Pelo fim da pobreza menstrual, o Pachamama Project distribui pensos em campos de refugiados

Ella Lambert sempre teve acesso a produtos de higiene menstrual, mas sabe bem como há muitas pessoas que não têm. A situação é ainda mais grave quando são mulheres a viver em campos de refugiados. Assim nasceu o The Pachamama Project, uma organização responsável por produzir e distribuir pensos higiénicos reutilizáveis.

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Pachamama Project

São 28 os dias que dura, em média, o ciclo menstrual - e cerca de cinco deles são passados a sangrar. Mesmo com acesso a pensos higiénicos, tampões ou copos menstruais, as dores, o odor ou o desconforto não desaparecem. E, actualmente, 500 milhões de mulheres em todo o mundo são confrontadas com “pobreza menstrual”, isto é, a escassez de produtos de higiene íntima. “No Líbano, os meus parceiros de distribuição dizem-me que os pensos higiénicos podem custar até dez euros por pacote, isso faz com que estes produtos sejam quase impossíveis de sustentar mensalmente”, começa por explicar ao P3 Ella Lambert, fundadora da organização The Pachamama Project. Esta é uma organização sem fins lucrativos, baptizada com o nome da deusa da fertilidade, que fabrica e distribui pensos higiénicos reutilizáveis para raparigas e mulheres que vivem em campos de refugiados.

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Ella, a mãe a avó foram as primeiras voluntárias do The Pachamama Project The Pachamama Project CIC

O aumento dos preços e o preconceito associado à menstruação obrigam a que meninas e jovens mulheres faltem à escola e utilizem um pedaço de papel, jornal ou uma meia velha em vez de um penso higiénico. Se para muitos falar de menstruação ainda é tabu, para Ella Lambert e Oliwia Geisler é um assunto que deve ser solucionado. “Eu sei como pode ser difícil ter um período menstrual, mas tenho sorte de ser capaz de simplesmente rastejar para a cama com uma bolsa de água quente quando as cólicas aparecem. Algumas pessoas não podem sequer comprar produtos higiénicos. Não consigo imaginar ter de lidar com isso”, explica Ella.

Esta situação é ainda mais difícil para as raparigas e mulheres que vivem em campos de refugiados. Foi a pensar nelas que, em Março de 2020, nasceu este projecto, inicialmente constituído por três pessoas que fabricavam entre 200 e 300 Pacha pads, nome pelo qual os absorventes são conhecidos, por semana. Hoje são uma rede de 300 voluntários dispersos pelo Reino Unido, França, Itália e Estados Unidos e já produziram mais de 3000 pensos higiénicos.

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The Pachamama Project já ajudou 1000 mulheres em campos de refugiados The Pachamama Project CIC

Portugal é um dos países onde Ella e Oliwia esperam conseguir vir a ter voluntários e, quem sabe, criar um ponto de distribuição. Desde Fevereiro de 2020 que a associação Corações com Coroa faz o mesmo tipo de trabalho com a campanha #PeríodoLivre. A associação oferece “Kits Dignidade” com pensos higiénicos reutilizáveis a raparigas e mulheres na Guiné-Bissau.

Por enquanto, a distribuição de Pacha pads é feita unicamente em campos de refugiados de Atenas, na Grécia, e de Beirute, no Líbano, através de enfermeiros, mas a organização planeia aumentar a ajuda. “Fizemos uma parceria com o Harbor Project em Swindon, no Reino Unido, para fazer mais distribuições a refugiados locais. Também estamos a planear distribuir na Índia nos próximos meses”, conta Ella.

Para além disto, explica a co-fundadora Oliwia Geisler, existem também parcerias com empresas de outros países como a Purple Pad, de Dulce Bernal, na Cidade do México. “A Dulce acompanhou o nosso trabalho desde o início e agora está a trabalhar com o clube GirlUp UNAM na universidade para fazer pensos higiénicos reutilizáveis ​​como os nossos. Já têm 100 pensos que vão doar em Maio a um refúgio para mulheres em situação de violência.”

Perceber se a reutilização dos pensos seria viável para mulheres e raparigas que vivem nestes campos, já que o acesso a água pode ser condicionado, foi outra das questões que a organização abordou antes de avançar com a ideia. Contudo, apesar de viverem em tendas, a grande maioria dos refugiados tem acesso a máquinas de lavar roupa através da comunidade. Para além disto, graças aos parceiros de distribuição, a organização também fornece um secador para as mulheres secarem os pensos. “Isso reduz o estigma de os pendurar a secar”, enfatiza Ella.

Para quem não tem uma máquina de costura, integrar o The Pachamama Project pode passar por correr no evento October for Run, uma corrida criada por Luke, o irmão de Ella. “Ele e os amigos correram dez quilómetros todos os dias durante uma semana para representar a viagem de 50 quilómetros de Alepo, na Síria, até à fronteira com a Turquia, que tantos refugiados tiveram de fazer para ficarem em segurança”, revela. A iniciativa já despertou a curiosidade de várias escolas e grupos desportivos no Reino Unido. Quem tem empresas pode também doar 10% dos lucros. Deixar de fumar ou cortar o cabelo e doar o dinheiro gasto em tabaco ou no cabeleireiro são outras das alternativas.

“Tendo em conta as restrições impostas pela covid-19, ainda só conseguimos ajudar mil mulheres. No futuro queremos ajudar mais, porque a pobreza do período nunca termina e existe em todos os países e culturas.” No futuro, explica Oliwia, o The Pachamama Project vai distribuir os Pacha pads por mulheres com poucas possibilidades económicas e em prisões. “Vamos existir por um bom tempo.”

Texto editado por Ana Maria Henriques

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