Meio-irmão do rei da Jordânia colocado em prisão domiciliária promete não ficar calado

Príncipe Hamzah bin Hussein garante que vai desobedecer às ordens, depois de o Governo ter confirmado que está a ser investigado por suspeita de conspiração com forças estrangeiras.

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O rei Abdullah, rodeado por dois dos seus irmãos, Hamzah (à esquerda) e Ali MARTYN HAYHOW/EPA

A estranheza provocada pelas notícias de golpe ou de operação para travar uma conspiração em curso chegadas da Jordânia durante o fim-de-semana continua a avolumar-se. Numa gravação áudio, o meio-irmão do rei e ex-herdeiro do trono, príncipe Hamzah bin Hussein, em prisão domiciliária, promete desobedecer às ordens dos militares para cessar todos os contactos com o mundo exterior.

“Não quero provocar uma escalada, mas claro que não obedecerei quando eles disserem que não posso sair, escrever no Twitter ou entrar em contacto com pessoas, e que só tenho permissão para ver a minha família”, afirma Hamzah bin Hussein, na gravação que enviou a amigos e que foi publicada no Twitter. A notícia de que foi posto em prisão domiciliária por ordens do monarca, o rei Abdullah II, foi dada pelo próprio príncipe, num vídeo que os seus advogados fizeram chegar à BBC no sábado.

Amã diz que uma agência de serviços secretos tinha falado com a mulher de Hamzah bin Hussein sobre sair da Jordânia e acusa-o de estar em contacto com um Governo estrangeiro para desestabilizar o país. “Investigações iniciais mostram que estas actividades e movimentos tinham chegado a uma fase em que afectavam directamente a segurança e a estabilidade do país”, afirmou no domingo o ministro dos Negócios Estrangeiros e vice-primeiro-ministro, Ayman Safadi. “Sua majestade decidiu que era melhor falar directamente com o príncipe Hamzah”, acrescentou.

As primeiras confirmações sobre uma operação de segurança lançada no sábado chegaram pelos militares, que admitiam estar a investigar Hamzah bin Hussein e referiam ter sido feitas duas dezenas de detenções. O principal nome sob suspeita é o de Bassem Awadallah, antigo ministro das Finanças e ex-chefe do gabinete real, entretanto a viver na Arábia Saudita, onde se tornou próximo do príncipe herdeiro, Mohammad bin Salman.

Vários analistas com conhecimento profundo da política jordana questionaram a decisão de colocar o príncipe em prisão domiciliária e duvidam que este tenha quaisquer ligações a Awadallah. Próximo de Abdullah, o ex-ministro é associado por muitos jordanos a acusações de corrupção e o seu nome foi um dos mais gritados nos protestos pró-democracia da última década. Prender Awadallah seria uma medida popular para o rei, notam estes peritos; já acusar Hamzah, que reúne apoios entre os críticos da monarquia, provocará o oposto.

Há mesmo autores que sugerem que o regime terá decidido avançar contra Hamzah para tentar que isso passasse desapercebido face à detenção do ex-conselheiro real. Tendo em conta que o príncipe participa com frequência em encontros tribais onde o rei é criticado, não seria difícil encontrar um pretexto. O próprio Hamzah tornou-se uma voz crítica da monarquia, que acusa de autoritarismo, nepotismo e corrupção.

Hamzah foi príncipe herdeiro até 2004, quando Abdullah lhe retirou o título, numa decisão que justificou dizendo querer “libertar de responsabilidades” o meio-irmão, mas que muitos jordanos nunca compreenderam – fazer dele herdeiro foi o último desejo do rei Hussein e o primeiro decreto de Abdullah, depois de lhe suceder.

“Início de uma crise”

“Quando o chefe do Estado-Maior vem e te diz isto… Penso que é um pouco inaceitável”, diz Hamzah na última gravação, depois do vídeo onde desmentia estar envolvido em qualquer conspiração e explicava ter sido detido em casa às ordens do principal militar da monarquia, o general Youssef Huneiti.

Vista como uma das nações mais estáveis do Médio Oriente, onde a autoridade do rei não costuma ser posta em causa, a Jordânia é um aliado importante dos Estados Unidos. Os EUA, os países do Golfo, o Egipto e a Liga Árabe, todos foram rápidos a manifestar o seu apoio a Abdullah.

Com os seus dez milhões de habitantes (incluindo mais de dois milhões de palestinianos refugiados registados, 1,5 milhões destes com cidadania jordana), o país que faz fronteira com Israel, a Cisjordânia ocupada, a Síria, o Iraque e a Arábia Saudita tem uma importância estratégica bem maior do que o seu tamanho.

Ahmad Awad, analista de um centro de investigação com sede em Amã, ouvido pela Al Jazeera, descreveu estes acontecimentos como “inéditos” na Jordânia: “Isto mostra a necessidade de reformas políticas, económicas e democráticas”, defende. “Isto é o início de uma crise, não o fim.”

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