Sofia Hoffmann junta sitar, música portuguesa e jazz em Esperarei

Com um álbum publicado em 2019, a cantora Sofia Hoffmann lança agora em single Esperarei, com o pianista norte-americano John Beasley e o mestre indiano de sitar Gaurav Mazumdar.

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Sofia Hoffmann DR

Bióloga marinha de profissão e cantora, Sofia Hoffmann iniciou-se nos caminhos do jazz em 2006 e em 2019 gravou um primeiro álbum, One Soul, com temas como Easy, One last time e One soul. Na altura, nas gravações, teve ao seu lado os músicos Nuno Tavares (piano e arranjos), Naná Sousa Dias (saxofone), Nuno Oliveira (contrabaixo) e Joel Silva (bateria). Agora, lança em single um novo tema, Esperarei, gravado com o pianista norte-americano John Beasley e o mestre indiano de sitar Gaurav Mazumdar, num cruzamento entre música indiana, portuguesa e jazz. O videoclipe das gravações estreia-se esta quinta-feira.

Nascida em Lisboa, em 16 de Janeiro de 1980, Sofia Hoffmann ligou-se cedo à música, como diz a cantora ao PÚBLICO. “A música está presente na minha vida desde criança. Complementou aquilo que eu fazia no meu dia-a-dia, da escola à universidade, e passou a ser um bem necessário para a minha felicidade.” Aos 16 anos, começou a cantar numa banda que tinha no liceu, que interpretava versões e já alguns originais. “Eram quatro rapazes, eu era a única rapariga”.

Ao mesmo tempo, aprendia a tocar guitarra clássica. “Mas já cantava. E senti necessidade de aperfeiçoar as minhas capacidades vocais. Tive a sorte de aprender com a Maria do Rosário Coelho [cantora lírica que morreu em 2011, aos 85 anos], que foi ‘mãe’ musical de muita gente, não só de músicos como a Joana Amendoeira ou o Helder Moutinho, mas também de grandes actores como a Carmen Dolores ou o Vítor Norte. Ela trabalhava muito a colocação da voz.”

Laura Fedele e Maria João

Em 2006 mudou-se para Milão, por motivos profissionais, e teve de recomeçar no meio artístico. “Descobri uma professora de jazz que estava a dar um curso. Eu já gostava muito de jazz (cantei standards do cancioneiro norte-americano), bem como de bossa nova, e comecei as aulas com essa professora italiana, a Laura Fedele. Foi aí que comecei a enveredar mais pelo jazz.” Um caminho que prosseguiu em Portugal, quando regressou, estudando depois com a cantora Maria João. “Voz e interpretação. No fundo, ela conduziu-me um pouco mais na linguagem do jazz.”

O primeiro álbum surgiu em 2019. Ganhou coragem para o gravar depois de lhe dizerem que ela soava melhor em palco quando cantava temas próprios, a par de versões e de standards. “Porque eu, de vez em quando, introduzia nos espectáculos temas meus. E isso fez-me pensar que podia arriscar, e seguir a música de um modo mais profissional.” Ora isso exigia tempo e, em 2018, depois de alguns concertos, despediu-se da empresa para a qual trabalhava (“que sempre me apoiou, porque eles sabiam da minha paixão pela música”), mantendo-se ali em part-time. “Com espaço mental e temporal para me dedicar à música. E foi aí que o álbum aconteceu”.

Da meditação ao sitar

Mas antes tinha passado por uma experiência que foi decisiva nessa mudança de rumo: um retiro de meditação, onde ouviu pela primeira vez o som do sitar, um instrumento indiano da família do alaúde. “E foi assim que conheci o meu mestre ‘Acharya’ Roop Verma, discípulo de Ravi Shankar e de Ali Akbar Khan, os dois grandes nomes da música clássica indiana.” Perguntou-lhe se podia aprender, e ele disse-lhe que “era um caminho só com uma direcção, um compromisso”. Esteve com ele pouco tempo, porque Roop Verma já estava doente e acabou por morrer em 2017, mas continuou a aprender com o filho dele, Arjun Verma, que vive em São Francisco, Califórnia. E foi no dia de aniversário da morte de Roop Verma, em Nova Deli, em 2019 (“por casualidade ou não, porque nada acontece por acaso”) que conheceu o seu actual professor, Gaurav Mazumdar.

E foi com Gaurav Mazumdar que, em fins de Janeiro de 2021, em plena pandemia, gravou no estúdio Vale de Lobos (de Rui Veloso) uma meditação em forma de concerto, ainda disponível no YouTube, participando depois o músico e professor indiano na gravação do single Esperarei, que antecipa o próximo álbum de Sofia. A gravação contou ainda com o pianista, produtor e maestro norte-americano John Beasley, que tocou com músicos como Freddie Hubbard e Sergio Mendes.

Esta canção foi escrita em português, ao contrário da maioria dos temas escritos e gravados até hoje por Sofia Hoffmann. “A razão pela qual canto muito em inglês é porque estudei em inglês, trabalho muito em inglês e penso automaticamente em inglês. Sai-me naturalmente. Mas já tinha também alguns temas em português. Neste caso em concreto, em Outubro estive na Suíça (milagrosamente, já que estávamos em plena pandemia) e participei num projecto no qual o Gaurav Mazumdar era director artístico. Éramos seis artistas e estivemos a compor em temas uns dos outros. E a mim pediram-me para eu levar algo que pudesse representar Portugal. Então escrevi este tema no âmbito deste projecto”. A gravação foi feita entre Sintra, Los Angeles e Nova Deli.

Num mundo novo, respirar

“O próximo álbum”, diz Sofia, “nascerá completamente ligado a este tema. Está a ser planeado, mas achámos que este tema devia ser partilhado agora. Não só pela mensagem que tem, a saudade (e todos nós temos, neste momento, saudades de alguém), mas também por nos trazer esperança, por dizer que vale a pena esperar por quem gostamos muito, ainda que nos custe imenso. E quis também ter a reacção das pessoas relativamente a este cruzamento entre três géneros musicais. E felizmente tem sido mais do que positiva.”

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Sofia fotografada em Sintra para a capa de Esperarei DR

A letra de Esperarei diz “num mundo novo, respirar”. E a ideia de Sofia é que a interpretação dessa frase seja mesmo a de “mundo novo”: “O mundo estava de tal forma que não era sustentável continuarmos. E há que tirar lições desta pandemia, que obviamente foi uma catástrofe a nível de vidas que foram levadas, e olhar para a vida de outra forma. Para que um mundo mais consciente, sustentável e tranquilo exista e nele possamos finalmente respirar.”

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