Governo argentino abandona Grupo de Lima

Desde que Alberto Fernández foi eleito, em 2019, que a Argentina tem vindo a distanciar-se dos outros membros sobre a solução para a crise venezuelana. Governo diz que as decisões da organização “não resultaram em nada”.

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Alberto Fernández, Presidente da Argentina desde 2019, afastou o país do Grupo de Lima. Reuters

A Argentina formalizou, na quarta-feira, a sua saída do Grupo de Lima, que integra actualmente 14 países e que tem como objectivo encontrar uma solução para o fim a crise venezuelana. O Governo argentino diz que deixou de poder “acompanhar” certas posições que têm vindo a ser tomadas pela organização e sublinhou que os resultados têm sido escassos.

“As acções que o Grupo tem vindo a promover a nível internacional, procurando isolar o Governo venezuelano e os seus representantes, não resultaram em nada”, lê-se no comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A admissão, em 2019, do líder da oposição venezuelana, Juan Guaidó, como representante da Venezuela é uma das incompatibilidades apontadas no comunicado, e que vai ao encontro da posição argentina face ao impasse político venezuelano, considerando que faz parte da pequena minoria do Grupo que não reconhece Guaidó como presidente interino da Venezuela.

O Governo argentino critica também “as sanções e bloqueios impostos à Venezuela e às suas autoridades” em contexto da pandemia, visto que “apenas agravaram a situação da sua população”.

Ainda assim, frisa que a sua saída do Grupo não implica que deixe de apoiar a missão, reiterando um dos grandes objectivos do Grupo, nomeadamente a necessidade de haver eleições livres no país, como “a melhor forma de ajudar a Venezuela”.

“A Argentina continuará a manter o seu compromisso e procurará encontrar soluções pacíficas e democráticas que respeitem a soberania e os assuntos internos de cada Estado”, concluiu.

O executivo argentino defende que o caminho a seguir passa pelo “​diálogo inclusivo”, que junte os vários protagonistas sociais da Venezuela, entre os quais a Igreja, as organizações não-governamentais e o sector empresarial.

O Grupo de Lima formalizou-se em 2017 e é actualmente constituído por 14 países da América do Sul e Central, mais o Canadá, com o objectivo de se encontrar uma saída pacífica para a crise venezuelana, assente em eleições livres. Embora não integrem formalmente o Grupo, os EUA também participam nas reuniões.

A Argentina entrou no Grupo de Lima ainda sob a presidência do liberal Mauricio Macri, que era um opositor assumido às políticas de Nicolás Maduro. Mas desde que o actual Presidente, Alberto Fernández, o substituiu, em Dezembro de 2019, o país alterou o rumo, aceitando Maduro como Presidente da Venezuela.

Em reacção à saída da Argentina, Trotta Gamus, que representa Guaidó em Buenos Aires, referiu que “lamentamos a decisão do Governo argentino de abandonar o Grupo de Lima, que desde 2017 tem sido fundamental para denunciar as graves violações dos direitos humanos na Venezuela, e trabalhar na única solução real, que é recuperar a democracia no nosso país”.

Guaidó deixou recentemente de ser reconhecido como presidente interino da Venezuela por vários Estados membros da União Europeia, passando a ser apresentado apenas como “interlocutor privilegiado”.

Decisão já vem de trás

Aquando das eleições na Venezuela de Dezembro do ano passado, onde Maduro voltou a assegurar o controlo total do Parlamento, os vários membros do Grupo de Lima assinaram uma declaração em que rejeitavam as eleições, as classificando de “fraudulentas” e salientavam o seu apoio a Guaidó.

Contudo, a Argentina recusou-se a assinar a declaração por considerar que Guaidó nunca esteve efectivamente à frente do Governo da República Bolivariana da Venezuela, como aponta o El País.

Neste sentido já o ministro dos Negócios Estrangeiros argentino, Felipe Solá, tinha apontado, em Novembro do ano passado, citado o Buenos Aires Times, que “a Argentina foi algumas vezes [a reuniões], mas não assinou nenhum documento e não tem um grande compromisso com o Grupo de Lima”. Para Solá, “o reforço das relações bilaterais é mais importante do que fazer parte desse grupo”.

Além de divergir da maioria quanto ao apoio à oposição venezuelana, a Argentina é também um dos poucos membros, juntamente com Uruguai e México, que tem defendido uma “terceira saída” como a melhor solução para a Venezuela. A rejeição da intervenção exterior por parte de governos estrangeiros no conflito e a necessidade de eleições livres e de uma saída negociada, ainda que discordando dos ideais da oposição, são alguns dos princípios defendidos.

Texto editado por António Saraiva Lima

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