Amnistia apela à revisão da “lei dos separatismos” em França, um dia antes de ser votada no Senado

Aprovada na Assembleia Nacional em Fevereiro, a controversa “lei dos separatismos” vai ser votada na terça-feira no Senado. A Amnistia Internacional critica a lei por nela ver um ataque às liberdades e direitos da população francesa.

Foto
A "lei dos separatismos" vai ser votada no Senado na terça-feira. POOL/Reuters

Um dia antes de o projecto de lei que visa combater os “separatismos” em França ser votado no Senado, a Amnistia Internacional apela à revisão, ou exclusão, de vários aspectos da proposta. Esta levanta “sérias preocupações”, diz a organização, sobretudo no que toca à liberdade de expressão e à protecção do princípio da não discriminação.

Aprovada no mês passado na Assembleia Nacional francesa, a proposta conhecida como “lei dos separatismos” passa agora para as mãos do Senado. Sendo este composto por uma maioria conservadora de centro-direita, os especialistas apontam para a muito possível aprovação final da lei.

Dentre os 51 artigos do projecto de lei, cujo nome oficial é “Reforçando os princípios republicanos”, a Amnistia destaca sobretudo dois aspectos no seu comunicado desta segunda-feira: o maior poder que o Governo passará a ter na atribuição de subsídios a associações e, consequentemente, a possível atitude discriminatória, e a “retórica estigmatizada” que é aplicada no documento em relação ao islão.

A lei, apresentada pelo Presidente Emmanuel Macron em Outubro do ano passado, obriga as associações a assinarem uma “carta de laicidade” que as tornará aptas para receberem subsídios públicos.

“Isto permitiria às autoridades públicas financiar só as organizações que assinem um ‘contrato de compromisso para com a República’ - um conceito definido muito vagamente e que está amplamente aberto ao abuso, e ameaça as próprias liberdades de expressão e de associação que as autoridades francesas afirmam defender”, disse Marco Perolini, investigador da Amnistia Internacional Europa, citado no comunicado da organização.

A Amnistia deixa, assim, um apelo às autoridades francesas para que não submetam as associações a um tratamento discriminatório e que lhes dêem as mesmas oportunidades, mesmo no caso das associações “que critiquem as políticas governamentais”. Se forem implementadas, estas propostas serão um “ataque às liberdades e direitos em França”, segundo a organização.

Alerta também a Amnistia para o uso desapropriado da palavra “radicalização” para justificar as medidas defendidas na lei. Visando combater o “islão radical” e o terrorismo no país, ao mesmo tempo que garante a secularidade, a lei é vista pelos críticos como um ataque à liberdade religiosa, em especial a dos muçulmanos.

O conceito de “radicalização”, usado por Macron como forma de diferenciar “aqueles que acreditam no islão e que são cidadãos republicanos plenos” dos que “agem para além do aceitável em nome da religião”, é criticado pela Amnistia pela falta de rigor.

“Temos ouvido repetidamente as autoridades francesas a utilizar o conceito, que é vago e indefinido, de ‘radicalização’ ou ‘islamismo radical’ para justificar a imposição de medidas sem fundamentos válidos”, segundo Perolini.

Também aqui a Amnistia evoca preocupações quando a atitudes discriminatórias do Governo face a “muçulmanos e outros grupos minoritários”. “Esta estigmatização tem de acabar”, apela Perolini.

Entre as outras propostas que a controversa lei encerra, incluem-se um maior controlo nos discursos de ódio na Internet com subsequentes represálias (multas e mesmo detenções) e a escolaridade obrigatória a partir dos três anos, salvo excepções aprovadas pelo Estado. Outra das propostas é a “obrigação de neutralidade religiosa”, que já antes estava em vigor, mas que foi agora alargada às empresas com contratos públicos.

A comunidade muçulmana em França é a mais vasta em toda a Europa, com cerca de 5,7 milhões de pessoas.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários