Catarina Martins mostra abertura para negociar próximo OE, mas afasta “chantagens”

Dirigente nacional do Bloco de Esquerda revela que o partido vai apresentar uma proposta no Parlamento sobre testagem à covid-19.

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Catarina Martins é coordenadora do Bloco de Esquerda há nove anos Nuno Ferreira Santos

A coordenadora do BE, Catarina Martins, diz que o seu partido nunca deixará de ter abertura para negociar com o Governo em matéria de Orçamento do Estado (OE) e, em relação ao aviso do Presidente da República de que não espera crises políticas, refere que a pressão de Belém não é para a esquerda. “Não sei exactamente a quem é que o Presidente da República se dirige. Julgo até que se dirige mais à direita do que propriamente à esquerda (…) e também ao Governo que já tentou mais do que uma vez criar uma crise politica para criar uma situação em que pudesse ter maioria absoluta”.

Em entrevista ao Jornal de Notícias e à TSF divulgada este domingo, Catarina Martins recorda que o “Governo foi à campanha eleitoral falar dos empecilhos e da necessidade de uma maioria absoluta para se libertar da necessidade de negociar com a esquerda. Não o conseguiu, ainda não convive bem com isso”. “O país tem saudades de quatro anos em que existiu negociação à esquerda, em que foi possível reforçar rendimentos do trabalho, pensões, até acesso às reformas, serviços públicos”, assume,  aproveitando para deixar  um recado ao  Governo: “O PS tem de fazer escolhas e o Bloco de Esquerda está sempre disponível para fazer a negociação”.

Questionada se admite que possa ser o Governo a esticar a corda e a provocar uma crise política na aprovação do próximo OE, a bloquista responde que “trabalha sobre soluções, nunca sobre impasses” e alerta que as “soluções exigem medidas corajosas”. E fala sobre elas. “Exigem medidas sobre o SNS. Precisamos de uma programação de recuperação de acessos a cuidados de saúde, porque com a covid muitos cuidados prioritários foram cancelados. Todos os problemas de carreira ficaram paralisados. E é sobre estes dados muito concretos que nós queremos debater e discutir, porque um orçamento não se constrói sobre chantagens, se há ou não há crise. É sobre quais são as soluções que o país dá à crise que está a viver”.

A legislação laboral foi outro dos temas da entrevista e sobre ele a deputada sublinhou que não se trata de uma condição do Bloco, mas sim de “uma condição do país”. À legislação laboral, acrescentou o SNS, duas bandeiras que o Bloco não abdica. “[O SNS] é um extraordinário pilar da democracia e a forma como vai sobreviver a tudo sito é fundamental. Na verdade, as portas que nós abrimos cá continuam”, sustentou.

À pergunta sobre se com o PSD e o CDS unidos na candidatura de Carlos Moedas em Lisboa, a esquerda correrá o risco de perder a câmara, Catarina dá a volta: “Julgo quer me está a perguntar se o PS corre o risco de perder a câmara”. E aproveita a pergunta seguinte, que se fixa no acordo de governação pós-eleitoral que o Bloco tem na autarquia, para se deter no candidato da direita. “Carlos Moedas foi um secretário de Estado da troika, uma política falhada em que o empobrecimento do país só criou mais dificuldade. A cidade de Lisboa conhece bem essa política, conhece bem o que ela fez com a lei das rendas, o que aconteceu com o aumento do preço dos transportes, e, portanto, creio que desse ponto de vista é uma candidatura que não terá acolhimento por quem sofreu tanto na pele as decisões. Além disso, o PSD, como sabem, tem tido pouca força na cidade de Lisboa e o CDS não está propriamente no seu melhor momento. Agora, mais do que analisar, é preciso que haja propostas mobilizadoras à esquerda”, resumiu.

Ainda em matéria de autárquicas, a entrevistada foi contida a responder se a candidatura do partido a Lisboa liderada por Beatriz Gomes Dias simboliza um corte definitivo com o PS ou se admite um novo acordo pós-eleitoral em Lisboa, dizendo apenas: “O que o que foi decidido pela direcção nacional é ter listas próprias, mas não vamos fechar as portas a negociações pós-eleições”.

Relativamente ao Porto, não deu novidades, embora tenha considerado que “há todas as condições para haver uma candidatura própria (...). Essas decisões são tomadas pelas estruturas dos diferentes locais” e a decisão será assumida ainda este mês.

Ainda sobre o Porto, Catarina Martins considera que a cidade “continua a ter muitos problemas e um problema enorme de transparência da autarquia. “Quando Rui Rio foi presidente da câmara, andámos anos e anos a pedir a lista do património da autarquia para se perceber que património é que tinha sido vendido, a quem e em que condições. Não havia nenhuma transparência sobre essa matéria. E agora temos um presidente, Rui Moreira, que tem um negócio estranho com uns terrenos por causa da Selminho, que também ainda não conseguiu explicar”, apontou, rematando: “Não vemos o desenvolvimento social e de qualidade de vida e ambiental, de mobilidade, que a cidade do Porto merece e que precisa, nem vemos do ponto de vista da qualidade da democracia os critérios de transparência que temos de exigir à democracia local”.

Quanto à política de testagem, o partido liderado por Catarina Martins vai apresentar proposta no Parlamento nesse sentido.

“Nós temos proposta, falámos dela ao Governo mas, em vez de implementar a estratégia, vai criar um grupo de trabalho e portanto nós vamos apresentá-la no Parlamento, com estratégia para testagem de três formas. Em primeiro lugar, a testagem de todos os contactos, não só os chamados contactos de maior risco. Em segundo lugar, ter a testagem onde há ajuntamento de pessoas. É o que o Governo está a fazer com as escolas, mas tem de se fazer nos sítios onde há grandes aglomerações, em transportes que são muito concorridos, em entradas de fábricas com muita gente. E depois é preciso avançar com a testagem individual. Não basta dizer que os testes vão ficar à venda no supermercado, porque nós precisamos que o Estado tenha uma capacidade de varrimento de toda a população. As pessoas que têm menos poder de compra, ou que têm menos cuidado, não se vão testar?

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