Lições de um ano para esquecer

É arriscado ousar um exercício de optimismo quando a doença grassou, a morte se instalou e a crise levou tantas famílias à miséria. Mas, um ano depois, é fundamental ver em perspectiva o que se passou.

Há muitas maneiras de ver o último ano. Com o pesadelo ainda à solta, faz sentidono entanto, olhar para o que aconteceu desde 2 de Março de 2020 e deixar duas perguntas: fez-se tudo o que se podia para evitar a morte de mais de 16 mil portugueses? Os problemas expostos pela pandemia deixam-nos lições do presente para o futuro? Quanto à primeira pergunta, a resposta é óbvia: não se fez tudo, porque nem sempre foi possível saber o que fazer perante uma ameaça inesperada e desconhecida. Quanto à segunda, há um leque enorme de respostas possíveis, muitas contraditórias entre si, mas que, no essencial, permitem uma conclusão: perante a mais grave ameaça em muitas décadas, o país e as suas instituições resistiram.

Nos balanços deste ano negro, é inevitável que as perguntas e respostas se abram à politização. Fez o primeiro-ministro, o Presidente da República ou a ministra da Saúde o que devia ter feito? Aqui, é normal e legítimo que as opiniões se dividam. Mas, também aqui, é obrigatório que se olhe para o desconhecimento, para as experiências internacionais, para o processo de decisão em cada fase da pandemia e se discuta o que se fez num contexto de incerteza. Caímos, assim, num terreno fértil para a especulação e a subjectividade. Fez-se mal sempre, ou só em Dezembro? E fez-se bem quando? A recente reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa e as sondagens favoráveis a António Costa mostram-nos apenas que a maioria dos portugueses acredita que ambos fizeram o que podiam fazer. Vale o que vale.

Provavelmente é mais útil discutir como reagiu o país. Como respondeu colectivamente. E aí há razões mais objectivas para acreditarmos numa prova de maturidade. As regras foram no geral cumpridas, sem manifestações violentas como vimos em tantos países. O sistema político manteve-se estável. O tecido produtivo revelou capacidade de adaptação. A ciência deu um contributo crucial. O debate foi rico e aberto. As escolas e os hospitais provaram eficiência e sentido de serviço público. A Europa ajudou. O plano de vacinação entrou nos eixos. O Estado não respondeu como devia nas moratórias ou nos apoios, mas exibiu esforço e noção de solidariedade.

É arriscado ousar um exercício de optimismo quando a doença grassou, a morte se instalou e a crise levou tantas famílias à miséria. Mas, um ano depois, é fundamental ver em perspectiva o que se passou. Se há um ano alguém previsse os efeitos trágicos da pandemia e dissesse que, apesar de tudo, o país continuaria de cabeça erguida, seria visto como um louco. Foi isso que aconteceu.  

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