica no cérebro, sendo realizado sob anestesia geral.

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Actualmente esta técnica é usada em situações muito pontuais Marco Maurício/Arquivo

Um estudo revela que Portugal está a tratar poucas pessoas com doença psiquiátrica com recurso a electroconvulsivoterapia (ECT), popularmente conhecida por electrochoques, apesar das taxas de resposta atingirem os 80 a 90% nos casos de depressão muito grave e resistente aos antidepressivos. A investigação da Faculdade de Medicina do Porto (FMUP), do CINTESIS - Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS), avaliou, pela primeira vez, o uso de electrochoques em pessoas com doença psiquiátrica internadas em hospitais públicos a nível nacional.

O trabalho concluiu que o tratamento com electrochoques está a ser subutilizado no nosso país, apesar de ser comprovadamente “rápido, seguro e eficaz” numa série de doenças psiquiátricas. Segundo o autor do estudo, Manuel Gonçalves Pinho, médico, investigador e professor da FMUP, “graças à anestesia e aos dispositivos actuais, a electroconvulsivoterapia sob anestesia é indolor para os doentes e é um dos tratamentos disponíveis mais seguros”.

Neste estudo, publicado na revista internacional The Journal of Electroconvulsive Therapy (ECT), foram identificados 674 doentes tratados com electrochoques, entre 2008 e 2015, nos hospitais públicos portugueses. Ao todo, foram registadas 879 hospitalizações, a depressão grave (major) foi o diagnóstico principal (19,6%), seguido da doença bipolar.

Quanto à taxa de utilização desta terapêutica em doentes internados, este trabalho indica que foi de apenas 0,71% ao longo de oito anos. “Esta taxa é relativamente baixa, quando comparamos com outros países europeus. É necessário desmistificar alguns preconceitos, não só na população em geral, mas também dentro da própria comunidade médica”, considera Pedro Mota, também autor do estudo.

Os investigadores referem que “existe um estigma e receio injustificado desta terapêutica motivado pelo desconhecimento em relação à técnica utilizada e pelos relatos históricos desactualizados de que a terapia seria dolorosa e com efeitos adversos significativos”. O tratamento com electrochoques consiste em alterações na actividade eléctrica no cérebro, sendo realizado sob anestesia geral.

A terapia é antiga e foi mais desenvolvida a partir dos anos 40 e mais usada nas décadas de 60 e 70. Porém, mais recentemente foi sendo gradualmente limitada até se chegar a restritas indicações clínicas que hoje podem ser usadas para fundamentar o recurso a esta opção. Assim, geralmente esta técnica é usada apenas em situações muito pontuais como as depressões muito graves onde a medicação falha ou quando o risco de suicídio é muito elevado, e está ainda indicada também para tratar alguns casos de esquizofrenia, doença bipolar, epilepsia, entre outras doenças. O procedimento requer entre seis a 12 sessões para produzir o efeito terapêutico desejado.

Inserido no projecto “1st.IndiQare”, este trabalho contou com a participação, além de Manuel Gonçalves-Pinho e Pedro Mota, de João Pedro Ribeiro e Silvério Macedo (CHTS), Jorge Mota (Sociedade Portuguesa de Electroconvulsivoterapia) e Alberto Freitas (FMUP/CINTESIS). O projecto tem financiamento do Feder - Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, através do Compete 2020 e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

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