Pais, não tentem controlar tudo: definam o que é realmente importante e flexibilizem

Como o vírus não toca a todos da mesma maneira, existem famílias em que as consequências da pandemia são mais graves, incluindo implicações directas na perda de rendimentos.

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@petercalheiros

A pandemia que ainda vivemos afectou-nos a todos, indubitavelmente, criando novas exigências que desafiam o nosso bem-estar e a nossa saúde psicológica. Actualmente tem-se falado nas diferenças entre o primeiro e o segundo confinamento, sendo que, no primeiro e, como era de se esperar, houve medo do desconhecido e a população ficou mais assustada. Muitas pessoas conseguiram activar recursos que nem sabiam possuir, na esperança de que tudo fosse passar rapidamente e voltaríamos, embora seja impossível, àquilo que éramos antes da covid-19. Criaram-se grupos de contacto recorrendo às tecnologias, disponibilizaram-se ajudas pela Internet, as famílias investiram no bem-estar e na actividade física. Porém, o segundo confinamento trouxe mais cansaço e acentuou as desigualdades entre as famílias.

Se olharmos para duas franjas de famílias em pólos distintos, encontramos um tipo que se constitui como o meio natural para o crescimento e bem-estar da criança, num ambiente favorável, de afectos e de compreensão e que, naturalmente, ajustou-se melhor, estreitou laços e os seus membros servem de apoio uns aos outros. Mas como o vírus não toca a todos da mesma maneira, existem famílias em que as consequências da pandemia são mais graves, incluindo implicações directas na perda de rendimentos, a partilha de um espaço pequeno e com poucas condições, menos momentos de lazer, dificuldades no acesso à educação à distância, e a presença de conflito e de violência (física e/ou verbal).

Além de exacerbar a desigualdade social e económica, o segundo confinamento trouxe, de uma forma geral, sobrecarga aos pais e aos outros cuidadores, que na verdade já acusavam cansaço desde o ano passado. Há um acumular de múltiplas funções: são pais, fazem tarefas domésticas e refeições a dobrar, são trabalhadores e, para que um dos membros do casal (quando são dois) possa trabalhar, o outro tem de estar totalmente disponível para os filhos pequenos e ajudar os que requerem mais apoio nas aulas à distância, sobretudo aqueles com necessidades especiais. Em relação aos adolescentes que frequentam o secundário, há preocupação sobre a tomada de decisão para o futuro e o receio de não terem tempo para recuperar aprendizagens menos bem conseguidas. Nota-se também mais sedentarismo com a redução do entusiasmo pelo exercício físico em casa e das actividades prazerosas.

Além destes desafios continuados, de forma transversal às famílias, houve a necessidade de isolamento físico da família alargada, em alguns casos incluindo os avós, figuras fundamentais e presença assídua anteriormente no dia-a-dia e na educação dos netos.

De uma forma geral, há ainda incerteza quanto ao fim da pandemia e isto gera angústia, sendo também fonte de stress e de mal-estar que impacta na nossa saúde mental.

Então, o que fazer para tentar minorar na família o impacto negativo do confinamento e das restrições que se vão manter?

Lembre-se que não estamos isolados, mas distantes fisicamente, e explique isso às crianças. Quem puder, recorra às tecnologias para aumentar a proximidade da família.

Todos os sentimentos são naturais e esperados: Permita-se sentir inquietação dada a realidade exigente que vivemos, além de ansiedade e tristeza – que é um sentimento tão normal quanto a alegria e que não deve ser confundida com depressão. A depressão causa um forte sentimento de incapacidade e desesperança. É importante perceber a intensidade destes sentimentos e se interferem de forma significativa com as suas aactividadesdiárias, neste caso, procure ajuda de um profissional credenciado.

É importante considerar que aquilo que está a sentir pode resultar da sobrecarga e da incerteza que esta pandemia trouxe, e não do facto de ser uma pessoa fraca ou incompetente. Peça ajuda se precisar e acredite que não é sinal de fraqueza.

Reconheça que as crianças têm saudades dos amigos da escola e que para algumas a quebra na sua rotina tem um impacto maior.

Ajude os seus filhos a nomearem aquilo que sentem, ajudando-os a identificar os seus recursos pessoais, a resolverem problemas e a aliviarem a ansiedade. Por exemplo, se nomear a “preocupação” identifique formas de lidar com ela e minorar o seu impacto.

É fundamental dispensar um tempo diário para estar com a criança, mesmo que sejam 15 minutos, mas sem telemóvel! Apenas para a diversão ou conversa e sem falar sobre o que corre mal. Ao brincar, deixe-se guiar pela criança e não imponha as suas ideias.

As crianças sentem a falta do toque afectuoso dos avós e de outros familiares. Ajude-a a compreender que há muitas formas de representar o toque, como fazer rir ou cantar em conjunto, mandar beijinhos ou usar o olhar para mostrar afecto.

As crises podem ser momentos de crescimento pessoal e de desenvolvimento. Temos de retirar o que foi importante para nós nesta mudança nas nossas vidas. Sendo este confinamento uma repetição, podemos usar a experiência do primeiro confinamento a nosso favor: o que correu bem e podemos repetir? O que não correu tão bem e devemos fazer diferente?

A família deve equilibrar o tema “pandemia” em casa, mantendo-se informados mas sem exagero e proteger-se caso perceba que as notícias causam demasiada ansiedade.

O entendimento do casal na gestão deste momento com rotinas, organização de um plano flexível e consistente, incluindo a divisão de tarefas e de momentos de lazer pode fazer a diferença. Não se esqueçam de pendurar o plano à vista de todos e relembrá-lo diariamente às crianças: é importante para as crianças anteciparem aquilo que vai acontecer, porque sentem- se mais seguras e conseguem estruturar melhor o seu pensamento e promover a cooperação.

Tenha uma atitude positiva e proactiva; não esteja sempre a criticar o comportamento da criança, respire fundo e saia de perto se for preciso. Não se esqueça de elogiar o que ela faz de positivo e de ser realista naquilo que pede.

É preciso calma e autocontrolo para conseguir perceber que é uma fase, flexibilizar comportamentos, ajustar expectativas e gerir conflitos.

Devemos acima de tudo não deixar as crianças e jovens serem tomados pelo medo ou pela crença de que a distância física e emocional serão a nova realidade. Transmita confiança.

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