Cinemas independentes ArcLight fecharam portas na capital do cinema americano

Têm meros 20 anos mas tornaram-se salas emblemáticas para ver cinema independente. O Cinerama Dome é um dos ecrãs que agora se apaga após guerra com senhorios e um ano de vida suspensa. Cinemas portugueses, já sem centenas de trabalhadores após dois confinamentos, reabrem na próxima segunda-feira.

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Reuters/MARIO ANZUONI

O encerramento dos mais de 300 ecrãs e 16 cinemas das chancelas ArcLight e Pacific Theatres, nos EUA, foi anunciado na segunda-feira e tem o simbolismo do apagar de ecrãs em pleno centro da indústria cinematográfica à saída de mais uma vaga da covid-19. Entre eles está o famoso Cinerama Dome, situado em Hollywood desde 1963, cuja personalidade era tal em Los Angeles que a agência Reuters humaniza agora contando-o como “uma das vítimas do novo coronavírus”.

Os cinemas ArcLight e Pacific Theatres deram a conhecer o fecho definitivo das suas portas depois de, como tem acontecido em Portugal no último ano, as associações de exibidores alertarem que muitas salas, sobretudo as independentes, não sobreviverão à pandemia sem apoios estatais. Na semana passada, surgiram notícias de um dos filmes escondidos dos cinemas — as lutas com os senhorios. O ArcLight de Culver City recebeu um aviso de despejo, afixado na sua fachada, tudo numa altura em que a Califórnia está a sair de mais um confinamento e escassas semanas depois da reabertura de muitos cinemas da região de Los Angeles com a pompa e circunstância que só um realizador como Christopher Nolan a ir ver Judas and the Black Messiah pode trazer ao regresso às salas.

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O Cinerama, em Hollywood Boulevard Mario Anzuoni/Reuters

Mas para os ArcLight, o final não foi feliz. Nunca chegaram a reabrir desde que a 15 de Março o governador autorizou o regresso das idas ao cinema. “Depois de fecharmos portas há mais de um ano, hoje [segunda-feira] temos de partilhar a notícia triste e difícil de que a Pacific não vai reabrir os seus cinemas ArcLight e Pacific Theatres”, disse a empresa, que por seu turno é detida pela Decurion Corporation, em comunicado. “Este não é o desfecho que queríamos, mas apesar de um enorme esforço que esgotou todas as opções possíveis, a empresa não tem um caminho viável à sua frente.”

"Verdadeiramente devastador"

Trata-se de cadeias com pipocas e multidões, mas à escala americana são um dos símbolos da exibição independente e o Cinerama é palco para o cinema indie e para os exclusivos na capital do cinema americano mesmo depois de ter sido comprado pela ArcLight em 2002. Tem particularidades como não permitir a entrada assim que a sessão começou e ter exposições regulares, e detalhes que não são tão especiais para outros públicos como ter lugares marcados.

O efeito catastrófico da pandemia na exibição cinematográfica ocupa o noticiário há um ano, entre avisos dos cinemas de que a sua actividade está em risco de vida e fechos totais e reaberturas parciais e condicionadas a horários e lotações que não são rentáveis. A jusante, os estúdios e distribuidores estancaram as estreias e a montante a confiança do público está também condicionada.

É neste cenário que nas últimas horas muitos lamentam o fim de salas que conhecem pessoalmente ou que têm um cariz simbólico que valorizam. “Verdadeiramente devastador”, escreveu o actor Elijah Wood no Twitter. “Eu adorava este cinema”, disse por seu turno o realizador John M. Chu. Mary McNamara, crítica do Los Angeles Times, escreveu uma crónica em que associa o fim da pandemia com a reunião da sua família, “sobreviventes da grande pandemia de 2020-21”, num ArcLight. “Era um sonho tão pequeno, na verdade: ir ao cinema outra vez.”

Los Angeles é o maior mercado regional de exibição cinematográfica dos EUA, que por seu turno são o segundo maior mercado do mundo com mais de 35 mil ecrãs — foram recentemente suplantados pela China. Em Portugal, onde há muito se avisa que mais de metade dos cinemas podem não resistir aos fechos sucessivos causados pela pandemia, as salas reabrem dia 19 com filmes como Nomadland - Sobreviver na América ou Undine. O sector terá perdido entre 300 a 400 trabalhadores com a redução de actividade e o fecho temporário dos cinemas em Portugal desde Março de 2020, como disse à Lusa em Fevereiro a Associação Portuguesa de Empresas Cinematográficas. A quebra de bilheteira em 2020 foi de mais de 75%, com perdas de receitas na ordem dos 60 milhões de euros.

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