Estudo conclui que jornalismo tem sido um “meio de combate eficaz” à pandemia

Sempre que os jornais aumentaram a cobertura noticiosa sobre a pandemia, a infecção diminuiu de intensidade. Investigadora defende que Costa deve chamar a si a comunicação do desconfinamento para não pôr em risco uma nova vaga.

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Filipa Fernandez

Depois de analisadas cerca de 3000 notícias sobre a covid-19 de todas as edições em papel dos jornais PÚBLICO e Jornal de Notícias no último ano, um grupo de investigadoras de media considera que “o jornalismo tem sido um meio de combate eficaz à pandemia”. Desde Março do ano passado, sempre que os jornais aumentavam a cobertura sobre a pandemia, a infecção diminuía de intensidade.

A descrição é de Felisbela Lopes, investigadora da Universidade do Minho e coordenadora do estudo sobre a cobertura mediática da covid-19 que defende que estes resultados mostram que é preciso que o anúncio do desconfinamento que António Costa fará nesta quinta-feira seja preparado em termos comunicacionais para surtir um efeito positivo na sociedade portuguesa. O estudo envolveu ainda as investigadoras Rita Araújo (CSCS/Universidade do Minho), Olga Magalhães (CINTESIS), Clara Almeida Santos e Ana Teresa Peixinho (Universidade de Coimbra) e Catarina Duff Burnay (Universidade Católica).

“O primeiro-ministro deve chamar a si a comunicação e tem que a fazer de forma clara. Se o desconfinamento for faseado, António Costa deve dizer quantas fases serão, anunciar as medidas da primeira, e depois chamar a si, fase a fase, a comunicação das medidas. Não podemos correr o risco do passado de ter governantes a falar por cima uns dos outros” porque os media vão reflectir essa confusão no Governo e isso será prejudicial para a imagem que deve passar para a população.

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Na primeira fase da pandemia, entre Março e Maio, “o jornalismo teve uma actividade muito intensa, com grande número de textos, peças grandes, foi pró-activo na busca de fontes e de novos enquadramentos sobre a pandemia. A cobertura jornalística começou antes do estado de emergência e motivou os portugueses para o cumprimento do confinamento e das regras sanitárias”, recorda Felisbela Lopes. Houve o triplo das notícias quando comparado com Janeiro e Fevereiro deste ano. “Depois veio o desconfinamento e o Verão, e as decisões políticas ziguezagueantes no Outono, e o jornalismo baixou a intensidade da cobertura da pandemia porque a situação não era tão grave.” Ou seja, a sociedade abriu e havia mais temas sobre os quais falar, incluindo a pré-campanha eleitoral, e “o jornalismo acaba por ser o reflexo da sociedade”.

Com a subida dos casos entre o final de Dezembro e durante Janeiro e o novo confinamento a meio desse mês, aumentou também a cobertura mediática que acentua a gravidade da situação – o exemplo mais extremo são as notícias diárias sobre as filas de ambulâncias à porta dos hospitais, as UCI cheias, os internamentos a obrigar a ter hospitais inteiros dedicados à covid, Portugal dado como o pior país do mundo. “Ao despertar de novo para a pandemia e ao aumentar a pressão noticiosa, o jornalismo levou a uma atitude mais pró-activa da população”, defende Felisbela Lopes.

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Os temas abordados pelos media também mudaram ao longo do ano: de Março a Maio, além do retrato epidemiológico, as notícias focaram sobretudo (21%) temas de índole social (trabalho e educação); em Novembro e Dezembro foi a política nacional que mais pesou (20%, contra 7% do social), seguida da vacina (9%). Em Janeiro e Fevereiro houve um noticiário mais “negativo”, acerca de retratos de situação (23%), como números de mortes, e sobre educação (17%) devido ao encerramento das escolas.

Outra conclusão é que houve um aumento muito significativo de novas fontes que se normalizaram no espaço público. Os profissionais de saúde e os especialistas na área epidemiológica são entre um quinto e um quarto das fontes das notícias, rivalizando com as fontes oficiais (governamentais) que têm um peso entre um quarto e um terço. Mas também aqueles foram mudando o seu comportamento ao longo deste ano. Começaram por ser ‘explicadores’ da pandemia, mas agora são também “interlocutores que pressionam” uma vez que são eles que dizem quando e como se devem aliviar as restrições.

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