Município limita preço das camisolas poveiras a 99 euros e abre curso de formação ainda este mês

Câmara da Póvoa de Varzim está a ajudar a vender a camisola, com todo o valor a reverter para quem a produz artesanalmente. À câmara vão chegando pessoas interessadas em ganhar com a nova fama desta peça.

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As artesãs dos Amigos do Museu da Póvoa de Varzim não conseguem dar conta das encomendas Nelson Garrido

A Câmara da Póvoa de Varzim e o Instituto de Emprego e Formação Profissional iniciam já no dia 19 de Abril um novo curso para pessoas interessadas em aprender a fazer as camisolas poveiras. A acção, que regista já muitos interessados, decorrerá no novo espaço dedicado à formação e produção desta peça de artesanato que tem merecido um interesse redobrado depois da polémica com a estilista norte-americana Tory Burch, que as plagiava e vendia a 695 euros a peça. Na Póvoa não há dedos para contar as encomendas e cerca de 20 mulheres que já as sabem fazer responderam ao apelo do município, mostrando-se interessadas em produzir camisolas, sob tutela das artesãs da Associação dos Amigos do Museu, que estão a funcionar como uma entidade certificadora – informal, para já – das características do produto final.

Na véspera da inauguração do Centro Empresarial instalado no Centro Coordenador de Transportes da cidade – e no qual ficará sediado o espaço dedicado à produção de camisolas – o presidente da Câmara da Póvoa de Varzim garantiu ao PÚBLICO que o município não vai deixar cair a oportunidade gerada pelo episódio de plágio e vai apoiar, de várias formas, o aumento da produção desta peça muito ligada à identidade piscatória dos poveiros. A certificação deste produto artesanal ainda decorre, mas a autarquia já criou uma etiqueta, com um selo que comprova que cada camisola é feita com a lã tradicional e tricotada e bordada à mão. Aires Pereira recusa responder à forte procura por camisolas poveiras industrializando o processo de produção.

O exagero dos custos de certificação

A autarquia também já fixou um preço máximo para a peça, de 99 euros, bem menos que os 695 que custava nas lojas da norte-americana Tory Burch. Um XXL pode custar um pouco mais, mas, recusando a especulação, diz, a autarquia vai abdicar de qualquer receita, pois quer garantir que “que as pessoas ganhem algum dinheiro com isto. Algumas mulheres dizem-nos que as entregavam, para venda em loja, por 25 ou 30 euros”, explicou o autarca. O social-democrata espera que também o Governo aprenda alguma coisa com este episódio, valorizando mais estas expressões culturais locais. Desde logo, insiste, deveria aliviar os custos exigidos para certificação de produtos artesanais que rondam os dez mil euros, seguidos de taxas anuais de três mil euros. “Já disse à senhora ministra da Cultura que isto é uma barbaridade”.

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Depois do caso de plágio por parte da estilista norte-americana Tory Burch, conhecido no mês passado e abortado pela divulgação pública da situação, os protestos de centenas de pessoas e pela ameaça de um processo judicial por parte do Estado português, o número de encomendas de camisolas poveiras disparou. Mas quem quiser comprar uma vai ter de esperar o tempo necessário para que ela seja produzida, e que pode variar, atingindo, no caso dos tamanhos maiores, as 50 horas, ou seja, vários dias. O súbito interesse pelas camisolas deixou as artesãs locais sem mãos a medir para responder às mais de 300 encomendas, de vários países. Na última reunião de Câmara, o autarca Aires Pereira referiu a existência de mais de 300 pedidos, de várias partes do mundo. 

A inspiração que veio... do México

O presidente da Junta da Póvoa de Varzim, Ricardo Silva, estava a retomar o processo de certificação destas camisolas enquanto peça do artesanato português, quando descobriu, alertado por um conterrâneo, que a estilista Tory Burch estava a vender réplicas delas – que incluíam os motivos bordados, como a coroa da monarquia portuguesa ao centro – como se se tratasse de uma criação sua, inspirada numa peça de vestuário mexicana. Perante os protestos privados do autarca, a única reacção da empresa foi no sentido de fazer desaparecer a referência ao México.

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A camisola, vendida no site de tory Burch DR

Quando o PÚBLICO revelou a situação, a avalancha de críticas nas redes sociais da estilista foi avassaladora, e o caso chegou ao site Diet Prada, um órgão que monitoriza as “más práticas” da indústria da moda: à qual não faltam histórias de plágios e de apropriação de património cultural imaterial de várias comunidades. Perante tudo isto, a empresa começou por assumir uma “inspiração na Póvoa de Varzim”, mas não uma cópia de um produto artesanal. E tentou pôr água na fervura contactando o município e propondo-se a assinar um acordo de colaboração e valorização do trabalho das mulheres que, na Póvoa, ainda fazem estas camisolas. Só que essa intenção nunca chegou a ser materializada numa proposta concreta. E perante a ameaça do recurso aos tribunais, anunciado pelo ministério da Cultura, o produto, produzido industrialmente e vendido a 695 euros, desapareceu das lojas de Tory Burch. 

Assim, quem quiser comprar uma camisola poveira vai ter de procurá-las na Póvoa de Varzim, ou no marketplace que o município criou. E vai ter ter de esperar, pacientemente, até que a peça fique pronta, e lhe seja enviada. A inspiração, essa será a de sempre. A do mar da Póvoa. 

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