Embaixador da Birmânia na ONU afastado depois de pedir “restauração da democracia”

Foram detidas centenas de pessoas nas manifestações deste sábado em todo o país. Uma mulher foi baleada.

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Manifestantes usam contentor do lixo para erguer barricada numa rua em Rangum NYEIN CHAN NAING / EPA

O embaixador birmanês nas Nações Unidas foi afastado pelos militares que controlam o país há um mês, um dia depois de ter feito um apelo à comunidade internacional para repor a democracia no país. Este sábado foram detidas centenas de pessoas em novas manifestações contra o golpe militar.

O anúncio da demissão de Kyaw Moe Tun foi feito pela televisão estatal, controlada pelo governo militar, que o acusou de “trair o país” e de ter falado em nome de “uma organização não-oficial que não representa o país e de ter abusado do poder e responsabilidades de um embaixador”.

Na véspera, o diplomata tinha deixado um apelo emocionado num discurso na Assembleia-Geral das Nações Unidas para que a comunidade internacional use “qualquer meio necessário para tomar acções” que ajudem a “restaurar a democracia” na Birmânia. Kyaw Moe Tun disse ter falado em representação do governo civil liderado oficiosamente por Aung San Suu Kyi, que está detida desde o golpe de 1 de Fevereiro.

O discurso do embaixador birmanês teve grande impacto junto dos meios diplomáticos, tendo sido aplaudido pela nova enviada dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield, que disse ter sido uma intervenção “corajosa”. O relator especial da ONU, Tom Andrews, também elogiou o “acto de coragem” do embaixador e disse ser tempo “para o mundo responder a esse corajoso apelo com acção”.

A situação na Birmânia agravou-se este sábado, com as autoridades a intensificarem a repressão contra os manifestantes que quase todos os dias têm saído à rua em protesto contra a tomada do poder pelos militares. Um grupo de activistas pró-democracia disse à Reuters que foram detidas centenas de pessoas apenas este sábado.

Em Rangum, a maior cidade, houve confrontos entre os manifestantes e a polícia, que recorreu a gás lacrimogéneo para dispersar as multidões. Segundo testemunhas, a polícia deteve pessoas à medida que iam chegando aos locais habituais de onde partem as marchas, incluindo vários jornalistas.

Houve relatos de agressões por parte das forças policiais e uma mulher foi baleada em Monwya, perto de Mandalay, no centro do país. Há notícias divergentes sobre a alegada morte da manifestante.

Os confrontos nas ruas birmanesas já causaram pelo menos três mortos confirmados e dezenas de feridos nas últimas semanas. Apesar da violência e da persistência dos protestos, os militares não parecem dispostos a abandonar o poder. Para além de reprimirem as manifestações, o Exército tem restringido o acesso à Internet e às plataformas das redes sociais.

O golpe de 1 de Fevereiro foi justificado pelos militares como uma resposta a alegada “fraude eleitoral” nas eleições legislativas ganhas com uma enorme vantagem pela Liga Nacional para a Democracia, de Suu Kyi. A Birmânia foi governada por uma ditadura militar durante grande parte da sua história desde a independência do Reino Unido, em 1948.

Desde o golpe que Suu Kyi foi colocada em prisão domiciliária, mas há receio de que tenha sido transferida para alguma prisão ou instalação militar. 

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