Irão acusa Israel de ataque ao complexo nuclear de Natanz

Televisão israelita e jornal americano dizem que os israelitas estão por trás da explosão que destruiu o sistema de energia de uma das principais instalações nucleares iranianas.

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Grande parte das instalações em Natanz são subterrâneas ABEDIN TAHERKENAREH/EPA

Dias depois do recomeço “construtivo” das conversações para relançar o acordo sobre o programa nuclear do Irão, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Teerão acusou Israel de atacar uma das principais instalações nucleares do país, garantindo que isso não travará as suas discussões com as potências envolvidas no pacto internacional. Antes pelo contrário, “os sionistas vão receber a sua resposta em mais avanços”, afirmou Mohammad Javad Zarif.

O ataque começou por ser descrito como um incidente na rede de distribuição eléctrica da central de Natanz, domingo – na véspera, o Presidente, Hassan Rohani, tinha ali inaugurado a nova fábrica de montagem de centrifugadoras, capazes de enriquecer urânio mais rapidamente e em maiores quantidades, acima do permitido no acordo de 2015, abandonado unilateralmente por Donald Trump, em 2018. O ex-chefe de Estado norte-americano reimpôs duras sanções económicas e Teerão acabou por violar os termos do pacto, que agora Joe Biden quer salvar.

Num encontro privado com deputados, citado pela agência estatal IRNA, Zarif notou que Israel tinha afirmado que tentaria minar os esforços multilaterais para relançar o acordo, o que levará ao levantamento das sanções. “Eles disseram publicamente que não vão permitir isso. Mas nós vamos vingar-nos”, afirmou. “Agora, pensam que conseguiram o seu objectivo”, acrescentou. “Se eles pensam que nos enfraqueceram nas negociações, este acto cobarde vai é fortalecer a nossa posição.”

“É uma grande operação confrontar a República Islâmica e os seus aliados, assim como tentar equipar o país com armas nucleares”, disse no domingo o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, numa reunião com autoridades de segurança. Israel manteve sempre uma postura ambígua em relação ao seu programa nuclear, nunca admitindo nem desmentindo que terá armas atómicas, o que muitos peritos consideram inegável. “As condições de hoje não existirão necessariamente amanhã”, afirmou ainda Netanyahu.

Antes das declarações do ministro iraniano, já a emissora pública israelita Kan noticiara que a “Mossad esteve envolvida” no ciberataque contra Natanz, citando responsáveis dos serviços secretos de Israel e dos Estados Unidos. Estes garantiam que os danos eram mais “significativos” do que os assumidos por Teerão e atrasariam os esforços iranianos para enriquecer urânio, um facto repetido noutras notícias.

Dois membros dos serviços secretos dos EUA ouvidos pelo jornal The New York Times descrevem uma grande explosão que destruiu completamente o sistema de energia interno (altamente protegido) que fornece as centrifugadoras subterrâneas que enriquecem o urânio. Referindo uma operação israelita, afirmam que levará pelo menos nove meses a restaurar a produção em Natanz.

“Claro” que Israel está por trás do ataque, afirmou o porta-voz do Ministério iraniano, Saeed Khatibzadeh, depois da notícia da IRNA. “Felizmente, o incidente não provocou vítimas nem danos no ambiente. Mas podia ter sido uma catástrofe. Isto é um crime contra a humanidade”, acusou, numa conferência de imprensa. Khatibzadeh diz que só as centrifugadoras “IR-1”, menos eficientes, foram afectadas, explicando que serão substituídas pelas novas.

"Guerra de sombras"

Não é certo se a Administração de Joe Biden foi avisada previamente da operação, que apanhou o secretário americano da Defesa, Lloyd J. Austin III, de visita a Israel. Mas os israelitas nunca esconderam o seu desagrado com a intenção de Biden de regressar ao acordo – e apesar de não assumirem habitualmente operações deste tipo, a verdade é que esta dificilmente terá sido a primeira destinada a pressionar Biden e a tentar impedir o sucesso das negociações reiniciadas a semana passada, em Viena.

Já depois do assassínio do principal físico nuclear iraniano, Mohsen Fakhrizadeh, morto numa operação complexa a 70 Km de Teerão poucas semanas depois da eleição de Biden, os dois inimigos continuaram aquilo que a Al-Jazeera descreve como “guerra de sombras que está a transbordar e a fazer-se de forma cada vez mais aberta”. Os últimos exemplos têm tido a forma de ataques a navios – no próprio dia em que as negociações arrancaram, um navio iraniano foi alvo de um ataque no mar Vermelho.

Em Junho do ano passado, uma primeira explosão em Natanz tinha provocado um incêndio e danificado precisamente o desenvolvimento das novas centrifugadoras, provocando um retrocesso de vários meses no programa iraniano.

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