Berbicacho

Se desde o início entrámos no mesmo barco, como entender que o regulador da UE tome uma decisão que deveria ser assumida como consensual e cada país decida de per si da política vacinal a seguir?

Na última semana tivemos dois enormes berbicachos, um deles prende-se com a política vacinal anti covid-19. Mantendo-se a falta de vacinas na União Europeia, a decisão de limitar a da AstraZeneca a maiores de 60 anos vai, uma vez mais, atrasar o delineado calendário vacinal. Assim, por maior que seja o empenhamento da task force e do Serviço Nacional de Saúde, dificilmente se poderá cumprir a meta estabelecida dos 70% da população coberta até ao próximo verão, com todas as consequências que daí podem advir.

Quando a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) reitera a posição de que esta vacina é segura sendo a probabilidade de ocorrerem complicações trombo-embólicas muito baixa, sem deixar de admitir uma relação causal, assume que o risco/benefício pende claramente a favor de uma política de vacinação em massa. Sendo esta a posição do regulador comum, como justificar este excesso de zelo de alguns países europeus nos quais nos incluímos?

Sabemos que não há produção suficiente de vacinas ARN (Pfizer e Moderna) para as necessidades da União Europeia e que a alternativa à vacina em causa é a congénere da Johnson & Johnson, também alvo de investigação pela EMA pelo mesmo tipo de complicações. Assim sendo, e sem alternativa no imediato, dever-se-ia manter a linha de rumo estabelecida, como sucede aliás no Reino Unido, evitando cair numa atitude de pára-arranca que descredibiliza este tipo de vacinas e gera incerteza na população.

Mesmo admitindo que entraves de natureza geopolítica não vão interferir na decisão da EMA relativamente ao valor da vacina Sputnik, a aguardar decisão da parte da EMA após ter passado no crivo da prestigiada revista científica Lancet, é bom lembrar que se trata, também, de uma vacina de tecnologia adenovírus.

Se desde o início entrámos no mesmo barco, como entender que o regulador da UE tome uma decisão que deveria ser assumida como consensual e cada país decida de per si da política vacinal a seguir? Sendo certo que a mortalidade covid é particularmente elevada nos maiores de 60 anos, a morbilidade nos mais novos não é despicienda. Sabe-se hoje que a persistência prolongada de sintomas em doentes com formas covid ligeiras é frequente, com todo o role de implicações na vida familiar e profissional dos afetados. Atingir rapidamente a imunidade de grupo é, pois, do interesse de todos.

Num momento em que apenas se sabe que as complicações das vacinas são raras e não se conhecendo ainda o agente gerador do processo trombótico associado, se advém de algum componente específico da vacina ou se é transversal, resultando da resposta inflamatória do próprio organismo, tem de haver serenidade e bom senso nas decisões. Não devem pois os organismos responsáveis nacionais precipitar-se, comportando-se como cataventos ao sabor da irracionalidade coletiva.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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