Em nome do amor ou do dinheiro, duas jovens estão a ser julgadas por homicídio

Uma das arguidas, enfermeira, atira quase todas as culpas para cima da amiga, trabalhadora de uma empresa de segurança. A audiência decorre no Tribunal de Portimão

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Rui Gaudencio

Amor, crime e pesadelo – eis a história de duas jovens, a responder no Tribunal de Portimão por homicídio e profanação de cadáver, entre outros crimes. As arguidas: Mariana é enfermeira, Maria trabalhava numa empresa de segurança, viviam juntas e partilhavam afectos. A acusação diz: “Agiram em conjunto de esforços” para conceber um plano que retirou a vida a um informático, trabalhador num resort de Lagoa, onde conhecera Maria, de 20 anos, e por quem teria manifestado simpatia. Diogo Gonçalves, de 21 anos, recebera 70 mil euros de indemnização da morte da mãe num acidente de viação. Foram detidas pela PJ, cerca de duas semanas depois do homicídio, em Março do ano passado.

Ao entrarem na sala para a primeira sessão de audiência, ficou logo claro que a relação entre as duas jovens, aparentemente, teria terminado. “Sinto-me coagida”, disse a enfermeira ao colectivo de juízes, declarando que estaria disposta a apresentar a sua versão dos factos, desde que Maria não estivesse presente. O tribunal aceitou. De seguida, faz uma espécie de meia culpa e mostra arrependimento. “Se pudesse voltar atrás, faria muitas coisas diferentes.” Porém, acrescenta: “Não sou culpada pela morte dele [Diogo], não fiz nada nesse sentido.” Durante a fase do primeiro interrogatório, na PJ de Portimão, ambas assumiram a co-autoria dos crimes. Já na fase de debate instrutório, vieram ao de cima divergências e algumas contradições.

Na presença do colectivo de juízes presidido por Antonieta Nascimento, a enfermeira atirou quase todas as culpas para cima da ex-companheira. “O amor acabou”, declarou aos jornalistas o advogado João Grade, representante de Mariana, a justificar a nova versão dos factos. Ao início da tarde de 20 de Março do ano passado, foram ambas de carro a casa de Diogo, em Algoz. Mariana, de 24 anos, fica na viatura, enquanto Maria entra e executa o plano que estaria desejado. A juíza-presidente interroga: “Porque ficou no carro, e não entrou?” “Quando íamos a casa de amigas, entravamos as duas, mas com os amigos só ia a Maria – ela não se sentia à vontade para dizer que era homossexual.”

O rapaz terá sido amarrado a uma cadeira. Quando Mariana entrou na sala, relatou, “já o Diogo estava inconsciente”. Teria sido posto a dormir com a ajuda de um sedativo (Piazpn), bebido com um sumo de laranja. Do serviço de urgência do Hospital de Lagos, onde a enfermeira trabalha, desapareceram três ampolas deste fármaco, na mesma altura. À amiga, Mariana disse ainda ter perguntado: “Mas o que é isso, alguma cena sexual?” A resposta que obteve, foi um “não te metas, e vai para o quarto”. Cumpriu a ordem. Quando regressou, disse, já nada haveria a fazer: “Foi estrangulado.” De seguida, foram cortados dois dedos, o indicador e o polegar, da mão direita, que serviram para desbloquear o telemóvel e fazer duas transferências de 350 euros, para as contas de cada uma delas, através da aplicação MBWay. Das caixas multibanco fizeram mais quatro ou cinco levantamentos e com o cartão de crédito da vítima compraram cremes e protector solar, na Wells, em Portimão.

A cabeça do cadáver viria a ser encontrada no sítio do Pego do Inferno, em Tavira, e o tronco na outra ponta do Algarve, numa arriba próximo de Sagres. Por fim, Mariana relatou que, uma noite (após o crime), quando estavam deitadas, sentiu que aquela lhe prendia as pernas e a agarrara “com os braços à volta do pescoço” pelas costas. Ter-lhe-á perguntado: “O que é isso?” “Tive um pesadelo”, terá respondido Maria.

Maria declinou o direito de responder na primeira sessão do julgamento. Os trabalhos da audiência retomam sexta-feira.

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